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A megaoperação deflagrada no fim de agosto contra a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) coloca na mira das investigações e de volta aos holofotes um terminal portuário do Porto de Paranaguá, no litoral do Paraná, que já havia criado polêmica quando foi leiloado pela gestão do governador Ratinho Junior (PSD-PR), em fevereiro de 2023 — na época foi, inclusive, contestado na Justiça por empresários do setor sucroalcooleiro do estado.
Trata-se do PAR50, terminal arrematado em licitação na época pelo FTS Group pelo valor de R$ 1 milhão, mais a previsão de cerca de R$ 338 milhões em investimentos na infraestrutura do local. Em novembro de 2023, a Liquipar Operações Portuárias S.A., utilizada pelo FTS Group para administrar o PAR50, foi adquirida pelo fundo de investimentos Stronghold Infra Investiments, que desde então controla a empresa e o terminal no Porto de Paranaguá.
Segundo as investigações reveladas na megaoperação conjunta de Polícia Federal, Receita Federal e Grupos de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) dos ministérios públicos estaduais e federal, com apoio das forças policiais estaduais — que expôs os vínculos bilionários do PCC com a Faria Lima e a extensão da infiltração da facção criminosa sobre o setor de combustíveis no país —, o Stronghold, por sua vez, seria controlado na verdade por lideranças do PCC.
A reportagem da Gazeta do Povo apurou que Cleiton Santos Santana, sócio controlador da Liquipar, é um dos 350 alvos da megaoperação contra o crime organizado deflagrada em agosto. A defesa do empresário não foi localizada pela reportagem para comentar a operação de busca e apreensão da PF contra ele. Em nota divulgada por sua assessoria de imprensa, a Liquipar nega qualquer crime ou irregularidade na operação do PAR50 (leia mais abaixo).
De acordo com o relatório da Polícia Federal à Justiça, as investigações revelam que o esquema do PCC importava de maneira irregular metanol pelo porto de Paranaguá, com documentação falsificada que indicava destinação legítima a empresas químicas ou de biodiesel para uso industrial. Depois, na saída do porto, motoristas desviavam o produto diretamente para postos de combustíveis da Grande São Paulo e outras regiões, burlando a fiscalização, a partir de onde era misturado em um esquema de adulteração de combustíveis.
Ao menos 10 milhões de litros de metanol foram importados e misturados à gasolina ilegalmente, gerando lucros bilionários e lesando consumidores com combustível adulterado e de baixa qualidade.
As investigações detectaram que o metanol chegava a compor até 50% da gasolina vendida nos milhares de postos ligados ao grupo criminoso, superando em muito o limite de 0,5% permitido pela ANP. Ainda conforme as investigações, pelo menos 10 milhões de litros de metanol foram importados e misturados à gasolina ilegalmente, gerando lucros bilionários e lesando consumidores com combustível adulterado e de baixa qualidade.
O dinheiro era posteriormente lavado, principalmente, por meio de fundos de investimento no mercado financeiro. O esquema teria gerado pelo menos R$ 50 bilhões de lucros para a quadrilha, entre 2020 e 2024.
Liquipar afirma que jamais comercializou carga de combustíveis
Em nota divulgada por sua assessoria à imprensa, a Liquipar afirma que jamais movimentou qualquer carga de combustíveis, incluindo metanol, no terminal PAR50, no porto de Paranaguá. "Desde que assumiu a administração do terminal, em abril de 2024, a Liquipar ainda não realizou nenhuma operação, inclusive, seus tanques permanecem vazios e nenhum tipo de produto foi movimentado até o presente momento”, afirma o comunicado.
De acordo com a empresa, a ordem de serviço — que é emitida pela autoridade portuária, indispensável para o início das operações — só foi expedida em junho de 2025. Até então, o terminal não estaria apto a operar, o que em tese tornaria tecnicamente impossível qualquer movimentação de cargas nesse período.
“É importante ressaltar que o licenciamento concedido pelo órgão ambiental IAT [Instituto Ambiental do Paraná] não contempla a movimentação de metanol, limitando-se apenas a diesel, biodiesel e etanol; Essas informações podem ser facilmente comprovadas.”
"A Liquipar atua com absoluta transparência e está à disposição das autoridades para cooperar com as investigações, prestando todos os esclarecimentos necessários, em coerência com seu compromisso com a legalidade, a segurança e o desenvolvimento do Porto de Paranaguá”, diz a nota da assessoria de imprensa (leia a íntegra ao final do texto).
