Histórias

Fafá Conta: um perfil da contadora de histórias que faz sucesso nas redes sociais

Flávia Alves, especial para a Pinó
14/07/2021 18:08
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“Antena, que pro céu aponta, capte uma história, que a Fafá conta!” Para muitos pais de quarentena, a frase entoada de forma ritmada traz um quentinho no coração, uma sensação boa de que nos próximos minutos seus filhos serão levados a um mundo de faz de conta que em nada lembra o caos pandêmico que se instalou nos lares nos últimos meses. O bordão abre alas para Fafá, do canal Fafá Conta, curitibana que encanta crianças de todo Brasil contando histórias de livros.
“Nos últimos meses, os pais se viram em casa, com os filhos, sem escola e sem avós, e eu me tornei de certa forma uma rede de apoio tecnológica. Muitos me dizem que quando minha história começa eles sentem que podem deixar o filho tranquilamente no meu canal, pois sabem que ele vai ficar bem”, diz ela, orgulhosa.
Aos 38 anos, Flávia Ribeiro Scherner (que recebeu da irmã na infância o apelido de Fafá) se tornou referência quando o assunto é contação de histórias, mas isso aconteceu antes mesmo da pandemia. No Youtube, seu canal conta com quase 240 mil inscritos, e no Instagram, tem 176 mil seguidores.
Sua relação com a arte vem de pequena. “Desde criança queria ser atriz, aparecer na TV, fazer propaganda. Tenho vídeos em que apareço brincando de gravar comercial, e sempre ensaiava peças com as amigas, que apresentava para minha mãe quando ela voltava do trabalho. Então, sempre tive essa vontade e hoje sou muito feliz que consigo me sustentar com a arte”, fala.
Com a chegada da vida adulta, Flávia acabou indo para outro lado, e fez Design Gráfico na Universidade Federal do Paraná (UFPR). “Isso abriu o meu olhar para a questão estética, que permeia hoje meu trabalho. Mas trabalhar como designer mesmo nunca trabalhei.”
Após a faculdade, Flávia se mudou para São Paulo, onde apresentou por três anos o programa Zoom, da TV Cultura. De volta à Curitiba, voltou-se ao teatro e aos trabalhos publicitários, sempre como atriz. Até que em um período de entressafra, com poucos trabalhos, decidiu publicar em parceria com a mãe um livro infantil. “Era um livro que minha mãe havia escrito quando eu era pequena, chamado “Os Entalados”. Eu fiz as ilustrações e a diagramação e nós lançamos independentemente”, relembra.
Depois de publicar o livro, Flávia começou a contar voluntariamente a história no Hospital Pequeno Príncipe, até que um dia recebeu um convite inusitado. “Uma amiga minha estava fazendo a festa de aniversário de um ano da filha e me chamou para que eu fizesse uma contação de histórias. Até então nunca tinha pensado nisso como uma possibilidade, mas fui”, diz ela.
A atriz, então, foi fisgada pela contação de histórias. “No que saí de lá, fui para a casa e tive a ideia de fazer uma contação para as crianças que moravam no mesmo prédio que eu e que estavam de férias. E para minha surpresa elas adoraram! E eu senti que era isso que eu queria fazer.”

Uma nova história

Fafá viu seu público de pequenos espectadores<br>aumentar ainda mais na pandemia.
Fafá viu seu público de pequenos espectadores<br>aumentar ainda mais na pandemia.
Com a decisão tomada, ela pensou que a melhor forma de chegar às crianças seria criando um canal. “Eu já queria criar um canal no Youtube com um amigo, que levasse conteúdo infantil de qualidade para as crianças. De repente, foi dando certo e tudo fez sentido!” Entre a ideia e o lançamento não demorou muito. “Quando coloco uma ideia na cabeça eu faço. Realizadora e empreendedora são duas palavras que me definem. Num fim de semana tive a ideia e, no domingo passei o dia todo vendo a parte técnica, testando fundos. Gravei o vídeo, mandei para algumas amigas verem e logo depois já publiquei”, conta.
Surgia então, na metade de 2015, a Fafá, do Fafá Conta. No começo, ela contou com sua intuição, a experiência de atriz e com o jeito natural de lidar com as crianças, além de dicas da irmã, que é terapeuta ocupacional. “Minha irmã sempre compartilhou muito a sua experiência comigo, desde a época em que estava na faculdade, quando morávamos com nossos pais. E aprendi muito também com minha mãe, que sempre teve seu jeito de lidar com crianças sem infantilizá-las demais. Trago muito disso no meu trabalho, o cuidado de não subestimar a inteligência das crianças.”
Mesmo assim, Fafá sentiu que precisava ir além, e por isso buscou uma pós-graduação, em contação de histórias, e se prepara para fazer mais uma em breve, de “Literatura para crianças e jovens”.

Trabalho com significado

Conhecer mais sobre a contação e o universo da criança ajudou também na hora de Fafá guiar seu trabalho. Tanto que mesmo na hora de abordar temas tabus, como a violência sexual contra crianças, Fafá conta com uma base sólida. “Trabalhar com o [livro] Pipo e Fifi [da escritora Caroline Arcari] no meu canal foi um divisor de águas na minha forma de pensar na infância e como iria me comunicar. No final, acabei voltando o meu olhar para isso, o cuidado com a criança. Já fui convidada pelo Hospital Pequeno Príncipe para falar sobre isso e já tive coisas minhas compartilhadas pela Unicef. Estou chegando neste cais, que vêm a criança com o olhar do cuidado”
"Trago muito disso no meu trabalho, o cuidado de não subestimar a inteligência das crianças."

Diversão com conteúdo

Mas se esse cuidado embasa seu trabalho, no front, com as crianças, a coisa flui de forma muito sutil e leve. Tanto que a escolha de seus livros não se guia pela busca de histórias que tragam ensinamentos morais ou lições simplesmente, mas que divirtam e levem em conta o protagonismo e a inteligência das crianças. E o resultado são espectadores encantados.
O público, aliás, aumentou na pandemia, já que Fafá passou a ser essa espécie de “rede de apoio para as famílias”. “Eu já tinha uma presença digital e a facilidade em frente às câmeras, mas o isolamento deu um boom no trabalho e eu consegui chegar a outros lugares. Apesar de não ter a presença física e o olho no olho, eu sinto a troca e as pessoas também.”
Para o futuro, ela sonha com mais audiência, não apenas pelos números, mas pelo que ela representaria: mais conteúdo de qualidade para um maior número de crianças. “Vejo, às vezes, alguns canais que não trazem nada de bom com milhões de inscritos e visualizações, ou pais que deixam seus filhos verem certos conteúdos que eles mesmos não suportam. Quero continuar fazendo o meu trabalho para que todos da família tenham interesse em assistir juntos, e que fomente esta conversa, esta troca.