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Marcia Lopes (PT), então ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome entre os anos de 2010 e 2011
Marcia Lopes (PT), então ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome entre os anos de 2010 e 2011| Foto: Arquivo/EBC/Valter Campanato

A londrinense Márcia Lopes foi uma das primeiras indicadas pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) para a equipe de transição no governo federal. Assistente social de formação e ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome no segundo governo Lula (PT), Márcia vai trabalhar ao lado do deputado André Quintão (PT) e da economista Tereza Campelo sob a coordenação da senadora Simone Tebet (MDB) na área da Assistência Social.

Márcia começou sua carreira política em 1993, como secretária de Assistência Social de Londrina, no governo de Luiz Eduardo Cheida (PT). Nos anos 2000, foi eleita vereadora mais votada pelo Partido dos Trabalhadores na cidade. Quatro anos depois, atendendo a um pedido de Lula, assumiu como secretária nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Em 2007, Márcia Lopes se tornou coordenadora da Rede de Pobreza e Proteção Social dos países da América Latina e Caribe no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Entre os anos de 2010 e 2011, foi nomeada por Lula, então em segundo mandato, para assumir o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Em entrevista à Gazeta do Povo, Márcia Lopes disse ter uma ideia do que a equipe vai encontrar junto ao atual Ministério da Cidadania, mesmo antes de ter se integrado ao time da transição do presidente eleito Lula. O cenário, segundo a ex-ministra, é de “ruptura com o pacto federativo”. Ela também falou da necessidade de rever o financiamento do setor e da necessidade de retomada de programas sociais “interrompidos pelo atual presidente”. Confira a entrevista abaixo.

Gazeta do Povo: Qual é o cenário que a senhora, juntamente com a equipe de transição, espera encontrar no setor da Assistência Social do Governo Federal?

Márcia Lopes: Nós já temos boa parte dessas informações. Em 2013, criamos uma Frente Nacional de Defesa do SUS e da Seguridade Social. Contrariamente ao que o atual governo fez, uma verdadeira ruptura do pacto federativo com os estados e municípios, nós nos aproximamos desses entes. Essa frente reúne todos os secretários estaduais e municipais de Assistência Social, os trabalhadores, os usuários, as entidades socioassistenciais.

Agora nós vamos ter que descobrir o que estava invisível aos olhos de quem via de fora. Como é que vamos fechar as contas? Como foi a execução orçamentária nesse período? Qual é a estrutura das equipes?

Gazeta do Povo: Como está o orçamento para a Assistência Social?

Márcia Lopes: Nós saímos de um patamar que chegou a R$ 2,7 bilhões para os serviços, recursos que chegam aos municípios para a manutenção dos CRAS, dos CREAS, dos Centros de População de Rua. Isso veio para R$ 1,1 bilhão, e agora para 2023 teve um corte de 96%. Na prática, o que está previsto para o ano que vem é algo na ordem de R$ 128 milhões. Isso é impraticável, significa acabar com o cofinanciamento a nível federal.

O governo federal não financiou nenhum CRAS, nem CREAS, nenhum tipo de serviço a mais. Extinguiu o PETI, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil; o Programa de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho (Acessuas Trabalho), de formação e capacitação de trabalhadores, foi interrompido. De fato, temos que entender detalhadamente toda a lógica utilizada nesses anos todos em relação aos benefícios, seja o Bolsa Família, Auxílio Emergencial, Auxílio Brasil e os próprios serviços da assistência social que foram “desfinanciados”.

Gazeta do Povo: A estrutura do Ministério do Desenvolvimento Social não é a mesma de quando a senhora era ministra?

Márcia Lopes: O ministério sofreu uma total mudança interna. Foi de Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à fome para Ministério de Desenvolvimento Social e Agrário, depois foi Ministério da Cidadania. O INSS veio para dentro desse ministério, mas não sabemos qual é a estrutura, o que estão fazendo exatamente. As áreas de Cultura e de Esporte, depois de extintos os respectivos ministérios, também foram acomodados ali apesar de não ter relação nenhuma. Mas a gente não sabe exatamente como isso está sendo trabalhado.

Gazeta do Povo: Há alguma das políticas atuais que deve ser mantida no governo Lula?

