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O deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) diz que o momento político do país justifica as novas estratégias de oposição. | Fernando Frazão/Agência Brasil
O deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) diz que o momento político do país justifica as novas estratégias de oposição.| Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Em seu primeiro dia de trabalho como deputado federal, Marcelo Freixo (PSOL-RJ) disputará a eleição para presidente da Câmara. Se por um lado sua candidatura representa a continuidade de uma tradição em seu partido, sempre presente nas disputas internas, por outro o panorama é diferente das candidaturas de “marcar posição” apresentadas em anos anteriores. Em 2019, o PSOL está sentando à mesa com siglas como PSB, PDT e o antigo desafeto PT, na tentativa de dar musculatura ao projeto de Freixo.

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O deputado diz que o momento político do país justifica as novas estratégias. “Não é só um novo governo que está no país, é quase um novo regime sendo colocado”, diz, em referência à gestão de Jair Bolsonaro. É esse cenário, segundo Freixo, que pode mobilizar forças de esquerda para retirarem o apoio até o momento apresentado ao favorito Rodrigo Maia (DEM-RJ). “Hoje, a candidatura do Rodrigo é uma candidatura do Bolsonaro, por mais que ele tente dizer que não é”, destacou.

Na entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, o parlamentar fala sobre as estratégias utilizadas na corrida eleitoral da Câmara, as suas prioridades como deputado federal e também comenta a decisão do correligionário Jean Wyllys (RJ) de renunciar a um novo mandato.

Por que o senhor quer ser presidente da Câmara?

Essa é uma decisão do PSOL, e não minha. Foi uma decisão da bancada de que a gente lançasse um nome, porque não víamos sentido em apoiar o Rodrigo Maia, que evidentemente é uma representação do que há de mais sistêmico. Isso ainda antes do apoio do PSL ao Rodrigo Maia. Assim como a [Luiza] Erundina (SP) já disputou, e outros do PSOL, o nome escolhido foi o meu dessa vez. A nossa ideia, desde o início, era chamarmos os partidos progressistas, os partidos comprometidos com a democracia para colocar o nosso nome à disposição como uma unidade desse bloco, da defesa da Constituição de 1988, do seu espírito de enfrentamento à desigualdade social, que evidentemente será ampliada pelo governo Bolsonaro.

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Que é um governo voltado pros interesses do latifúndio, para os interesses de uma barbárie que tem muito pouco compromisso com a democracia. O apoio do PSL ao Rodrigo Maia só reforçou a necessidade desse bloco progressista ser colocado, e a gente vem trabalhando esse mês bastante nesse sentido do diálogo com todos os partidos desse campo, podendo ser ampliado. Esse é o princípio que norteou a defesa de uma candidatura própria do PSOL, para ampliar para um setor mais amplo do campo progressista. É reflexo da conjuntura. Porque não é só um novo governo no país, é quase um novo regime sendo colocado.

O senhor iniciará o primeiro mandato como deputado federal. O PSOL tem outros nomes com experiência na casa, como a própria Erundina, além de Ivan Valente (SP), Glauber Braga (RJ) e Edmilson Rodrigues (PA). Por que o candidato é o senhor?

A Erundina não quis disputar, e houve um consenso na bancada para que meu nome fosse colocado como o nome do PSOL. Isso foi unanimidade na bancada do PSOL, que é de 10 deputados. Não foi nenhuma questão difícil para a bancada escolher. Mas qualquer um do PSOL que pudesse estar concorrendo significaria a mesma coisa.

A decisão do deputado Jean Wyllys de não tomar posse de um novo mandato e sair do país interfere de alguma forma na candidatura do PSOL?

A decisão do Jean Wyllys interfere para o país. Quando um deputado que diz que não vai ficar no país porque tem ameaças, crimes de ódio, cabe ao presidente da República tomar providências sobre essas ameaças, e não agir de forma patética, como se estivesse na quinta série, ficar no Twitter, brincando de fazer oposição e esquecendo que ganhou a presidência da República. Acho que é muito grave tudo o que está acontecendo.

