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Antonio Palocci  deixou a cadeia na quinta-feira, após dois anos e três meses de prisão, beneficiado por um acordo de colaboração premiada. | Albari Rosa/Gazeta do Povo
Antonio Palocci deixou a cadeia na quinta-feira, após dois anos e três meses de prisão, beneficiado por um acordo de colaboração premiada.| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

O ex-ministro Antonio Palocci passou a primeira noite fora da cadeia, depois de dois anos e três meses de prisão, na sede da Polícia Federal em Curitiba, o berço da Operação Lava Jato. Antes, participou de uma audiência na quinta-feira (29) com o juiz federal Danilo Pereira Júnior para receber instruções sobre o novo período de cumprimento de sua pena de 9 anos e 10 dias de reclusão – agora, fora das grades.

Estava visivelmente envelhecido pelos mais de 800 dias de cárcere, com cabelos mais longos que o tradicional que ostentava nos tempos de ex-ministro da Fazenda, ex-ministro da Casa Civil, ex-deputado e ex-todo poderoso do PT e das campanhas do partido

Após três horas de audiência, ele deixou o prédio da Justiça Federal por volta das 20 horas, já com uma tornozeleira eletrônica, em um carro preto, rumo a São Paulo, onde dormiu no apartamento em que mora e foi preso no dia 26 de setembro de 2016.

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Palocci foi condenado em julho de 2017 pelo ex-juiz federal Sergio Moro a 12 anos e dois meses de prisão, por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. O caso envolve propinas do grupo Keppel Fels para o PT e para o marqueteiro João Santana, relacionado a contratos de navios-sondas para a Petrobras – negócios fechados entre 2011 e 2012.

A defesa dele recorreu e em julgamento da apelação na quarta-feira ( 28), no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), a sentença foi revista para 9 anos e 10 dias e o regime fechado foi substituído pelo semiaberto integral domiciliar, sob monitoramento.

A mudança de regime de pena e redução dos anos foram benefícios obtidos com a delação premiada fechada em março com a Polícia Federal, no âmbito de cinco frentes de investigações, e homologada em junho pela relator da Lava Jato no TRF-4 – a segunda instância de Curitiba.

Proteção à testemunha

Uma das cláusulas do contrato de delação premiada prevê que a polícia providenciará sua “imediata inclusão” em programa federal de proteção à testemunhas, caso ele solicite.

O item II da delação de Palocci, sobre os benefícios garantidos em caso de cumprimento do acordo de delação, diz no parágrafo sétimo: “Caso o Colaborador, por si ou por seu procurador, solicite medidas para garantia da sua segurança ou a de sua família, a Polícia Federal representará pela tomada de providências necessárias para a sua inclusão imediata no programa federal de proteção ao depoente especial”. O pedido é feito com base em dois artigos da Lei de Proteção à Vítimas e Testemunhas (9807/1999).

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No parágrafo oitavo, ficam também garantidos os benefícios garantidos ao colaborar pela Lei de Organizações Criminosas (12850/2013), que estipula seis direitos como ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados, ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes dos crimes entre outras.

Na audiência com o juiz Danilo Pereira, o delator recebeu orientações sobre o uso da tornozeleira eletrônica, como o carregamento diário do equipamento. “Infelizmente, (a bateria) dura 24 horas. Então o cuidado do equipamento tem que ser diário. Por que isso? Porque o não carregamento do equipamento nos impede de monitorá-lo. Para nós, isso é uma fuga eletrônica e é uma falta grave, é a mesma coisa que o senhor tivesse pulado a grade da penitenciária e fugido”, explicou o juiz, responsável pelo processo de execução da pena do ex-ministro.

Possibilidade de trabalhar e visitar a mãe

Acompanhado do seu advogado, Tracy Reinaldet, o ex-ministro foi informado que não poderia trabalhar por estar em regime “semiaberto integral” e não em regime “aberto”.

Ele quis saber se poderia trabalhar. Ficou acertado que a defesa faria um pedido formal e o caso seria posteriormente decidido. “Sou autônomo, eu dependo de trabalhar”, disse Palocci. “Acho que assim, no processo de cumprimento de pena, o trabalho não é negativo... não vejo... tenho certeza que o senhor pensa assim também.”

“Muito pelo contrário”, respondeu o juiz. “Não quero passear, não quero nada”, brincou Palocci. Por meio da defesa, o ex-ministro também comunicou que gostaria de pedir para ter autorização para visitar a mãe, Dona Toninha, em Ribeirão Preto (SP).

