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| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

Na quinta-feira, a força-tarefa da Operação Lava Jato devolveu à Petrobras, durante cerimônia realizada em Curitiba, cerca de R$ 1 bilhão em recursos que tinham sido desviados da estatal durante o esquema do petrolão. A maior parte desse montante veio do estaleiro Kepeel Fels: quase R$ 700 milhões. Agora, o total de dinheiro recuperado pela Lava Jato chegou a R$ 2,5 bilhões, 40% do que a estatal declara ter sido desviado para alimentar o projeto de poder petista e abastecer outros partidos da base aliada de Lula e Dilma Rousseff. A devolução, por si só, é uma evidência poderosa que desmente todos aqueles que insistem em negar o petrolão e afirmam que não há provas da pilhagem produzida pelo PT durante anos à frente do governo e controlador da Petrobras.

E, no dia anterior, o Supremo Tribunal Federal havia tomado uma decisão fundamental para que continuem a ocorrer casos como esse, da recuperação de recursos oriundos de corrupção. Os ministros estavam analisando um caso ocorrido em São Paulo, onde o Tribunal de Justiça havia decidido pela prescrição em um processo de improbidade contra ex-servidores públicos de uma prefeitura do interior paulista. De acordo com a decisão, não seria possível recuperar o dinheiro desviado se a ação de ressarcimento fosse aberta mais de cinco anos depois do ato de improbidade administrativa. O Ministério Público Estadual recorreu e levou o caso ao STF.

O melhor resultado para sociedade sempre é a recuperação do dinheiro desviado

O julgamento começou no dia 2 de agosto, e ali já havia se formado maioria no sentido de reconhecer a prescrição dentro do prazo de cinco anos, com os votos de Alexandre de Moraes (relator), Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Os votos divergentes eram os de Edson Fachin e Rosa Weber. No entanto, a sessão terminou sem a conclusão dos votos, o que ocorreu no dia 8. E então veio a reviravolta. Barroso e Fux pediram para mudar seu entendimento e, com os votos de Cármen Lúcia e Celso de Mello, venceu a tese de que não há prazo de prescrição para ações de ressarcimento de dinheiro oriundo de corrupção. Marco Aurélio Mello votou pelo prazo de cinco anos.

O que estava em jogo era a interpretação do artigo 37 da Constituição, especialmente de seu parágrafo 5.º: “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”. Na visão de Fachin, que abriu a divergência, a ressalva introduzida pelo constituinte dá margem para aceitar a imprescritibilidade – Barroso, ao retificar seu voto, sugeriu que ela se aplique apenas aos casos em que os atos de improbidade sejam dolosos; quando o prejuízo aos cofres públicos for resultado de ações não intencionais, como descaso ou inépcia, valeria o prazo de cinco anos.

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Leia também: Relatório do CPP quer enterrar a Lava Jato (artigo de Flávio Werneck, publicado em 11 de junho de 2018)

Durante o desfecho do julgamento, Moraes e Marco Aurélio argumentaram que haveria uma incoerência em adotar critérios diferentes para a ação penal por atos de improbidade e a ação de ressarcimento. “Se não se pode mais discutir o ato de improbidade [em função da prescrição], como se pode discutir o ressarcimento?”, questionou Marco Aurélio. Chega a surpreender que ele faça tal questionamento, pois são vários os casos em que há prazos prescricionais diferentes de acordo com a natureza da ação. No caso da calúnia, por exemplo, a vítima tem seis meses para propor uma ação criminal contra o caluniador a partir do momento em que fica sabendo da ofensa, mas pode pedir indenização, por meio de ação cível, em até três anos. Da mesma forma, é perfeitamente razoável que, no caso da improbidade administrativa e dos crimes de corrupção, haja a prescrição da ação criminal – porque, neste caso, a pretensão de punir do Estado envolve a liberdade da pessoa –, mas o prazo para a recuperação do bem desviado seja mais estendido ou mesmo ilimitado. Não faria sentido aplicar critérios idênticos de prescrição neste caso.

O resultado do julgamento no STF merece elogios. Como ressaltou o ministro Barroso, “o melhor resultado para sociedade” sempre é a recuperação do dinheiro e, se a lei permite a imprescritibilidade das ações de ressarcimento, é adequado aplicá-la, mesmo nos casos em que já não seja possível punir os corruptos de outras maneiras. Eles podem até manter a liberdade ou os direitos políticos, mas permitir que, além disso, ainda se locupletem com dinheiro público desviado, incorporando-o definitivamente a seu patrimônio como se tivesse sido legalmente obtido, seria um escárnio.

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