• Carregando...
O fiscal federal agropecuário Daniel Gonçalves Filho. | Kiko Sierich - GAZETA DO POVO/ Arquivo
O fiscal federal agropecuário Daniel Gonçalves Filho.| Foto: Kiko Sierich - GAZETA DO POVO/ Arquivo

Principal delator da Operação Carne Fraca, o fiscal federal agropecuário Daniel Gonçalves Filho voltou a falar que repassava dinheiro de empresários para um grupo de deputados federais do Paraná. Desta vez, entretanto, durante audiência com o juiz federal Marcos Josegrei da Silva, na quarta-feira (11), em Curitiba, o delator acabou citando o nome do deputado federal João Arruda (PMDB-PR), sugerindo que o peemedebista está entre os beneficiados.

Ouça o relato do delator da Operação Carne Fraca

O delator disse que chegou a se desentender com João Arruda, “que queria mais dinheiro e eu não conseguia”. O parlamentar nega e diz que é “desafeto” do delator, que estaria agindo agora com “sentimento de vingança”. Veja aqui o que diz João Arruda.

Ao longo dos depoimentos que tem prestado no âmbito das ações penais derivadas da Carne Fraca, Daniel já revelou que mantinha “um caixa” para pagar mensalmente um grupo de “quatro a cinco deputados federais do Paraná”. O dinheiro seria recolhido entre empresas que eram alvos de fiscalização do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no Paraná. 

Ainda segundo o delator, havia um recolhimento mais constante, que ele mesmo chama de “mensalinho”, e uma contribuição que ele articulava de forma mais esporádica, como em épocas de campanhas eleitorais. Neste caso, explica o delator, haveria tanto “caixa 2” quanto doação efetivamente registrada pelo candidato e pela empresa. 

Leia também: Delatora diz que político paranaense recebia “mesada” da JBS

O depoimento

O nome de João Arruda surgiu quando Daniel foi questionado pelo juiz federal sobre a conturbada relação entre um fiscal do ministério, Daniel Gouvêa Teixeira, e Idair Peccin, dono do frigorífico Peccin Agroindustrial Ltda e um dos réus da Carne Fraca. Ao tratar do tema, Daniel primeiro contou sobre a possibilidade de uma contribuição de Peccin à campanha eleitoral de João Arruda. Na sequência, explicou ao magistrado que não sabia se a doação de fato havia sido feita, acrescentando na narrativa um episódio de “desentendimento com João Arruda”. 

“O superintendente na época era o Gil. Ele me chamou e disse que ‘o Peccin tá com vontade de colaborar politicamente com os nossos deputados, ele pretende dar uma ajuda de R$ 100 mil, e você vai lá no João Arruda, conversa com ele, e coloca o Peccin em contato com ele, para que ele possa ajudar na campanha política do João Arruda’. Foi isso que aconteceu. Aí eu saí do circuito. Não sei se foi pago ou não. Não tenho mais informação. Porque em um determinado momento, eu fui fazer uma prestação de contas com o João Arruda, houve um desentendimento, porque o deputado queria mais dinheiro, e eu não conseguia. E o Gil também nunca mais falou desse assunto, porque nós tivemos problemas”, narrou Daniel ao magistrado. 

O “Gil” mencionado por Daniel é Gil Bueno de Magalhães, que também figura entre os réus da Carne Fraca. Gil foi superintendente do ministério no Paraná entre 2014 e 2015 e também a partir de julho de 2016 até a prisão no dia da deflagração da Carne Fraca, em março de 2017. Hoje ele já responde às acusações em liberdade e nega ter cometido crimes. 

Já Daniel Gonçalves Filho ocupou a cadeira máxima do ministério no Paraná em três períodos: entre 1992 e 1996; entre 2007 e 2014; e entre 2015 e 2016. Mas, em determinados períodos, mesmo fora da cadeira máxima, ele mantinha influência, segundo investigadores da Carne Fraca. 

Daniel foi indicado ao cargo pela bancada do PMDB do Paraná; Gil alcançou o mesmo posto respaldado pela bancada do PP do Paraná. 

O advogado Elias Mattar Assad, responsável pela defesa de Peccin no processo, disse que seu cliente sempre se manteve em silêncio quando questionado sobre dinheiro a políticos. “Eu o aconselhei a utilizar o direito”, comentou ele, em entrevista à Gazeta do Povo na quinta-feira (12). “Mas, o depoimento do delator vem sem provas. É só a palavra dele”, acrescentou o advogado.

Em consulta ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Gazeta do Povo não identificou doações feitas à campanha eleitoral de João Arruda, em 2014, por Idair Peccin ou pelo frigorífico Peccin Agroindustrial Ltda.

Reinterrogatórios

O depoimento de Daniel Gonçalves Filho, quarta-feira (11), foi prestado no âmbito de uma das ações penais derivadas da operação, e que tramitam na 14ª Vara Criminal de Curitiba. 

Ele já havia sido chamado para participar de outras audiências, mas em todas optou por permanecer em silêncio. Agora, está sendo “reinterrogado” nos processos, pois, em dezembro de 2017, firmou um acordo de colaboração premiada em Brasília, no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF). A partir daí, por causa da delação, é obrigado a revelar o que sabe.

À Procuradoria-Geral da República (PGR) e ao STF, o delator afirma ter entregue a lista de parlamentares envolvidos no esquema de corrupção que funcionaria através do ministério. Devido ao foro especial, os deputados federais só podem ser eventualmente investigados, denunciados e julgados no âmbito da PGR e do STF. 

A íntegra da delação de Daniel permanece em sigilo e, por isso, a PGR e o STF não se manifestam publicamente sobre o caso. Com base nas declarações de Daniel, a PGR pode eventualmente pedir a abertura de um inquérito no STF para investigar os parlamentares. 

Na 14ª Vara Criminal de Curitiba, Daniel participou de quatro “reinterrogatórios” e, logo na primeira audiência, chegou a ser orientado pelo juiz federal Marcos Josegrei da Silva a não citar expressamente nomes de parlamentares durante os depoimentos que presta no primeiro grau – justamente devido ao foro privilegiado dos políticos. 

Outro lado

Gazeta do Povo enviou o trecho do depoimento de Daniel Gonçalves Filho ao deputado federal João Arruda na quinta-feira (12). Ele retornou com uma nota, na qual “esclarece que é desafeto do delator, pois em março de 2016 requereu em ofício a retirada de sua assinatura da carta de indicação do partido ao nome do fiscal”. 

“Por isso, o agente faz acusações sem provas e motivado por sentimento de vingança. O deputado jamais pediu qualquer compensação ou vantagem indevida e irá processá-lo civil e criminalmente”, afirmou João Arruda. 

Cópia do ofício mencionado na nota do peemedebista também foi encaminhada para a reportagem da Gazeta do Povo.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]