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Acampamentos foram instalados em frente ao quartel general do Exército em Brasília e em outras cidades do país, em protesto pela eleição do petista Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
Acampamentos foram instalados em frente ao quartel general do Exército em Brasília e em outras cidades do país, em protesto pela eleição do petista Luiz Inácio Lula da Silva (PT)| Foto: EFE/ Joédson Alves

De forma compulsória, negociada ou voluntária, os acampamentos de manifestantes contrários ao resultado das eleições de 2022 podem estar com os dias contados, sobretudo o montado em frente ao Quartel-General (QG) do Exército, em Brasília. O gabinete de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), atuam para desmobilizar o acampamento na capital federal e contam com o apoio do Exército.

Ao menos 40 barracas e duas cozinhas foram desmontadas no acampamento em frente ao QG, informou Ibaneis nesta terça-feira (27). Segundo ele, a desmobilização e as desmontagens são feitas de forma voluntária e negociada. Ele confirmou que a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) mantém diálogo com o Exército para "acelerar a desmobilização", que, segundo ele, já é feita "há várias semanas".

"A gente aguarda novas operações até o dia da posse para que possamos desmobilizar todo esse pessoal. O Exército vem cuidando disso diariamente, desmontando parte dos acampamentos. Isso está acontecendo de forma bastante pacífica. A notícia que temos por parte do general Dutra [comandante militar do Planalto] é de que a desmobilização está sendo feita pouco a pouco, e isso tem trazido um ambiente de mais tranquilidade", afirmou Ibaneis.

Em resposta ao jornal Valor Econômico publicada na segunda-feira (26) a um questionamento feito sobre a possibilidade de ser desmobilizado o acampamento em frente ao QG, o Centro de Comunicação Social do Exército (CCOMSEx) informou que mantém "permanente ligação" com os órgãos de segurança pública do DF.

Segundo uma liderança conservadora que atua junto aos movimentos de rua, o Exército não tem atuado para retirar os manifestantes do QG, mas está dificultando a instalação de novas barracas. "O próprio Exército está dificultando ao não deixar entrar novas barracas", diz reservadamente à Gazeta do Povo.

Já os membros do gabinete de transição de Lula adotaram discursos divergentes sobre o acampamento em frente ao QG. Na segunda, o futuro ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, disse ao Valor Econômico que não há a intenção de tirar "ninguém na marra". Nesta terça, em coletiva à imprensa junto a Ibaneis, disse acreditar que o movimento de manifestantes tem sido pacífico e que o atentado supostamente planejado por um de seus frequentadores foi um ato isolado.

O futuro ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), por sua vez, afirmou anteriormente que os acampamentos viraram "incubadoras de terroristas" e disse nesta terça que estuda retirar os grupos de manifestantes de forma compulsória. Em entrevista à CNN Brasil, disse que o acampamento em frente ao QG está em "fase final" e voltou a criticar os manifestantes. "Estamos vendo uma tentativa, infelizmente, de trazer o terrorismo político para o Brasil, e nós não vamos aceitar", declarou.

Como militares acreditam que será a desmobilização dos acampamentos

A despeito da atuação entre o Exército e os órgãos de segurança pública do DF, militares da ativa e da reserva ouvidos pela Gazeta do Povo acham improvável a adoção de quaisquer medidas diretas por parte da força armada para desmobilizar os acampamentos, inclusive o em frente ao QG em Brasília. Para eles, qualquer esvaziamento acontecerá em decorrência de um processo natural, quando Lula tomar posse e os manifestantes assimilarem que seus pleitos não serão atendidos.

O general reformado Paulo Chagas é um dos que acredita nessa hipótese. "Acho que isso vai se esvaziar naturalmente na hora que ele [Lula] assumir. Com todos os defeitos e problemas que a gente vê em relação a uma pessoa como ele tomar posse, mas quem elegeu o Lula foi o povo, mesmo sabendo quem ele é", diz. O militar desconfia do resultado eleitoral e acha que o presidente Jair Bolsonaro (PL) deveria ter tomado medidas para pedir a abertura do código fonte das urnas, mas prega respeito ao cenário vigente.

