
Ouça este conteúdo
A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (16) a proposta de emenda à Constituição (PEC) 3/21 que restringe investigações e prisões de deputados e senadores. O texto foi aprovado em primeiro turno por 353 votos a favor a 134 votos contra. No segundo turno, foram 344 votos a 133. A sessão foi encerrada e os deputados devem retomar a análise dos destaques que podem alterar o texto nesta quarta-feira (17).
Durante a votação dos destaques, após a aprovação do segundo turno, parlamentares contrários à PEC conseguiram suprimir a votação secreta para pedido de prisão e abertura de processo criminal contra parlamentares. Para manter a redação original, eram necessários 308 votos contra o destaque apresentado pelo Novo, que pediu a exclusão das votações sigilosas nesses casos. No entanto, os deputados que defendiam o texto original conseguiram 296 votos contra o destaque. Com isso, o trecho foi retirado da proposta.
No primeiro turno, dois destaques foram descartados. Um destaque da federação Psol-Rede, rejeitado por 322 a 147, defendia a exclusão da votação secreta para analisar a prisão em flagrante de deputados e senadores. Já outro destaque do Novo, rejeitado por 317 votos a 156, pretendia excluir da proposta a atribuição de foro privilegiado no STF para presidentes nacionais de partidos políticos com representação no Congresso Nacional.
A inclusão da PEC foi definida na reunião de líderes realizada na manhã desta terça e reflete uma tentativa da cúpula do Congresso de sinalizar unidade em torno de um tema que interessa diretamente ao parlamento, apesar da pressão popular contrária. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse ter pautado a proposta por ter “compromisso com a autonomia do mandato parlamentar”.
“Diante de muitas discussões, atropelos, de abusos que aconteceram contra colegas nossos em várias oportunidades, a Câmara tem a oportunidade de dizer se quer retomar o texto da Constituição de 1988 ou não. É um texto sem novidades, sem invencionismos, que garante o fortalecimento do mandato parlamentar. Não é uma pauta do governo ou da oposição”, afirmou Motta.
Um novo encontro de líderes foi marcado para quarta-feira (17) para tratar especificamente da anistia, mas não está descartada a possibilidade de novo adiamento, a depender das negociações entre base, oposição e Centrão.
A chamada PEC da Imunidade, também conhecida como PEC da Blindagem ou PEC das Prerrogativas, prevê que deputados e senadores só possam responder a ações penais com autorização da própria Casa legislativa a que pertencem. Na prática, o mecanismo amplia a proteção dos parlamentares e dificulta o andamento de processos no Supremo Tribunal Federal (STF).
O deputado Claudio Cajado (PP-BA), relator da PEC da Imunidade, destacou que sem essas “prerrogativas” os parlamentares não teriam plena autonomia para cumprirem seus mandatos. Segundo ele, o objetivo da proposta é “preservar o Poder Legislativo de eventuais excessos ou abusos por parte do Executivo ou do Judiciário” e reforçar a “independência” do Congresso.
“As prerrogativas não podem ser confundidas com privilégios incompatíveis com o princípio republicano. São, em verdade, garantias indispensáveis à própria viabilidade institucional do Poder legislativo”, disse o relator. Cajado afirmou que “em hipótese nenhuma” a PEC trata sobre “privilégios individuais”, mas sim “resguardar garantias institucionais que pertencem, na verdade, à sociedade brasileira”.
O que prevê a proposta da PEC da Imunidade
A versão inicialmente discutida incluía a exigência de aval até mesmo para a abertura de inquéritos ou investigações, o que foi criticado como uma blindagem total. A nova redação, no entanto, restringe o filtro à autorização para ações penais. Os parlamentares consideraram que a mudança busca suavizar as críticas de que a proposta representaria um “regime de exceção”.