Márcia Lopes: O que o Lula já falou é que vai potencializar as áreas de defesa da família, mulher e direitos humanos. A Damares (Alves) foi a ministra, mas as políticas públicas foram todas desestruturadas. Estamos falando de políticas públicas raciais, e até mesmo das políticas públicas para as mulheres, que foram desestruturadas. Será feito um redimensionamento tanto de estrutura quanto de visão e direção. O governo Lula obviamente não tem nada a ver com a visão e a condução que a Damares vinha tendo. Não conseguimos nem saber o que foi feito, nem temos resultados concretos.

O nosso foco é no atual Ministério da Cidadania. Ele começou com o Osmar Terra, depois passou para o Onix Lorenzoni, aí veio o João Roma e agora está com o Ronaldo Vieira Bento. Infelizmente, eles todos não tiveram a mesma visão que o presidente Lula tinha nessa área, as mesmas prioridades. É outra lógica, muito diferente.

Gazeta do Povo: De acordo com os dados que a senhora afirma ter e com a experiência anterior na pasta, qual deve ser a prioridade do presidente eleito na área da Assistência Social?

Márcia Lopes: Uma das prioridades é o enfrentamento à fome. Não pode mais haver fome no Brasil. E essa questão da fome passa por um conjunto de políticas públicas, como a alimentação escolar, a alimentação do trabalhador, vigilância nutricional, o crédito rural, a transferência de renda.

A retomada do Bolsa Família como algo que articulava várias áreas é de suma importância. A porta de entrada da assistência são os CRAS. Os CRAS precisam estar com uma equipe completa, que recebe informação, isso cria um processo de mais qualidade no atendimento às famílias. E é isso que é a nossa meta, que nós vamos buscar.

O período é muito curto, há muito trabalho a ser feito. Mas nós vamos contar com o apoio de um pessoal de carreira que certamente vai contribuir com esse trabalho. Eu estou com seis ou sete temas que pessoas de todo o Brasil já me pediram para ter uma atenção especial. São questões de pessoas com deficiência, economia solidária, restaurante popular. É interessante, porque parece que agora o Brasil está respirando uma esperança de ver as coisas sendo retomadas. E vamos ter uma estratégia para receber grupos, entidades, e estaremos dispostos a ouvir.

Gazeta do Povo: Depois de uma eleição tão dividida quanto foi a de 2022, qual é a mensagem que a senhora deixa para os eleitores que não votaram no candidato do PT pela rejeição ao Lula e aos escândalos de corrupção envolvendo o partido?

Márcia Lopes: Essas pessoas podem esperar por um governo republicano por parte do presidente Lula. Ele sabe que a partir de 1ºde janeiro irá governar o Brasil para todos os brasileiros e brasileiras, não só para aqueles que votaram nele. E isso será feito com uma absoluta responsabilidade e com o compromisso de transformar o país e levá-lo nos rumos do desenvolvimento social e econômico esperados. Toda a gente vai ter parte nisso.

O Lula não tolera a fome, não tolera ver os jovens sofrendo ameaças, sendo assassinados, estando fora das universidades. Ele não tolera a violência contra a mulher. Isso será cobrado da equipe. Os aliados serão cobrados para que construam um projeto de nação.

As pessoas também podem ter certeza de que a oposição não será tratada como nós fomos tratados. Lula é um presidente maduro, republicano, e vai tratar tudo dentro do rigor necessário, o rigor da lei, o rigor ético, governando para todos. Todos terão vez e voz, aqueles que de fato querem ver o Brasil mudado. Quem não acredita nisso, paciência.

Nós teremos de volta as conferências, os comitês, as plenárias, tudo aberto. Ninguém será rotulado. Vamos apostar nisso, que a oposição volte a ser adversária e não inimiga. Não se pode conformar com essa relação de ódio que se formou ao longo desses anos. Esperamos que em breve esses ânimos se acalmem, porque isso não é bom para ninguém. Esse foi um tempo que nós vivemos sim, mas queremos que esse tempo acabe.

Agora é diferente, estamos mais animados. Mas eu sei que o que vivemos lá atrás não vai se repetir. Mas a questão é a mesma que o presidente Lula sempre reforça: é preciso ter muita credibilidade e previsibilidade. Isso dará estabilidade às políticas públicas.

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