O PSOL rotineiramente lança candidaturas à presidência da Câmara, mas geralmente chamadas de “candidaturas para marcar posição”, que são construídas de forma isolada, sem procurar outros partidos. Agora está em composição constante com outras legendas. Por que a mudança?

O que mudou foi o país. É a realidade em que se tem um governo de práticas fascistas ganhando uma eleição. A extrema direita nunca tinha ganho uma eleição na história do Brasil, no máximo chegaram a 10% dos votos. E agora a gente tem um governo eleito, na verdade, mas com práticas como a liberação das armas, o fim do Ministério do Trabalho, a colocação da demarcação das terras indígenas nas mãos do latifúndio, a entrega de todo o controle ambiental, das florestas e do cerrado brasileiro na mão dos interesses do latifúndio. Então há evidentemente um retrocesso muito grande em vista, com medidas já há muito tomadas, além de uma enxurrada de escândalos que eu não vou começar a falar a respeito agora. Então nesse sentido não pode ser uma candidatura para marcar posição.

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Tem que ser uma candidatura para fazer uma disputa política que a seriedade do momento exige da gente. É por isso que a gente está procurando [apoio]. A gente teve uma reunião essa semana com o PT, PSB e Rede, foi uma reunião muito bem sucedida, onde efetivamente a gente pode consolidar um campo. É o desejo da gente. Se vamos conseguir ou não, não depende só da gente. Mas todo o nosso esforço, até o último dia, será feito pela unidade desse setor progressista de esquerda que, agora, é importante estar junto, e será mais ainda no tempo futuro.

Como o senhor está estruturando sua campanha? Há candidatos que estão procurando blocos, outros que estão falando individualmente com os parlamentares.

Nosso debate é político. A primeira coisa que eu fiz foi conversar com o Carlos Lupi [presidente do PDT], que é uma figura central no PDT, conversei com a Gleisi [Hoffmann, presidente do PT], eu respeitei as hierarquias, conversei com a Jandira [Feghali, deputada federal do PCdoB-RJ], com quem tenho uma relação aqui no Rio de Janeiro pelo PCdoB, mandei mensagem pro Alessandro Molon [deputado federal do PSB-RJ], depois procurei o Carlos Siqueira [presidente do PSB], mas foi uma ação muito partidária. Uma ação política coletiva. Eu, o Ivan Valente, que será o futuro líder do PSOL, e o Juliano Medeiros, que é o presidente do PSOL, a gente agiu junto. Então houve uma ação muito coletiva do PSOL, buscando coletivamente esse setor. Então a gente se reuniu com a direção, com a liderança da bancada do PSB, com a direção e com a liderança da bancada do PT, fizemos esses movimentos em relação a todos os setores da esquerda. Não foi um movimento isolado da chamada pequena política dos favores. Trabalhamos na grande política, com o debate central dos temas para o Brasil nesse momento.

O PSOL nasceu como uma dissidência do PT e tratando PT e PSDB como praticamente iguais. Mas de lá para cá, PT e PSOL se aproximaram bastante, a ponto de o PSOL ter sido bem ativo na luta contra o impeachment de Dilma Rousseff, antes mesmo da ascensão de Bolsonaro. O que mudou no PT, para o partido ter recebido esse voto de confiança do PSOL?

Não foi o PT que mudou, foi a realidade. Na verdade, a gente não apoiou o PT. A gente em nenhum momento fez parte de qualquer governo do PT. Ninguém do PSOL ocupou cargos nos governos do PT. A gente fez uma oposição muito séria. Aliás, a gente sai [do PT] no momento de auge do governo Lula. A gente teve próximo do PT quando o PT não estava mais no poder. O que coloca-se é que, diante do impeachment, diante do governo Temer e sua agenda de retrocesso, diante da ascensão de extrema direita, houve uma responsabilidade muito grande do PSOL de chamar não só o PT, mas chamar todos os setores comprometidos com a democracia para tentar essa articulação. Então o que mudou foi a realidade brasileira. Nossas divergências com o PT existem, e são sempre muito honestamente colocadas na mesa.

Existe um acordo informal entre os adversários de Rodrigo Maia para apoio mútuo contra ele no segundo turno. Como o senhor vê essa articulação? Seria também a posição do senhor de apoiar um candidato que não seja o Rodrigo Maia?

