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Editorial 1

União de forças contra a impunidade

Um tema que tem gerado constante polêmica no mundo jurídico é o relativo ao poder de investigação do Ministério Público (MP), ou seja, a discussão acerca da possibilidade ou não de o MP exercer uma atividade investigativa e de, ao mesmo tempo, permanecer como titular da ação penal. Embora na pauta, o assunto ainda não foi decidido pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) e, enquanto isso não ocorre, os debates e as dúvidas permanecem.

De um lado, a fileira daqueles que sustentam a incompatibilidade e a impossibilidade desse duplo papel, por entenderem que a prática criaria injusto e ilegal desequilíbrio entre acusação e defesa, e que a investigação seria tarefa exclusiva da autoridade policial, conforme dispõe o artigo 144 da Constituição Federal de 1988. A atividade investigatória seria, assim, apenas mais uma das diversas funções da chamada polícia judiciária.

De outro lado, a corrente que sustenta a interpretação harmonizada entre os artigos 129 e 144, da Carta de 1988, com o argumento de que, sendo o MP o destinatário final das investigações, não haveria razão para não se atribuir à instituição a possibilidade de também investigar. Seria aplicável aqui, então, a chamada teoria dos poderes implícitos, pela qual se defende a ideia de que ao estabelecer um objetivo a um determinado ente, seria absurdo não conferir a ele os meios necessários para atingir essa meta (como dizem alguns, "quem dá os fins, deve dar os meios"). Ainda, entendem os seguidores desta corrente haver clara diferença, na Constituição, entre polícia judiciária, a que atua no cumprimento de decisões do Poder Judiciário (conforme art.144, §1º, IV), e polícia investigativa, cuja atuação está centrada na apuração de infrações penais (art.144, §1º, I). Apenas a primeira — a polícia judiciária — seria de exclusividade de autoridades policiais. Defendem, portanto, a absoluta legalidade do intitulado procedimento investigatório criminal (PIC), regulamentado pela Resolução nº 13, do Conselho Nacional do Ministério Público. E, para arrematar, lembram que o inquérito policial não é considerado um requisito indispensável para que se proponha uma ação penal, podendo o MP ajuizar a medida judicial, independentemente de inquérito, sempre que dispuser de elementos de prova (documentos, informações etc) que acreditar serem suficientes para a caracterização da autoria e da materialidade do delito.

Pois bem, diante desse panorama e com todo o respeito às opiniões diversas, filiamo-nos àqueles que, sim, defendem o poder investigatório do Ministério Público. Não vislumbramos nenhum aspecto que, na essência e, principalmente, na Constituição de 1988, se apresente como um obstáculo a tal entendimento. Ademais, sabemos que, no Brasil, a morosidade (de inquéritos e de processos) e a impunidade têm sido males constantes no nosso sistema punitivo. São males enraizados em nossa sociedade. Males que parecem insuperáveis, e, o mais grave, que já são quase tolerados pelos cidadãos e pelas instituições. Por tudo isso, não nos parece haver razão para divisões estanques. No combate ao crime, à morosidade e à impunidade, todos devemos unir esforços. Nessa linha, Polícia e Ministério Público podem e devem atuar em conjunto, pois são duas instituições de indiscutível importância na busca pela paz social. Como regra, é evidente que deve caber às autoridades policiais a função de investigação, que, diga-se de passagem, é uma das suas principais atribuições. Todavia, se o Ministério Público também se apresenta com estrutura, possibilidade e disposição de investigar, não existe motivo para que não o faça.

Em um país onde muitos inquéritos (talvez a maioria) simplesmente caem no esquecimento e se perdem no tempo, e onde, ainda, ao final, são muitas vezes considerados falhos, preocupa-nos a "disputa" pelo poder de investigação. Ora, investiguem ambos, Polícia e Ministério Público, e, mesmo assim, com absoluta certeza, ainda teremos um longo caminho a percorrer até que possamos dizer, com orgulho, que, após muita luta e trabalho sério, a impunidade não mais existe na República Federativa do Brasil.

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