A deflagração da nova fase da Lava Jato, batizada de Buona Fortuna, pode acabar complicando ainda mais a vida do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A operação, que apurou a existência de crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e fraude à licitação na concessão e construção da usina de Belo Monte, no Pará, traz elementos que mostram que o ex-presidente tinha ciência dos crimes praticados pelas empreiteiras que fizeram parte do consórcio.
Na peça inicial em que o Ministério Público federal (MPF) faz os pedidos de busca e apreensão cumpridos nesta sexta-feira (9), os procuradores citam uma pauta de reunião com o ex-presidente Lula entregue por Emílio Odebrecht em sua colaboração premiada. A reunião teria acontecido em 29 de abril de 2010 para tratar, segundo o delator, “da inclusão da Odebrecht no consórcio que seria contratado para a construção da UHE Belo Monte”.
O MPF também destaca um depoimento prestado por Marcelo Odebrecht sobre o caso Belo Monte, em que o executivo conta que participou, junto com Emílio, de uma reunião chamada por Lula para tratar da entrada da empreiteira no consórcio. “Moral da história: eu já tinha caído fora, com o maior desgaste, aí me lembro que teve reuniões, até teve uma reunião que o Lula chamou eu, meu pai, tava a Erenice, pra dizer que a gente tinha que entrar, que a Andrade ia ser líder do consórcio”, disse Marcelo aos investigadores.
Bumlai
O MPF também aponta, no pedido de autorização das buscas e apreensões, a participação do pecuarista e amigo pessoal de Lula, José Carlos Bumlai, no esquema. Segundo o ex-presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, também colaborador, Bumlai esteve na sede da empresa em São Paulo, em 2011, “se dizendo credor de valores relacionados a Belo Monte, pois teria também atuado na composição do consórcio vencedor”.
Bumlai confirmou, em um depoimento prestado no Supremo Tribunal Federal (STF), que o ex-ministro e ex-deputado federal Antônio Delfim Netto lhe pediu ajuda para a formação do consórcio. O pecuarista, no depoimento, confirmou que pediu uma comissão à Andrade Gutierrez por ter ajudado a formar o consórcio. O pedido, segundo Bumlai, teria acontecido depois que ele ficou sabendo que Delfim Netto recebeu uma comissão das empreiteiras.
“Tem-se, pois, que o papel de Antônio Delfim Netto, ao lado de José Carlos Bumlai, foi essencial para que o Governo Federal alcançasse o seu intento de adjudicar a concessão a um consórcio sob o seu controle indireto”, concluiu o MPF.
Palocci
O ex-ministro Antonio Palocci (Casa Civil e Fazenda/Governos Lula e Dilma) teria sido o “porta-voz” de propinas das de Belo Monte para Delfim Netto, para o PT e para o MDB.
Segundo o procurador Athayde Ribeiro Costa, do Ministério Público Federal, Antonio Palocci, então deputado federal, “foi o porta-voz do governo federal para direcionar os pedidos de propina, parte ao PT para ao MDB. Em um segundo momento, Palocci pediu que 10% do valor de 1% do contrato fosse direcionado a Antonio Delfim Netto, que corresponderia a quantia aproximada de R$ 15 milhões. As investigações até o momento apuraram o recebimento de R$ 4 milhões”, relatou Ribeiro Costa.
Os pagamentos a Delfim Netto, segundo o procurador, “foram efetuados parte em espécie, parte mediante depósitos em empresas de seu sobrinho Luiz Appolonio Neto e dele próprio em contratos fictícios”. A Buona Fortuna cumpriu dez mandados de busca e apreensão nesta sexta-feira.
“Antonio Palocci disse a Flávio Barra e Otávio Azevedo, da Andrade Gutierrez, que 10% da propina destinada ao PT e ao MDB deveria ser direcionada a Antonio Delfim Netto em virtude da sua ajuda na estruturação do consórcio”, declarou.
Segundo a operação, já foram rastreados pagamentos que somam R$ 4,5 milhões de um total estimado em R$ 15 milhões, pelas empresas Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS e J. Malucelli, todas integrantes do Consórcio Construtor de Belo Monte, no Pará. em favor de pessoas jurídicas relacionadas a Delfim Netto, por meio de contratos fictícios de consultoria.
No caso da Odebrecht os pagamentos foram registrados no sistema de controle de propinas da empresa (”Drousys”), com o codinome “Professor”. O nome da operação é uma referência a uma das empresas de consultoria de Delfim, a “Buona Fortuna”.
Outro lado
Os advogados Fernando Araneo, Ricardo Tosto e Jorge Nemr afirmam que Delfim “não cometeu nenhum ato ilícito em qualquer tempo”. “O professor Delfim Netto não ocupa cargo público desde 2006 e não cometeu nenhum ato ilícito em qualquer tempo. Os valores que recebeu foram honorários por consultoria prestada”, afirma a defesa.
A reportagem fez contato com os advogados de Luiz Appolonio Neto. A defesa informou que só vai se manifestar quando tiver acesso aos dados da investigação.
O MDB divulgou nota afirmando que “não recebeu propina nem recursos desviados no Consórcio Norte Energia. Lamenta que uma pessoa da importância do ex-deputado Delfim Netto esteja indevidamente citado no processo. Assim, como em outras investigações, o MDB acredita que a verdade aparecerá no final”.
O PT também se manifestou. “As acusações dos procuradores da Lava Jato ao PT, na investigação sobre a usina de Belo Monte, não têm o menor fundamento. Na medida em que se aproximam as eleições, eles tentam criminalizar o partido, usando a palavra de delatores que buscam benefícios penais e financeiros”, diz nota da assessoria de imprensa da legenda.
Mensagens da equipe de Moraes contra Allan dos Santos prejudicam ainda mais pedido de extradição
Petição pública para impeachment de Moraes se aproxima de 1 milhão de assinaturas
Acordo sobre emendas pode atrapalhar PECs para conter STF, mas oposição insistirá em votação
Desobedecer para não cometer injustiças
Deixe sua opinião