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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

Em campanhas eleitorais surgem diagnósticos apressados e abundam soluções problemáticas. Entre as proposições para a educação está o “voucher”, ou vale-educação, badalado entre liberais. A ideia é simples: em vez de amargar o ensino deficiente em uma escola pública designada pela prefeitura ou governo estadual, os pais de filhos em idade escolar recebem desta um “vale”, para que optem por uma escola privada de sua preferência.

O ensino público no Brasil está entre os piores do mundo e prejudica em especial o pequeno. O pequeno fica condenado a tomar as piores vagas no mercado de trabalho. O ensino público é uma máquina de desigualdade de oportunidade há 100 anos e, no entanto, governantes insistem em tentar remendar um sistema desenhado para não funcionar.

O ensino público no Brasil está entre os piores do mundo e prejudica em especial o pequeno

O vale-educação, argumenta-se, melhorará a situação dos pais de renda baixa por conferir a livre escolha entre escolas privadas – e entre ex-escolas públicas que deixaram de ser suportadas pela prefeitura e passaram a competir por vales-educação – , que como regra geral oferecem ensino com qualidade superior à da rede pública. Além disso, o governo deixa de gerir escolas e passa tão somente a fornecer o vale, que se torna moeda em um mercado de escolas privadas em competição.

O desenho liberal original do vale-educação presume que este suplante a gestão estatal de escolas, ou seja, simultaneamente ao início do programa de vale-educação deveria cessar o envio de verbas públicas para todas as escolas da rede pública, representando uma privatização virtual na partida do programa. No entanto, levando em conta a prática do processo legislativo brasileiro, me parece impossível que se promulgue tal privatização de todas as escolas públicas simultaneamente à instituição do vale. Na fábrica de salsichas que é o Legislativo, o mais provável é que se institua o vale como um programa adicional, mantendo-se as verbas tradicionais para as escolas públicas e sua gestão estatal, com efeitos similares aos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), no caso do ensino superior. Neste caso, o viés liberal do vale é descaracterizado, pois aumenta a ingerência estatal.

Leia também: Nem temporário, nem por sorteio: uma estratégia definitiva (artigo de Leide Albergoni é professora da Universidade Positivo)

Há um problema ainda mais grave. Atualmente, as escolas privadas são mais dinâmicas que as públicas, a despeito do alto grau de intervenção em seu currículo e gestão, previsto em lei e nas regras do MEC. No entanto, com o vale-educação a intervenção tende a se multiplicar e contaminar o ensino privado com a ineficiência do setor público. Similarmente à Lei Rouanet, é de se esperar que, ao longo do tempo, o governo estabeleça regras impositivas à escola privada para que esta se qualifique para receber o “benefício” do vale. Vislumbro certificações especiais, currículo inclusivo (ideologia de gênero?), condições de diversidade arbitrárias e outras ideias que costumam se materializar na massa encefálica de burocratas. Com o tempo, o ensino privado tenderá a ser cooptado pelo Estado, via regras mandatórias e tendo sua receita dominada por verbas públicas que podem ser suprimidas a qualquer tempo. Basta ver o que ocorreu com as Santas Casas desde a instituição do SUS (um tipo de vale-saúde). Eram vigorosas e agora estão quebradas e cooptadas.

Há solução politicamente viável, e liberal, para a educação? Sem dúvida, mas é um tema para um outro artigo.

Hélio Beltrão é presidente do Instituto Mises Brasil.
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