Depende. Primeiro, a gente não sabe nem se vai ter segundo turno. Se tiver, eu espero que seja com a gente. Porque o nosso bloco, se for com PSB, com Rede, com PT, vai estar numa condição importante. Já é um bloco maior do que, por exemplo, o do Arthur Lira [deputado federal do PP-AL, também pré-candidato a presidente da Câmara]. Mas a gente não sabe se vai ou não ter segundo turno. Dependendo de quem chegar no segundo turno, caso não seja a gente, tem que avaliar qual o comprometimento dessas forças com o governo Bolsonaro. Hoje, a candidatura do Rodrigo é uma candidatura do Bolsonaro, por mais que ele tente dizer que não é. Então não há a menor possibilidade de ter apoio da gente. E pode ter uma outra candidatura que também apresente o apoio do Bolsonaro. Então não nos interessaríamos nem por uma e nem por outra. Mas a gente está fazendo um trabalho para que o bloco seja representativo e a gente possa estar no segundo turno.

O PSOL tem interesse em presidir alguma comissão, ou ocupar algum posto na mesa da Câmara?

Não é a preocupação central da gente. A preocupação da gente é enfrentar o governo Bolsonaro com o retrocesso que ele vai representar para os trabalhadores brasileiros. Essa é a nossa prioridade: estar junto com a sociedade nas lutas que vão ser colocadas nas ruas. Como a reforma da previdência, a retirada dos direitos dos trabalhadores, as questões ambientais. O que a gente quer é estar fortalecendo a oposição, fortalecendo essa frente de democracia, defendendo a democracia, junto com os setores da sociedade civil. Isso pra gente é prioritário.

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Claro que a gente acha importante estar nas comissões. A gente tem quadros qualificados para isso, a bancada do PSOL é muito qualificada. Nós vamos trabalhar dentro da Câmara para ter a maior produtividade, como sempre tivemos. Inclusive, os deputados do PSOL sempre foram considerados os melhores deputados de Brasília pela imprensa. Então isso, a gente vai continuar, que já é uma marca do PSOL no Congresso. Agora, nesse momento, diante de um governo de extrema direita, com essa pauta, a prioridade para nós da esquerda não pode ser estar olhando para dentro do Congresso, e sim para fora.

Como o senhor está vendo a eleição para a presidência do Senado?

A gente [PSOL] não tem nenhum senador, então isso acaba que fica passando mais distante da gente nesse momento. Mas a gente espera que setores progressistas consigam, pelo mesmo movimento que a gente está fazendo na Câmara, apresentar uma candidatura alternativa ao que Renan Calheiros [MDB-AL] representa no Congresso e na política brasileira.

Cid Gomes, apontado como um pré-candidato do bloco de esquerda, seria um bom nome?

Aí depende do que as forças políticas que estão no Senado vão colocar. Mas acho que é um bom candidato, sim.

Quais as prioridades do senhor, individualmente falando, como deputado federal?

O Congresso como um todo que resgatar o espírito da Constituição de 1988 e enfrentar a desigualdade social. Isso é o que o Brasil precisa. O Brasil já é o nono país mais desigual do mundo, e essa desigualdade aumentou. Pela primeira vez desde 1990 a gente tem um aumento da desigualdade infantil. Os números da realidade brasileira são muito traumáticos. Qualquer deputado, independentemente da sua área, tem que trabalhar o enfrentamento da desigualdade social. Isso é a prioridade. Eu tenho uma atuação muito grande na área de segurança pública, na área de educação, não tem como fugir disso, eu sou professor há 20 anos. Fiz muita pesquisa na área de segurança pública, fui presidente de comissões da área na Alerj [Assembleia Legislativa do Rio] por 10 anos. Não posso apagar isso, minha formação política, no Congresso Nacional. Mas como novidade, o que eu quero muito é me dedicar à questão da tributação. No que diz respeito a uma reforma tributária, eu acho que é uma forma muito mais imediata e eficaz de enfrentamento à desigualdade. Então, como algo novo, além do histórico que eu tenho e vou trabalhar, acho que a questão tributária é algo a que me interessa muito me dedicar.

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