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| Foto: Federico Parra/AFP

Quando Jair Bolsonaro tomar posse na Presidência da República, no próximo dia 1.º de janeiro, nem todos os chefes de Estado ou de governo que o novo presidente gostaria de ver em Brasília poderão comparecer, mas há algumas mãos que o próprio Bolsonaro não quer apertar. A lista de convidados não terá representantes de Cuba, Venezuela e Nicarágua – no caso dos dois primeiros países, a informação veio do Itamaraty, no meio de dezembro; em 23 de dezembro, no Twitter, o futuro chanceler, Ernesto Araújo, anunciou que nenhum representante nicaraguense seria recebido na posse.

A praxe do Itamaraty é enviar convites a todos os países com os quais o Brasil mantém relações diplomáticas, e de fato, segundo nota da própria chancelaria, era o que havia sido feito, em coordenação com o governo eleito. Em um segundo momento, ainda de acordo com o Ministério das Relações Exteriores, vieram as determinações para que Cuba, Venezuela e Nicarágua fossem “desconvidadas”, por assim dizer. No Twitter, Bolsonaro escreveu que “regimes que violam as liberdades de seus povos e atuam abertamente contra o futuro governo do Brasil por afinidade ideológica com o grupo derrotado nas eleições não estarão na posse presidencial em 2019. Defendemos e respeitamos verdadeiramente a democracia”.

Quem haveria de querer, em sua posse, um carniceiro que não tem consideração nem pela democracia, nem pelo povo venezuelano?

Por mais que a tradição brasileira tenha sido a de convidar representantes de todo e qualquer país com os quais há relações diplomáticas, a decisão de quebrar o precedente para excluir esses três países da posse faz todo o sentido. Cuba é a ditadura mais longeva da América Latina e a recente transição, com a ascensão de Miguel Díaz-Canel, não significou absolutamente nada em termos de mudança na orientação do governo. A nova Constituição do país mantém o sistema de partido único e as restrições às liberdades individuais e econômicas. A Nicarágua segue sofrendo com a repressão violenta de Daniel Ortega aos protestos que pedem sua saída; a ação das forças estatais já resultou em pelo menos 300 mortes, e mais recentemente o governo aderiu à prática de invasão e depredação das sedes de veículos de imprensa independentes.

Um capítulo especial precisa ser dedicado ao venezuelano Nicolás Maduro. O “socialismo do século 21” implantado pelo falecido Hugo Chávez e mantido pelo atual ditador não se limita a destruir a democracia no país, que já não tem Judiciário e Legislativo independentes, onde a imprensa é perseguida e os adversários políticos são presos arbitrariamente. Maduro está matando os venezuelanos de fome e doenças, e até pouco tempo atrás o ditador recusava terminantemente a ajuda internacional para mitigar as consequências trágicas das políticas socialistas. Quem haveria de querer, em sua posse, um carniceiro que não tem a menor consideração nem pela democracia que levou Bolsonaro ao poder, nem pelo povo venezuelano, que busca, desesperado, as fronteiras com os países vizinhos para escapar da morte?

Cuba e Venezuela, ainda por cima, já deram algumas mostras de como enxergam o presidente eleito do Brasil. Os cubanos retiraram unilateralmente seus profissionais integrantes do programa Mais Médicos, em uma tentativa de jogar a população das áreas desassistidas contra Bolsonaro. E Maduro, em uma nova manifestação da velha prática de achar culpados externos pelo caos que ele mesmo provocou, já implicou Bolsonaro em um complô arquitetado pelos Estados Unidos para derrubar o ditador bolivariano.

Ernesto Araújo, futuro chanceler: Mandato popular na política externa (26 de novembro de 2018)

Leia também: O papel do Brasil na comunidade internacional (editorial de 9 de dezembro de 2018)

É certo que, na lista de países com os quais o Brasil mantém relações diplomáticas, Cuba, Venezuela e Nicarágua não são as únicas ditaduras. Mas nem por isso se pode considerar que as únicas opções aceitáveis sejam os extremos: ou se aceita a presença de todos, ou é preciso excluir também os representes dos demais regimes autoritários. Os três países preteridos por Bolsonaro não têm em comum apenas a mesma orientação ideológica, de esquerda: trata-se de nações latino-americanas, integrantes da região onde o Brasil exerce, ou deveria exercer, liderança natural. Por muito tempo a diplomacia brasileira ignorou os desmandos em Havana e Caracas. No momento em que o Itamaraty se mostra disposto a mandar recados mais claros em defesa da democracia, é natural que comece pelas nações vizinhas.

Díaz-Canel, Maduro e Ortega, ou quem quer que eles pretendessem enviar a Brasília para a posse, não farão falta, e opor-se à sua presença não abalará a reputação diplomática do Brasil – o que prejudicava nossa imagem era justamente a conivência de governos anteriores com ditaduras na América Latina e outros continentes. O compromisso do Brasil com a democracia também pede o compromisso com os povos que hoje sofrem nas mãos de déspotas, é não é afagando esses tiranos que nosso país ajudará milhões de latino-americanos cujas vidas são destruídas pelas ditaduras socialistas.

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