O substitutivo apresentado ao plenário estabelece ainda que a Casa de origem do parlamentar terá um prazo de 90 dias para deliberar sobre a abertura da ação. Antes, não havia prazo, o que permitia o engavetamento dos pedidos. Veja abaixo as regras previstas:
- Os deputados e senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento apenas perante o STF e, a qualquer tempo, somente serão alvos de medidas cautelares de natureza pessoal ou real dele provenientes;
- Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável, nem processados criminalmente, sem prévia licença de sua Casa;
- O indeferimento do pedido de licença suspende a prescrição enquanto durar o mandato;
- No caso de flagrante de crime inafiançável, os autos serão remetidos, dentro de 24 horas, à Casa respectiva, para que, pelo voto secreto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão e autorize, ou não, a formação de culpa.
Inicialmente, a PEC previa que a licença para processo e prisões deveria ser deliberada "por votação secreta da maioria absoluta de seus membros", mas o texto foi alterado por um destaque do Novo e a possibilidade de votação secreta caiu.
Com a mudança, o trecho deve determinar que a autorização para abertura de processo criminal ou prisão será "deliberada pela respectiva Casa Legislativa", por "maioria absoluta de seus membros", em até 90 dias a contar do recebimento da ordem emanada pelo Supremo Tribunal Federal.
Contudo, o destaque não altera a previsão de votação secreta para validar ou relaxar eventual prisão em flagrante por crime inafiançável de deputados ou senadores. Além disso, a PEC estende o foro por prerrogativa de função a presidentes nacionais de partidos com representação no Congresso.
Necessidade de quórum para votar investigações
Outro ponto em debate na versão inicial da PEC é o quórum de votação, pois, para autorizar a tramitação de um processo, será exigido o apoio de dois terços dos deputados (342 votos) ou senadores (54 votos). Esse número elevado é visto como um obstáculo quase intransponível, reforçando pontos de corporativismo.
O deputado Claudio Cajado, relator do texto, estabeleceu que a tramitação do processo será decidida por maioria absoluta em votação secreta, ou seja, serão necessários 257 votos na Câmara e 41 votos no Senado.
Para críticos, a proposta não atende a nenhuma demanda da sociedade, mas fortalece mecanismos de autoproteção do Congresso. O governo federal já sinalizou contra a PEC, mas admite não ter condições de barrar sua tramitação diante da força do centrão e de partidos da base que a apoiam.
A retomada da PEC da Imunidade ocorre em meio ao impasse sobre a anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro, tema que enfrenta divisões internas no parlamento. Para aliados do centrão, aprovar a PEC seria mais simples e daria ao Congresso uma vitória política “sem o desgaste imediato da anistia”.
Discussão da PEC no plenário
O deputado Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR) disse ser contra qualquer privilégio ou prerrogativa que um parlamentar honesto não precisa. "Nunca precisei da proteção da lei, mais que o cidadão tem", declarou. O deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB), vice-líder da oposição, afirmou que a PEC não é da imunidade ou da blindagem, mas um equilíbrio de poderes, informou a Agência Câmara.
"Que democracia é esta em que o Parlamento, que tem representação de 100% da população, é chantageado por outros Poderes?", questionou. Para o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), vice-líder da Minoria, o texto está longe do ideal, mas protege deputados de "processo criminal abusivo" que possa passar sem avaliação da Câmara.
A líder do Psol, deputada Talíria Petrone (RJ), destacou que a imunidade parlamentar não é absoluta. "Esta não é a agenda que o Brasil espera de nós", disse. Ela criticou a possibilidade de a medida beneficiar deputados que cometeram crimes hediondos, como estupro e latrocínio, que dependeriam do aval do Congresso para serem processados.
O deputado Kim Kataguiri (União-SP) ressaltou que aprovar a PEC é pedir para o crime organizado disputar cadeiras e vencer eleições para fugir de investigações. "Durante o período da Constituição de 1988, quando o texto que querem aprovar agora estava em vigor, nenhuma investigação foi autorizada", disse.
Kataguiri afirmou que a proposta não reage a abusos do STF, mas cria abusos do Parlamento para blindar a corrupção. "O que está sendo votado é a diferença entre o remédio e o veneno, é a dose", declarou.
VEJA TAMBÉM:





