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Desembargadores se reunirão na segunda-feira (22), na sessão do Órgão Especial, para decidir como equilibrar a força de trabalho entre o primeiro e o segundo grau. | Jonathan Campos/Gazeta do Povo
Desembargadores se reunirão na segunda-feira (22), na sessão do Órgão Especial, para decidir como equilibrar a força de trabalho entre o primeiro e o segundo grau.| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Um teste de forças está em curso no Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), com mais uma batalha na tarde desta segunda-feira (22). De um lado estão juízes, que lamentam não contar com funcionários em número suficiente para dar conta do trabalho acumulado. Do outro, estão desembargadores, que dispõem de muito mais estrutura do que os colegas, mas não aceitam ceder nada. No meio da polêmica está meia dúzia de entidades que representam servidores, cada uma defendendo os interesses dos associados.

Para complicar, há a obrigação de seguir uma determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e redistribuir a força de trabalho, tudo isso em meio ao processo eleitoral para a escolha do novo presidente do TJ-PR, em novembro. O TJ-PR, por sua vez, informa que encaminhou ao CNJ cronograma de equalização da força de trabalho entre primeiro e segundo graus de jurisdição (veja aqui a nota do tribunal).

Para entender essa situação complicada – que parece restrita ao ambiente do Judiciário paranaense, mas afeta diretamente qualquer um que depender da Justiça Estadual – é preciso retroagir no tempo e perceber a concentração paulatina, ano após ano, de funcionários no chamado segundo grau (que atende prioritariamente aos desembargadores, responsáveis por analisar os processos em fase de recurso ou com direito a foro privilegiado). A estrutura do segundo grau, que sempre foi mais robusta, ficou ainda mais inchada quando o Tribunal de Alçada foi anexado ao TJ-PR, em 2004, aumentando o número de desembargadores de 50 para 120 – com os respectivos servidores.

A partir de 2009, outra decisão administrativa interferiu no quadro de pessoal: a quantidade de comissionados (escolhidos de livre nomeação, sem concurso) quase quadruplicou, passando de 600 para 2,2 mil funcionários. Tudo isso foi possível porque o orçamento destinado ao TJ-PR pelo governo estadual não parou de aumentar, tendo triplicado na última década, de R$ 1 bilhão para R$ 3 bilhões. Mas, de acordo com os críticos, como a Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o investimento deveria ter sido priorizado para o primeiro grau, que representa a porta de acesso da população ao Judiciário e está com trabalho acumulado, causando demora no julgamento dos processos.

Como resposta à liminar do CNJ – concedida no dia 9 de outubro, determinando que medidas sejam tomadas para equilibrar a força de trabalho entre o primeiro e o segundo graus –, o TJ-PR está discutindo os detalhes de uma proposta para minimizar a desproporção. O debate começou no dia 8 e foi retomado na sessão desta segunda-feira (22). A justificativa oficial, apresentada no Órgão Especial, é de que falta dinheiro para fazer as mudanças (remanejamentos e contratações) pedidas por todas as associações interessadas. Representaria despesas adicionais na ordem de R$ 218 milhões ao ano. De acordo com a administração, se esses gastos fossem feitos, o Tribunal correria o risco de atingir o limite e, assim, descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Contudo, a proposta em discussão não apresenta nenhuma sugestão de cortes em despesas. Um exemplo de desperdício foi apontado pelo próprio CNJ, em correição divulgada em setembro: nos últimos dois anos, o TJ-PR gastou R$ 118 milhões “comprando” férias de juízes e desembargadores. Tudo porque não teria uma escala de férias, distribuindo-as ao longo do ano, de forma a não prejudicar o serviço na ausência dos magistrados. Em tese, as férias só não devem ser usufruidas – e consequentemente pode ser “compradas” – quando não foi possível dispor do funcionário, mediante justificativa.

A força de trabalho do 1º e do 2º grau

Segundo o CNJ, o primeiro grau no Paraná deveria ter 89% da força de trabalho e estaria com 57%. Os números são contestados por várias instituições e pelo próprio TJ-PR, que questionam também a fórmula do cálculo. Para tentar atender a resolução 219, que determina a distribuição equilibrada da proporção de funcionários, uma das medidas que estariam sendo analisadas pelo comando do Tribunal seria a redistribuição apenas formal dos atuais funcionários da chamada secretaria. É uma área composta por servidores das mais diversas formações, que dão suporte ao trabalho do Judiciário. É o caso, por exemplo, dos profissionais de informática. Não há analistas de tecnologia de informação disponíveis em cada comarca ou fórum.

Os servidores ligados à secretaria atendem tanto o primeiro como o segundo grau. Para buscar melhorar os números, o TJ-PR estaria disposto a fracionar a quantidade de funcionários para, na conta, redistribuir a força de trabalho.

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Contudo, essa estratégia seria apenas uma manobra para dar uma resposta ao CNJ, já que não atacaria o ponto principal – que é aumentar a quantidade de funcionários na área jurídica, capazes de ajudar os juízes a dar vazão aos processos que se acumulam. Atualmente, a maior parte dos magistrados de primeiro grau conta apenas com dois funcionários no gabinete, para auxílio em análise dos casos e em questões burocráticas, como agendamento de audiências.

A preocupação com uma eventual dissolução parcial da Secretaria levou alguns funcionários a procurarem a Gazeta do Povo, temerosos de que seriam transferidos para outras cidades. Uma das propostas em análise fala na possibilidade de remanejamento de 376 servidores para o primeiro grau, exclusivamente para Curitiba e região, num primeiro momento. Alguns teriam interesse de se transferir para o interior, mas há dúvidas se somente a opção voluntária deve ser adotada.

