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Após denúncia da RPC

Assembleia Legislativa do Paraná suspende uso de placas reservadas por deputados

Assembleia Legislativa do Paraná suspendeu o uso de placas reservadas por 14 deputados após denúncia sobre irregularidades
Assembleia Legislativa do Paraná suspendeu o uso de placas reservadas por 14 deputados após denúncia sobre irregularidades (Foto: Pedro de Oliveira/Alep)

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A Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) suspendeu o uso de placas reservadas por 14 deputados estaduais. Os parlamentares, que haviam solicitado as chamadas "placas secretas" tiveram prazo estabelecido até esta quarta-feira (15) para devolvê-las mas, segundo a Alep, todos já se anteciparam e cumpriram a medida, tomada em decorrência da repercussão de uma reportagem exibida pela RPCTV, afiliada da Rede Globo no estado.

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Os nomes dos deputados que receberam o benefício não foram divulgados. Segundo a Assembleia Legislativa, a decisão de manter o sigilo se baseia em razões de segurança e na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “As placas foram requeridas por questão de segurança. Além disso, os pedidos estão embasados em decreto legislativo e na LGPD”, informou a assessoria da Casa.

A medida ocorre após veiculação de reportagem no programa "Boa Noite Paraná", da RPCTV, que revelou o uso de placas secretas por deputados — medida que não encontra amparo no Código de Trânsito Brasileiro (CTB). O material também apontou que o benefício estaria sendo utilizado por autoridades do Executivo, como secretários de estado, sem vínculo com forças de segurança.

Uso de placas secretas não é amparado por lei, diz especialista

De acordo com o advogado especialista em trânsito Walber Pydd, o artigo 116 do CTB é claro ao restringir o uso das placas reservadas a veículos “estritamente usados em serviço reservado de caráter policial”. A regra, reforça ele, tem o objetivo de proteger investigações sigilosas conduzidas por órgãos de segurança — não de ocultar veículos de autoridades.

“A autorização é apenas para os órgãos de segurança pública previstos no artigo 144 da Constituição: Polícias Federal, Civil, Militar e Penal. O uso por deputados ou secretários sem vínculo com essas forças é ilegal”, afirma Pydd.

Segundo o especialista, a concessão dessas placas para funções que não se enquadram no critério legal pode configurar improbidade administrativa. “Fora as sanções disciplinares, há risco de responsabilização civil e política. Cabe ao Ministério Público analisar os casos concretos”, acrescenta.

Pydd lembra ainda que o governo do Paraná possui um decreto (nº 3.267/2008) que determina que as placas reservadas só podem ser utilizadas em serviço reservado de caráter policial, mediante autorização do chefe do Executivo. “Não há registro de que esse decreto tenha sido revogado. Portanto, a autorização dada pela Assembleia contraria tanto o CTB quanto a legislação estadual”, explica.

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O Legislativo paranaense informou que "não há previsão" de divulgar os nomes dos 14 deputados que receberam as placas, sob a justificativa de segurança institucional. Também argumentou que os parlamentares agiram dentro das regras vigentes à época. “Quem as utilizou até o momento o fez pela regra então vigente. Ao receber a placa, o deputado assinou um termo de compromisso que versava sobre o respeito à legislação de trânsito e à proibição do uso de dispositivos luminosos ou sonoros de emergência”, afirmou a Casa, em resposta enviada a Gazeta do Povo.

Apesar disso, a própria Alep reconheceu que o episódio exige mudanças. A Casa Legislativa confirmou que a instrução normativa do Gabinete Militar será alterada, limitando o uso de placas reservadas às forças de segurança ou a casos excepcionais, mediante parecer técnico do próprio Gabinete Militar. “As solicitações de parlamentares deverão comprovar necessidade efetiva de proteção, e o Gabinete fará a análise técnica para deferir ou não o pedido”, informou o Legislativo.

Governo Ratinho Junior determina pente-fino no uso das placas

O caso também atingiu o Executivo estadual. Após a denúncia da RPCTV, o governador Ratinho Junior (PSD) determinou à Casa Militar a realização de um pente-fino no uso e nas solicitações de placas reservadas no Paraná. A revisão, com prazo de 30 dias, vai verificar a legalidade de todos os registros ativos.

“Nos próximos 30 dias, teremos um levantamento completo. Se houver alguma placa que não esteja enquadrada na lei, será cancelada imediatamente”, afirmou o governador. O Executivo alega que a manutenção de sigilo sobre quem utiliza as placas secretas é “uma questão de segurança”, especialmente diante de possíveis ameaças a autoridades envolvidas no combate ao crime organizado.

Em resposta à Gazeta do Povo, o Executivo paranaense destacou que o uso das placas segue o Decreto Estadual nº 11.409/2024, que define que a Casa Militar pode autorizar o uso para órgãos como Polícia Federal, Receita Estadual, Judiciário e Ministério Público. “O detalhamento dessas informações é reservado, pois a integridade das autoridades precisa ser preservada”, informou a assessoria do órgão.

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Detran-PR responde que competência é da Casa Militar

Questionado sobre os critérios aplicados para a liberação das placas reservadas, o Departamento de Trânsito do Paraná (Detran-PR) afirmou que a regulamentação é de competência exclusiva da Casa Militar. O órgão não informou quantos veículos estão cadastrados com esse tipo de placa no estado.

A ausência de dados preocupa entidades que monitoram a transparência pública. Segundo Pydd, cabe aos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas e o Ministério Público, garantir que a concessão desses benefícios seja devidamente auditada.

“A transparência é princípio constitucional. Qualquer ato administrativo deve ser público, salvo exceções previstas em lei — e esse não é o caso”, reforça o advogado.

Decreto legislativo embasava solicitações de deputados

O decreto legislativo aprovado pela maioria dos parlamentares no fim de 2024 autorizava o uso das placas reservadas pela Assembleia Legislativa. O texto previa que os 54 deputados poderiam requisitar o benefício mediante justificativa de segurança.

O deputado Delegado Jacovós defendeu o decreto em entrevista à RPCTV. “Às vezes há a condição de um deputado estar sendo perseguido ou seguido por pessoas que queiram praticar algum tipo de maldade. Então, efetivamente, não está se escondendo nada. Está tudo registrado. Há uma série de requisitos legais para se obter essa placa”, disse.

Decreto aprovado pela maioria dos parlamentares no fim de 2024 autorizava o uso das placas reservadas pela Assembleia Legislativa.

O decreto não foi contestado judicialmente. Segundo a própria Alep, ele segue em vigor, embora sua aplicação esteja suspensa. A Casa informou que apenas um novo ato legislativo ou decisão judicial poderia revogá-lo de forma definitiva.

O episódio expôs um dilema entre segurança institucional e transparência pública. Para o governo, o sigilo é necessário. Para especialistas, abre brechas para o mau uso.

Em Santa Catarina, lembra Pydd, houve um caso semelhante. “No ano de 2006, o TCE de Santa Catarina entendeu que não era possível a utilização de placas reservadas para funções que não estivessem estabelecidas no Código de Trânsito Brasileiro”, aponta.

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