Chagas tem conhecimento por pessoas próximas de que o acampamento em Brasília se "esvazia por si" e acredita que a tendência é de uma desmobilização pacífica, que, no entendimento dele, deveria ter sido defendida pelo presidente Bolsonaro. O general acredita que não haverá necessidade de atuação dos militares e que, após a posse, no máximo haverá "três ou quatro" barracas montadas que poderão ser desmobilizadas por atuação da própria Polícia do Exército em acordo com os manifestantes.

"Vão pedir com educação para que se retirem para que possam recuperar aquela área, que virou um lamaçal, vai demorar para recuperar e vai ter que ser recuperada. Nem sei o que vão fazer para recuperar aquilo, mas vão ter que recuperar", diz Chagas.

O coronel da reserva Walter Félix Cardoso Júnior também não acredita na possibilidade de o Exército ordenar uma desmobilização em frente ao QG. "O Exército não vai fazer esse papel de 'passar o rodo' ou autorizar que 'passem o rodo' ali", avalia. Ele foi coordenador de segurança do gabinete de transição de Bolsonaro em 2018 e trabalhou na Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência na gestão.

Félix desconhece qualquer autorização concedida pelo Exército para que a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal atue na desmobilização dos acampamentos. Sobre as dificuldades impostas pelo Exército para a montagem de novas barracas, ele acredita que isso esteja atrelado a um motivo de segurança, não por decisão ou influência política. Ele explica que, naquela região, moram os generais de Exército (os "quatro estrelas") da ativa.

"Essa determinação pode ser por um motivo de segurança. Pode ser que a coisa tenha ficado fora de controle e isso pode estar interferindo nas rotinas de segurança da Força. Mas não que isso tenha motivo político, porque o Exército sempre esteve do lado do povo", destaca.

Um militar da ativa, que preferiu não ser identificado na reportagem, corrobora a leitura e afirma que o gabinete de transição de Lula pode até tentar convencer os militares, mas acredita que isso apenas geraria um desgaste maior das Forças Armadas, tanto com a esquerda quanto com movimentos da direita.

Exército nega associação da passagem de Comando aos acampamentos

Os militares também rechaçam a hipótese de que a antecipação da passagem do Comando do Exército, anunciada nesta terça-feira (27), seja uma forma de desmobilização dos acampamentos do QG em Brasília, como chegou a ser ventilado. O atual comandante, general Freire Gomes, deixará o cargo nesta sexta-feira (30) e será sucedido pelo indicado de Lula, general Júlio Cesar de Arruda. O Exército assegura, porém, que isso não tem qualquer ligação com os manifestantes.

“A passagem de Comando será realizada no dia 30 de dezembro. A data foi marcada em coordenação com o Ministério da Defesa, independente das ações em relação aos acampamentos de manifestantes”, informa à Gazeta do Povo o Centro de Comunicação Social do Exército (CCOMSEx).

Os comandantes da Marinha, almirante de esquadra Almir Garnier Santos, e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Carlos de Almeida Baptista Junior, devem permanecer até o fim de seus mandatos, em 31 de dezembro. Eles serão sucedidos pelo almirante de esquadra Marcos Sampaio Olsen e pelo tenente-brigadeiro do ar Marcelo Kanitz Damasceno, ambos indicados por Lula.

O general Paulo Chagas vê com naturalidade a escolha da data da cerimônia de passagem do Comando do Exército e avalia que é uma atitude preventiva para não haver descontinuidade das atividades e assegurar a normalidade institucional e situação da ordem. “Vamos dizer que haja tumulto. No meio do tumulto, se houver a necessidade de intervenção da força, é possível trocar o comando do Exército? Então, por uma questão de segurança operacional, é melhor trocar antes”, comenta.

O general da reserva Santos Cruz faz uma análise semelhante. “Eu acho que essa data de passagem de comando não tem nada a ver com o acampamento na frente do QG. Isso é só acerto administrativo. É uma solenidade que tem uma formalidade, tem o pessoal convidado, tropa, etc”, destaca. “Sábado (31) e domingo (1º) serão para os preparativos e cerimônia de posse do presidente da República. É um calendário absolutamente normal que, para mim, não tem nada a ver com o tal acampamento”, reforça.

Santos Cruz diz que é normal ter as solenidades de passagem de Comando em dias diferentes e ressalta que a da Aeronáutica está prevista para a próxima segunda-feira (2). A solenidade de passagem do Comando da Marinha está prevista para ocorrer na quinta-feira (5).

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