Privatização de terminal portuário de Paranaguá foi contestada na Justiça
O leilão do terminal portuário no Porto de Paranaguá agora na mira das autoridades chegou a ser contestado na Justiça, sem sucesso, pelo Sindicato da Indústria de Fabricação de Álcool do Paraná (Sialpar) e pela empresa Álcool do Paraná Terminal Portuário S.A. As ações argumentavam que uma parcela da área leiloada funcionava desde 2008 sob responsabilidade da Álcool do Paraná, por meio de uma parceria público-privada (PPP) firmada entre a empresa e o governo estadual, que foram feitos investimentos na casa dos R$ 70 milhões (em valores atuais), que o valor do terreno apenas é superior a R$ 180 milhões e por isso não poderia ter sido leiloado por R$ 1 milhão, e que por fim a área não poderia ter sido transferida a outra empresa sem negociação ou prazo de transição.
A parceria foi firmada no âmbito do Programa de Expansão do Setor Sucroalcooleiro Paranaense, criado pelo Poder Executivo do estado em 2008, na gestão do então governador Roberto Requião (MDB-PR). O programa foi extinto em 2022 pelo decreto estadual nº 11.399/22.
Procurada pela reportagem da Gazeta do Povo à época do leilão, a Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina, responsável pela área, afirmou por meio de nota que que o leilão seguiu todos os trâmites previstos e reiterou que todas as ações ajuizadas foram indeferidas.
Em junho, a Liquipar anunciou investimentos de R$ 572 milhões no PAR50 do Porto de Paranaguá, para triplicar a capacidade de escoamento de líquidos pelo terminal, especialmente de combustíveis. O terminal portuário tem cerca de 85 mil metros quadrados e capacidade de 70 mil metros cúbicos de armazenagem. Com o investimento, a ideia é aumentar a capacidade de armazenagem para 210 mil metros cúbicos.
"Vamos triplicar a capacidade estática de armazenagem, passando de 70 milhões de litros atuais para 205 milhões de litros, com a implantação de novos tanques com capacidade 140 milhões de litros”, afirmou o agora investigado Cleiton Santos Santana ao lado do governador Ratinho Junior, no dia 11 de junho, durante a cerimônia de anúncio do investimento, no Palácio Iguaçu, em Curitiba.
“Também vamos construir o novo píer para escoar esses produtos, tanto na exportação quanto na importação de combustíveis”, completou o empresário. Desde 2019, cinco áreas do Porto de Paranaguá foram concedidas à iniciativa privada e leilões de outras três áreas portuárias estão previstos para ocorrer ainda neste ano.
Nota divulgada pela Liquipar à imprensa
A Liquipar Operações Portuárias esclarece que jamais movimentou qualquer carga de combustíveis, incluindo metanol, no Terminal PAR50, no Porto de Paranaguá. Desde que assumiu a administração do terminal, em abril de 2024, a Liquipar ainda não realizou nenhuma operação, inclusive, seus tanques permanecem vazios e nenhum tipo de produto foi movimentado até o presente momento. A ordem de serviço, que é emitida pela Autoridade Portuária e é indispensável para o início das operações, só foi expedida em junho de 2025. Até então, o terminal não estava apto a operar, o que tornaria tecnicamente impossível qualquer movimentação de cargas nesse período. É importante ressaltar que o licenciamento concedido pelo órgão ambiental IAT, não contempla a movimentação de metanol, limitando-se apenas a diesel, biodiesel e etanol. Essas informações podem ser facilmente comprovadas:
- Pelas guias de importação, que não registram qualquer operação realizada pela Liquipar;
- Pelas estatísticas oficiais disponíveis no site da Portos do Paraná;
- Pelo ofício expedido pela Autoridade Portuária (PROTOCOLO nº: 24.368.330-0) em 6 de agosto de 2025 no qual solicita explicações pela ausência de movimentação junto ao terminal da Liquipar, o que comprova de forma inequívoca e incontroversa, que até o presente momento, não há qualquer movimentação de produtos no PAR 50, área arrendada cujo arrendatário é a Liquipar;
Além disso, destaca que: Todas as operações portuárias são controladas e fiscalizadas pela ANTAQ, Receita Federal, Portos do Paraná e demais autoridades competentes; O investimento de R$ 572 milhões anunciado pela empresa tem como objetivo exclusivo a modernização, a segurança e a ampliação da infraestrutura do terminal, de acordo com o previsto no contrato de arrendamento, em conformidade com todas as exigências legais e ambientais. A Liquipar é por definição um terminal portuário destinado ao armazenamento de líquidos em tanques fixos, ela não realiza transporte de mercadorias ou tampouco formula combustíveis. A Liquipar atua com absoluta transparência e está à disposição das autoridades para cooperar com as investigações, prestando todos os esclarecimentos necessários, em coerência com seu compromisso com a legalidade, a segurança e o desenvolvimento do Porto de Paranaguá.
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