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Congresso Nacional em Brasília
Congresso Nacional em Brasília| Foto: Bigstock

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita decisões monocráticas de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) será uma das prioridades do próximo ano no Congresso Nacional. A PEC 08/2023 foi aprovada pelo Senado e enviada para análise da Câmara dos Deputados, que ainda não se manifestou sobre como vai encaminhar a matéria. A medida deverá passar por uma comissão especial.

Ainda no campo das tensões com o Judiciário, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), terá que se pronunciar em 2024 sobre a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar casos de abuso de autoridade.

Deputados se mobilizaram na reta final dos trabalhos em 2023 para conseguir as assinaturas que faltavam para instalação da comissão, que teve o pedido protocolado, mas, como não foi feita a leitura em plenário, ainda não foi instalada. Resta saber se o presidente da Câmara vai considerar os requisitos necessários para a instalação como cumpridos e determinar a indicação de membros para que comece a funcionar, ou então irá protelar a decisão sobre a questão.

No próximo ano, também deverá voltar à pauta da Câmara o chamado PL das Fake News, ou da censura, como prefere chamar a oposição ao governo federal. A ideia do projeto era regulamentar as big techs, mas devido à resistência de parlamentares oposicionistas, a matéria não andou, e chegou a ser incluída como parte de um projeto de direitos autorais, que também não evoluiu por falta de consenso entre os congressistas.

Outra pauta que deverá voltar com força será a reforma administrativa, também elencada por Lira como prioridade para ajustes quanto aos gastos públicos. Mas a matéria enfrenta resistência por parte do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem base forte entre sindicalistas e funcionalismo.

Lira já defendeu publicamente, por diversas vezes, o texto da PEC aprovado por uma comissão especial ainda no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e que está "pronta para votação". Mas muitas lideranças discordam do texto, e sugerem nova redação, com apoio de frentes parlamentares e segmentos, principalmente empresariais, que também se manifestam a favor de uma máquina publica mais enxuta e eficiente.

Também será discutida em 2024 a regulamentação de alguns pontos da reforma tributária aprovada neste ano (leia mais abaixo). A questão deve gerar novos embates entre o governo e a oposição nas duas Casas do Legislativo.

Além disso, o projeto do mercado de carbono será avaliado do Senado, já que foi aprovado na Câmara em 2023.

Como foi o ano de 2023 no Congresso

Antes do início do ano legislativo de 2023 no Congresso Nacional, o governo do então presidente eleito em 2022, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), contou com o apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para aprovar a chamada PEC da Transição. O objetivo era garantir o pagamento do Auxílio Brasil, que voltou a se chamar Bolsa Família, de R$ 600 mensais, retirando o benefício do teto de gastos que o governo precisa respeitar. Para o líder da federação PT-PCdoB-PV, Zeca Dirceu (PT-PR), a aprovação da PEC da Transição "está garantindo a retomada do crescimento da economia".

Outra votação de destaque, ainda no primeiro semestre de 2023, foi a derrubada de artigos do decreto editado pelo governo Lula que alterava o marco do saneamento básico, reestabelecendo o marco de 2020, da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Essa foi a primeira derrota da gestão petista no Legislativo. Parlamentares reclamavam que os decretos de Lula eram um retrocesso em relação a uma lei já aprovada pelo Congresso Nacional, já que as medidas do Planalto flexibilizavam regras de concessão e serviços de coleta de esgoto e tratamento de água.

As criticas partiram inclusive de Lira, que passou a criticar a falta de articulação política do governo, comandada por Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais, e a ausência de Lula no corpo a corpo direto com os parlamentares para negociar pautas.

Em outro momento importante de 2023, os deputados conseguiram aprovar o projeto que estabeleceu 05 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, como limite para a demarcação de terras indígenas no país, antes que o Supremo Tribunal Federal (STF) chamasse a discussão para a Corte. Mas a tese foi rejeitada em julgamento no Supremo. Diante disso, uma nova lei foi aprovada pelo Senado Federal, mas foi vetadada pelo presidente Lula. O Congresso Nacional, porém, derrubou o veto presidencial e reafirmou a validade da nova lei.

