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| Foto: Lineu Filho/Gazeta do Povo

País de vocação natural ao agronegócio, o Brasil ainda vive um intenso dilema entre campo e cidade, urbano e rural. Uma contradição difícil de entender, mais ainda de explicar. Ciência, números, economia, divisas comerciais e soberania. Questões ambientais, de abastecimento e segurança alimentar. Realmente, sob essa ótica, um universo bastante complexo. Mas não é – ao contrário, é mais simples do que se possa imaginar. Uma polêmica, portanto, desnecessária. O agro está no dia a dia de toda a população, da mesa de refeição, da roupa que cada um usa à condição econômica do país. O que falta é informação, diálogo e disposição ao entendimento.

A considerar a participação no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, o setor tem contribuição decisiva ao desenvolvimento econômico e social. Praticamente um quarto da economia brasileira – no caso 25,% do PIB – vem do agro. Um dado que por si só revela que o agronegócio é muito mais urbano que rural. Mostra que não é apenas plantar e colher. Que o efeito colateral dessa economia garante boa parte da geração de emprego e renda não apenas dentro, mas principalmente fora da porteira.

Em 2017 foi o agronegócio que tirou o Brasil da recessão, com 70% de participação no desempenho positivo de 1% do PIB nacional. Não fosse o agro, essa conta iria para o terceiro ano consecutivo no vermelho. O superávit da balança comercial está no azul graças ao setor rural. Mas o que isso significa? Aqui, outra informação importante. Mais de 40% de todas as exportações, de tudo que foi embarcado pelos portos brasileiros, vieram do campo. Sete entre os dez produtos mais enviados ao exterior são do agronegócio.

É chegada a hora de unir o Brasil que preserva e que produz. Chega de fogo amigo

Ótimo, mas o Brasil precisa exportar mais tecnológica e conhecimento. Todos concordamos. Mas também concordamos que não dá para ignorar a vocação primária, condição natural que provém da disponibilidade de terra, água e do clima tropical. Sem falar que, ao exportar soja, por exemplo, o grande ativo do agronegócio brasileiro, estamos, sim, exportando muita tecnologia. No livro Agricultura e Indústria no Brasil – Inovação e Competitividade, o professor Albert Fishlow, da Universidade Columbia (Estados Unidos), e o pesquisador José Eustáquio Ribeiro Vieira Filho, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), defendem que em um grão de soja existe tanta tecnologia quanto na indústria da aviação.

Mas como é possível haver tantos conflitos envolvendo o agronegócio, em especial na dicotomia entre produzir e preservar? A ciência, mais uma vez, não encerra a questão. E nem é essa a pretensão. Mas traz respostas, provoca e joga luz sobre questões técnicas e passionais. Estudo recente da Embrapa sobre a ocupação de terras no Brasil mostra que mais de 65% do território brasileiro está protegido ou preservado em processo mandatório, por dispositivos legais, ou pela simples consciência ambiental. E apenas 7,8% da extensão continental do Brasil é ocupada pela agricultura. Caso alguém questione a isenção no estudo da Embrapa, esse dado está em linha com outro levantamento de terras agrícolas, este feito pela Nasa.

A título de comparação, a média das áreas protegidas em dez países com produção agrícola relevante é de 10,5% do território. Os Estados Unidos, o grande produtor mundial, protege 20% da sua área e destina 17,3% da sua extensão ao cultivo agrícola. Somadas florestas plantadas para fins econômicos e pastagens, mais de 74% do país está ocupado pelo agronegócio. No Brasil, pastagens, florestas plantadas e lavouras somam 30,2%.

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Na última década o Brasil praticamente dobrou sua produção de proteína animal e vegetal, assim como de agroenergia. Com volume, tornou-se competitivo no mercado doméstico e internacional, apesar de todas as limitações tecnológicas, logísticas e de posicionamento no comércio global. Foi aí que nossos concorrentes passaram a procurar elementos para tentar desqualificar o país e, assim, obter alguma vantagem comercial nas relações comerciais internacionais. Na prática, quando cobram do Brasil em questões de preservação, estão apontando o dedo porque passamos a incomodar.

Eles, no entanto, sabem que o Brasil faz, sim, a lição de casa. Nós, internamente, é que temos dificuldade em enxergar. Mas é chegada a hora de unir o Brasil que preserva e que produz. Chega de fogo amigo. E, se queremos produzir mais e melhor, se queremos e podemos preservar mais e melhor, paixão e razão precisam caminhar juntos. Agronegócio e preservação não são opostos, mas complementares, condição ao desenvolvimento socioeconômico e ambiental.

Precisamos de mais conhecimento e tecnologia tanto para produzir quanto para preservar. Mas também de políticas públicas adequadas, acesso à informação e de uma opinião pública devidamente esclarecida. São condições mínimas para garantir esse equilíbrio em um tema que não é apenas de interesse como utilidade pública.

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