Segundo Marcel Quadros, presidente da Associação dos Servidores da Secretaria (Assec), o remanejamento compulsório é ilegal. Quando uma pessoa presta concurso para atuar numa cidade ou área, não pode ser transferida para outra, a menos que isso esteja previsto no edital. Ele defende também que o momento do debate sobre as forças de trabalho no Judiciário paranaense deveria propiciar a solução de problemas históricos. “Muitos dos pontos que poderiam ser consertados agora estão sendo deixados de lado”, diz.

Outra “formalidade” que estaria em debate no TJ-PR é a extinção de cargos que já estão vagos. Na prática, nada muda. Mas o número deixa de existir na conta da desproporção. Por outro lado, não estaria sendo considerado na conta do CNJ os 379 cargos comissionados providos no primeiro grau em dezembro de 2017. O Conselho também deu igual peso a processos do segundo grau com os dos juizados especiais e da turma recursal, por exemplo, de trâmite muito mais simples e rápido.

A tramitação de processos no primeiro grau é naturalmente mais demorada – há a necessidade de ouvir depoimentos e juntar provas, por exemplo. Já o andamento em segundo grau tende a ser mais rápido, pois se trata de uma revisão do que já foi analisado. Contudo, a responsabilidade é ainda maior, tendo em vista que pode significar o cumprimento imediato de sentença ou decisão.

Toda essa discussão acontece no contexto da eleição para a escolha da presidência do TJ-PR, marcada para 12 de novembro, e que deverá ter – ainda que apenas os 120 desembargadores tenham direito a voto – o debate sobre a priorização do primeiro grau como uma das principais pautas da campanha.

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Histórico de medidas adotadas

O TJ-PR está discutindo a distribuição da força de trabalho, como uma série de medidas, em resposta ao CNJ, tendo em vista que durante o debate sobre a irregularidade praticada, o TJ-PR foi chamado de “cabide de empregos” pelo conselheiro Luciano Frota, relator do processo. Os desembargadores do Paraná alegam que estão tentando resolver os problemas apontados pelo CNJ e elaboraram um projeto de lei, a ser votado na Assembleia Legislativa, propondo alterações na gestão de pessoal. Mesmo com as medidas que o Tribunal pretende tomar, o quadro de funcionários não será ajustado, no curto prazo, para cumprir todas as normas.

Há uma lei, desrespeitada pelo TJ-PR desde 2013, que estabelece que cada gabinete de juiz deve ter ao menos um servidor de carreira. Para tentar melhorar a situação, o Comitê Gestor de Priorização do 1º Grau de Jurisdição propôs a contratação de 696 analistas judiciários – mas não há a perspectiva de fazer um único concurso público para nomear tantos servidores. Caso a proposta seja enviada para a apreciação na Assembleia Legislativa, a contratação seria escalonada, ao longo dos próximos anos.

A Associação de Magistrados do Paraná (Amapar) chegou a divulgar uma nota, destacando que acredita na seriedade da gestão do Tribunal de Justiça do Paraná, mas que algo precisa ser feito. Entre outros aspectos, a Amapar defende que as regras para a distribuição da força de trabalho devem ser seguidas, mas “de modo a não colapsar a estrutura do Tribunal de Justiça como um todo. Ou seja, busca-se a priorização do primeiro grau, de acordo com as disponibilidades financeiras, de modo a cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal, com equalização entre a força de trabalho do primeiro e o segundo graus. A Amapar seguirá acompanhando o citado pedido de providências com o objetivo de contribuir para a obtenção da melhor solução para a melhoria do sistema de justiça paranaense como um todo.”

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná também divulgou nota, reiterando que sempre reivindicou a priorização para o primeiro grau, destacando que aí está o gargalo do Judiciário. Por outro lado, declarou que não acredita que o TJPR seja “cabide de empregos”. Contudo, defende que distorções sejam corrigidas e que novos gastos, como a criação de câmaras no Tribunal, continuem suspensos. Considerando que ainda em 2018 haverá a escolha da nova cúpula do TJPR, a OAB pretende que os candidatos se comprometam com a redistribuição de força de trabalho para o primeiro grau.

Outro lado

Questionado pela Gazeta do Povo quando começou a votação do projeto para remanejamento da força de trabalho, o Tribunal de Justiça do Paraná enviou nota à reportagem.

1) A Corte paranaense possui concurso público em andamento para o preenchimento de 114 vagas de Técnico Judiciário (Edital 01/2017), cujo certame está em fase de contratação da instituição que ficará responsável pela realização das provas;

2) Ressalta-se, em oportuno, que ocorrerá a nomeação dos aprovados no concurso público de Analista Judiciário - área de Psicologia e Serviço Social, que atuarão no primeiro grau de jurisdição. O certame (Edital 03/2016) ofertou 50 vagas, que deverão ser preenchidas no decorrer deste ano;

3) Cabe destacar que o Tribunal encaminhou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no início deste ano, o cronograma de equalização da força de trabalho entre primeiro e segundo graus de jurisdição para cumprimento da Resolução nº 219/2016;

4) Diante disso, já está na pauta do Órgão Especial, no dia 8 de outubro, a deliberação sobre o anteprojeto de lei que prevê a equalização da força de trabalho;

5) Nesse contexto, o TJPR está redobrando esforços para atender aos critérios exigidos pela Resolução nº 219 do CNJ, dentro das possibilidades orçamentárias da Corte e, principalmente, frente às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal.

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