Pelas razões citadas, o marco temporal foi literalmente um "marco" em 2023. Além das idas e vindas da matéria, houve protestos e um grande movimento encampado por diversas frentes do Congresso, compostas por representantes que iam desde o agro até o empreendedorismo. Esses grupos decidiram "declarar guerra" à interferência do Judiciário no Legislativo, e promoveram obstruções em votações no Congresso.

Também houve uma série de conflitos entre Legislativo e Executivo para a aprovação da medida próvisória que restruturava a Esplanada dos Ministérios. O governo se viu em maus lençóis para a criação de 37 ministérios e a MP foi aprovada às vésperas de "caducar", termo usado quando poderia perder a validade. Os parlamentares tiraram atribuições dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas e ainda diluíram o poder do Ministério do Desenvolvimento Agrário frente à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O texto foi aprovado com reclamações dos deputados novamente sobre a falta de diálogo entre o Planalto e a Câmara dos Deputados.

Pauta econômica: aumento de arrecadação

Ainda no primeiro semestre de 2023, o governo Lula enfrentou dificuldades para emplacar a agenda econômica, que buscava engordar os cofres públicos, com aumento de arrecadação. O arcabouço fiscal, conjunto de regras para substituir o teto de gastos, foi enviado ao Congresso para assegurar gastos considerados prioritários e possibilitar o aumento dos investimentos públicos, mas sem gerar descontrole nas contas do governo. Inicialmente, a gestão petista se comprometeu a manter a meta de déficit fiscal zero em 2024, mas agora já acena com a possibilidade de tentar mudar essas regras.

Depois veio a reforma tributária, proposta que diversos governos tentaram aprovar por mais de quatro décadas sem sucesso, e que enfrentou forte resistência dos parlamentares. Em meio a muita negociação - e liberação de emendas parlamentares -, o texto foi discutido por um grupo de trabalho e depois levado a plenário pelo relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). A reforma tributária prevê a substituição de cinco tributos (PIS, Cofins e IPI, de competência federal; e ICMS e ISS, de competências estadual e municipal, respectivamente) por um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA).

O IVA é um imposto que incide de forma não cumulativa, ou seja, somente sobre o que foi agregado em cada etapa da produção de um bem ou serviço, excluindo valores pagos em etapas anteriores. O modelo acaba com a incidência de impostos em cascata, um dos problemas históricos do sistema tributário brasileiro, mas enfrentou muitas críticas de setores, como de serviços; e de parlamentares de oposição, que consideraram que o imposto ficará muito alto.

O texto acabou aprovado pela Câmara, mas foi modificado pelo Senado, e, no retorno à primeira Casa, os parlamentares optaram por acatar pontos em comum e votar um novo substitutivo que permitisse a promulgação ainda em 2023. Apesar disso, a regulamentação de diversos pontos voltará a ser tema de debate em 2024, e promete muita discussão tanto na Câmara quanto no Senado.

O reestabelecimento do voto de qualidade do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que permitiu ao governo contabilizar verbas no caso de disputas em que havia empate nas votações, beneficiando a União, foi mais um dos embates do ano no Congresso. O texto rendeu dias de negociação e concessões para poder passar pelo crivo dos parlamentares.

Outra aposta da equipe econômica para engordar o caixa e ajudar na manutenção do déficit fiscal zero foi aprovada também no apagar das luzes do ano legislativo: o projeto que regulamenta o mercado de apostas esportivas on-line, as chamadas "bets". O texto aprovado pela Câmara dos Deputados incluiu jogos on-line no projeto, como cassinos, na regulamentação. De acordo com o texto, as empresas terão que pagar 12% sobre o faturamento, com as apostas on-line; enquanto os apostadores pagarão imposto de 15% sobre o ganho com os jogos.

CPIs debateram desde atos de 8 de janeiro até invasões de terra

Além do plenário, o corredor das comissões no Congresso Nacional também viveu dias movimentados com a instalação da CPMI do 8 de janeiro, criada para apurar os atos que resultaram na depredação do patrimônio público na Praça dos Três Poderes; a CPI do MST, para apurar quem financiava as invasões de terra pelo Brasil afora - que registrou grande aumento logo no início do governo Lula; a CPI das Americanas, para apurar um rombo nas contas da empresa; a CPI das Pirâmides Financeiras, que tinha como objetivo investigar as pirâmides que se utilizavam de criptomoedas para negociações duvidosas; e a CPI do Futebol, para desvendar uma suposta alteração em resultados de partidas e jogos do Campeonato Brasileiro.

