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 | Fabio Rodrigues PozzebomAgência Brasil
| Foto: Fabio Rodrigues PozzebomAgência Brasil

Depois de cinco horas de explicações e provocações de parte a parte, a sessão desta quarta-feira (3) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados, que recebeu o ministro da Economia, Paulo Guedes, terminou em bate-boca e gritaria. O motivo tornou-se “viral” na internet e ilustrou “memes” durante todo o dia desta quinta-feira (4): o deputado Zeca Dirceu (PT-PR) referiu-se a Guedes como “tigrão” com os aposentados, idosos, portadores de necessidades, agricultores e professores e “tchutchuca” com a “turma mais privilegiada do nosso país”. Os termos “tigrão” e “tchutchuca” vêm de um funk lançado no ano 2001. O ministro da Economia, que estava lá para prestar esclarecimentos sobre a reforma da previdência, perdeu a paciência e disparou: “tchutchuca é a mãe, é a vó”. 

Uma análise mais detida da situação mostra, em primeiro lugar, que o deputado não extrapolou os limites da liberdade de expressão de qualquer cidadão. A lógica do direito brasileiro é privilegiar, como regra geral, a liberdade de expressão e, em seu âmbito, a liberdade de opinião e de crítica, que deve ser tanto mais ampla quanto mais pública é a figura que é alvo de críticas. Embora seja verdade que essa liberdade encontra limites na proteção pontual de outros bens relevantes do ponto de vista do direito, como é o caso da honra, nada na fala de Dirceu extrapola o razoável naquele contexto. 

Quem perde é todo o Brasil, que não pode mais esperar pela reforma da previdência

Parece óbvio que o deputado não feriu a honra de Paulo Guedes, em qualquer das hipóteses puníveis no país: a calúnia, a difamação e a injúria. É de se lamentar com veemência a postura irresponsável do PT de apostar no “quanto pior melhor” e negar a óbvia e ululante urgência da reforma da Previdência, mas fato é que o deputado utilizou a linguagem dentro dos parâmetros razoáveis da liberdade de opinião na discussão política para criticar não a dignidade de Paulo Guedes, mas o teor daquilo que entende ser a proposta do governo. Por fim, não custa lembrar que a Constituição garante a inviolabilidade dos deputados por suas palavras e votos, o que só mostra que o constituinte quis alargar ainda mais a regra geral da liberdade de expressão no contexto político-parlamentar, para que o debate seja o mais desimpedido possível. 

É compreensível que Paulo Guedes, depois de tantas horas de debates e de provocações, tenha perdido a paciência – mas fato é que ele a perdeu diante do que não é mais que mero aborrecimento, se tanto, o que é natural na vida pública. O que, na verdade, poderia ter evitado esse constrangimento desnecessário ao ministro (e pode evitar, inclusive, que isso se repita) é uma articulação melhor da base aliada do governo, para que Guedes não tivesse sido deixado à mercê, por horas a fio, do rosário de provocações que a oposição, muito mais articulada, pôde desfiar diante do ministro da Economia, sem que deputados da base aliada pudessem aliviar a tensão, revezando-se com a oposição nas falas, como é praxe nesse tipo de sessão. 

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Pior ainda, o líder do PSL na Câmara, deputado Delegado Waldir (GO), chegou a acusar o presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de ter colocado Guedes na “cova dos leões”, criando outro ruído desnecessário na já conturbada relação entre o governo, o partido do presidente e a Câmara dos Deputados na tentativa de encontrar um culpado para o que ocorreu. Que o episódio sirva de lição: a falta de articulação pode transformar aborrecimentos naturais da vida política em confusões e derrotas desnecessárias – e, assim, quem perde é todo o Brasil, que não pode mais esperar pela reforma da Previdência.

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