A maior parte da audiência envolveu o uso e os cuidados da tornozeleira eletrônica. “É a chave da sua liberdade”, encerrou o juiz. “O senhor passou um período significativo preso. Acho que é uma experiência nada boa para ninguém. Ninguém gosta de querer ou tem ideia de voltar. Então a liberdade não está na mão de ninguém, estão nas suas mãos. Talvez, literalmente, nas suas pernas.”

Delação-bomba

Classificada de delação-bomba, o acordo de Palocci é o primeiro de um integrante do topo da pirâmide do núcleo político de comando no esquema de loteamento e de corrupção na Petrobras alvo da Lava Jato.

Seu conteúdo – a maior parte ainda sob sigilo – destrincha como os governos do PT uniram o cartel de empreiteiras, que fatiou as obras de refinarias durante o primeiro ciclo de investimentos na Petrobras nas gestões de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006 e 2007-2010), com multinacionais do setor de exploração de petróleo nos bilionários negócios gerados pelo pré-sal e como os acertos decorrentes bancaram as campanhas de Dilma Rousseff (2010 e 2014) e também campanhas municipais do PT (em 2012).

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Palocci afirmou que Lula não só sabia do esquema de propinas como participou dele, incriminou Dilma, ainda fora dos alvos diretos da Lava Jato, apontou corrupção nas sondas de exploração do pré-sal, nas obras da Hidrelétrica de Belo Monte (PA), em negócios petrolíferos na África e tentativas de obstrução às investigações, entre outras.

Classificada como a “cena mais chocante” de um presidente que “sucumbiu ao pior da política no melhor dos momentos do seu governo”, o delator diz que o caso dos navio-sondas “marca uma mudança significativa” na forma como o ex-presidente interagia com a corrupção nos governos petistas.

“Ele sempre soube que tinha ilícito e sempre apoiou as iniciativas de financiamento ilícito de campanha, mas no caso do pré-sal ele passou a ter uma atuação pessoal, direta”, afirmou Palocci, em uma das 63 vezes que deixou a carceragem para colaborar com os investigadores.

Haverá novidades?

A delação de Palocci tem 18 termos de depoimento que fornecem dados para cinco frentes distintas de investigação da Polícia Federal, em Curitiba. Os casos são investigados pelo delegado Filipe Hille Pace, que conduziu o acordo.

Sua colaboração com a Justiça, no entanto, antecede a delação com a PF. Em 2017, diante do juiz federal Sergio Moro, ele confessou em depoimento o “pacto de sangue” firmado entre Lula e o empresário Emílio Odebrecht, que envolveria R$ 300 milhões à disposição do partido e seus políticos.

Dias depois, tornou pública, via defesa, uma carta enviada ao PT informando sua desfiliação do partido e com a mais dura autocrítica já feita por um petista. Com um ano de prisão, ele confessou crimes indicou que incriminaria Lula. “Não posso deixar de registrar a evolução e o acúmulo de eventos de corrupção em nossos governos e, principalmente, a partir do segundo governo Lula”, escreveu Palocci, um dos fundadores do PT, que foi ministro da Fazenda de Lula, coordenador da campanha e ministro da Casa Civil de Dilma.

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As revelação de Palocci, delator, não param por aí. A defesa conseguiu fechar um acordo também com a PF no âmbito dos casos de alvos com direito a foro privilegiado. Ainda sob sigilo, as revelações sob a guarda do Supremo Tribunal Federal (STF) podem trazer novos fatos e dados. O Ministério Público também aderiu ao acordo.

Palocci não é um colaborador qualquer: ex-ministro da Fazenda de Lula, ex-Casa Civil de Dilma e ex-conselheiro da Petrobras, seu papel de liderança no esquema político de corrupção alvo da Lava Jato pesou na decisão de fechamento do acordo com a PF.

Amplitude

O advogado Tracy Reinandet, que defende Palocci e foi responsável pelo acordo fechado com a PF, afirmou que o cliente “continuará colaborando de modo amplo e irrestrito com a Justiça”, após decisão do TRF-4.

Segundo Reinaldet, “a decisão reafirma a seriedade do procedimento de cooperação realizado com a Polícia Federal de Curitiba. Palocci continuará colaborando de modo amplo e irrestrito com a Justiça”.

Nos documentos apresentados pela defesa ao tribunal da Lava Jato, a defesa sustenta que Palocci vem colaborando com a operação para desvendar a existência da organização criminosa, “quem foram os líderes e demais integrantes”, “a estrutura hierárquica” e a “divisão de tarefas da orcrim” (organização criminosa)”. “Trata-se de uma colaboração realizada por um dos principais integrantes da mais alta cúpula do partido político que ficou por 14 anos no degrau mais elevado do Poder”.

Para a defesa, é uma “colaboração que desnudou por completo o triste funcionamento de uma forma patológica de governar e que não foi apenas útil, mas também necessária”.

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