Com relação à CPMI do 8 de janeiro, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) dedicou parte de seu parecer para rebater a suspeita de omissão do ministro da Justiça, Flávio Dino, seu aliado político. Para justificar o não-acionamento da Força Nacional por ele em tempo de impedir as invasões dos prédios da Praça dos Três Poderes, a relatoria direcionou a responsabilidade da inação ao governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB).

Já a oposição contestou a obrigatoriedade do pedido do chefe do Executivo local para o emprego da corporação, com base em situações anteriores semelhantes. Como agravante, os parlamentares oposicionistas lembraram que 240 homens estavam a postos na sede do Ministério da Justiça, além do fato de envolver o interior de edifícios da Administração Federal.

Já na Câmara, a CPI do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi encerrada sem a apreciação de 287 requerimentos elaborados pelos deputados membros da comissão.

Além disso, também não houve votação sobre o relatório do deputado Ricardo Salles (PL-SP). Para o parlamentar, os movimentos de invasão de terras atuam como "facções criminosas", comparadas às do tráfico de drogas, por adotarem práticas "ilegais e abusivas". No documento, o deputado usou o termo "facção sem-terra".

Agenda Verde: Câmara votou medidas de incentivo à transição de energia

Defendida pelo governo e por Lira como primordial para acelerar a transição energética, a Câmara também avançou em projetos que incentivam a substituição por fontes mais limpas e sustentáveis de energia.

Entre os projetos aprovados está o que cria o marco legal do hidrogênio verde, para a produção de energia com baixa emissão de carbono. Também foi aprovado o projeto que regulamenta a construção de usinas eólicas em alto-mar, que, no sentido aposto, acabou também incluindo a extensão de subsídios e incentivos a usinas a carvão. Neste caso, parlamentares inseriram ainda "jabutis", jargão usado quando o texto inclui matérias estranhas ao objetivo original, o que pode acabar encarecendo o custo de energia para o consumidor.

Outro ponto da chamada pauta verde aprovado foi o projeto que trata do mercado de carbono. O texto aprovado pela Câmara determina que empresas que emitam a partir de 10 mil toneladas de gás carbônico equivalente (CO2e) por ano devem submeter um plano de monitoramento das emissões, que deverá ser analisado pelo Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), mecanismo criado pelo projeto de lei. A matéria agora será apreciada pelo Senado Federal no ano que vem, e promete render ainda muito debate.

Líderes fazem balanço de 2023

O vice-líder da oposição na Câmara, deputado Maurício Marcon (PL-RS), considera que o ano foi marcado por aumento de impostos e burocracia. "A própria reforma tributária ainda terá que ser entendida", alerta, se referindo às regulamentações pendentes que ficaram para o ano que vem, com o maior IVA do mundo.

"Ano que vem eu espero que a gente vote menos aumento de imposto e consiga manter a liberdade de expressão tão ameaçada hoje, e a reforma administrativa, tão importante para o país", afirmou Marcon.

Já o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), disse que as maiores conquistas do governo no ano foram a aprovação da reforma tributária, o marco fiscal e a PEC da Transição. Ele também destacou como uma vitória a retirada de pauta do projeto sobre o Novo Ensino Médio, pelo fato de o governo ser contra a diminuição da carga horária obrigatória.

Sobre os desafios para 2024, Guimarães disse que um dos pontos prioritários deverá ser o PL das Fake News. "Nós temos que unificar a Casa para votar [o PL das Fake News]. Temos que hierarquizar as prioridades e votar essa matéria. Não podemos ir para as eleições [municipais de 2024] no mesmo modelo que fomos em 2022”, disse.

Guimarães também defendeu a autonomia entre os poderes, e disse que o governo não vai se envolver com a discussão de temas sobre mudanças na condução do Supremo Tribunal Federal. “Não é pauta prioritária. O governo não vai se envolver”, afirmou em relação à PEC que limita decisões monocráticas da Corte.

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