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Deputada Bia Kicis comanda a Comissão de Fiscalização na Câmara, que convidou quatro ministros do governo Lula para prestar explicações| Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chega próximo aos primeiros 100 dias de gestão enfraquecido e com um acúmulo maior de derrotas do que vitórias no Congresso Nacional.

No Senado, mesmo com uma base fortalecida que detém todas as presidências das comissões permanentes, Lula até agora não conseguiu evitar as assinaturas de senadores para a criação da Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) que propõe investigar os atos de vandalismo em 8 de janeiro.

Na Câmara, a fragilidade do governo é maior: além de a oposição ter conseguido apoio mínimo para instalação da CPMI, deputados aprovaram, na semana passada, requerimentos para convidar vários ministros de Lula para dar explicações em comissões permanentes da Casa, sobre assuntos diversos.

Sem uma base organizada, o máximo que o governo Lula conseguiu foi evitar a convocação destes ministros, que vinha sendo articulada pela oposição e que, posteriormente, foi substituída por convites. Em uma convocação, um ministro de Estado é obrigado a atender a determinação e comparecer, sob risco de incorrer em crime de responsabilidade. É, portanto, um instrumento que possibilita constranger o governo ao enquadrar um membro do primeiro escalão ministerial. Em um convite, o comparecimento é opcional.

Flávio Dino é ministro mais requisitado a dar explicações

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB), foi o que mais recebeu convites para dar explicações aos deputados. Já nesta terça-feira (28), ele deve comparecer a uma audiência na comissão de Constituição e Justiça, para explicar sua visita ao Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.

"Ele [Flávio Dino] precisa esclarecer os acontecimentos de 8 de janeiro, a ida dele ao Complexo da Maré sem segurança e também a tentativa de intimidação de parlamentares, peticionando o Supremo Tribunal Federal [STF] para nos censurar”, disse o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), líder da oposição na Câmara e um dos seis parlamentares contra quem o ministro entrou com notícia-crime por fake news junto ao STF, alegando que eles o acusaram de envolvimento com o crime organizado.

Dino também deve falar sobre as medidas tomadas pelo governo federal em relação aos atos de vandalismo contra as sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro e esclarecer as mudanças na política de controle de armas do governo federal.

A Comissão de Segurança Pública da Câmara convocou, além de Dino, os ministros Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, Gonçalves Dias, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e Daniela Carneiro, do Turismo, que deverá prestar esclarecimentos sobre a suspeita de relação com milícias do Rio de Janeiro. Almeida deve tratar sobre sua declaração a favor da descriminalização das drogas e Dias, sobre o vandalismo de 8 de janeiro. O diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alessandro Moretti, também foi convidado para tratar dos ataques em Brasília.

Outros ministros que também já foram convidados a participar de audiências em comissões no Congresso, seja por iniciativa da oposição ou da própria base do governo: Fernando Haddad, da Fazenda; Carlos Fávaro, da Agricultura; Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário; José Múcio, da Defesa; Mauro Vieira, das Relações Exteriores; Carlos Lupi, da Previdência Social; Marina Silva, do Meio Ambiente; Camilo Santana, da Educação; Alexandre Silveira, de Minas e Energia; Juscelino Filho, das Comunicações; Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas; Ana Moser, dos Esportes; Luciana Santos, de Ciência e Tecnologia; Anielle Franco, da Igualdade Racial; Aparecida Gonçalves, das Mulheres; e Nísia Trindade, da Saúde.

No caso do convite ao chefe da equipe econômica de Lula, havia uma intenção de convocação, mas a oposição respeitou a decisão do autor do requerimento, deputado Paulo Guedes (PT-MG), que preside a Comissão de Finanças e Tributação (CFT), onde Haddad falará sobre a regulamentação de sites de apostas esportivas prevista pelo governo federal, prestar esclarecimento sobre a devida tributação e também falar sobre a política econômica.

Jordy e o deputado Sargento Fahur (PSD-PR) negam que o acordo com o governo para substituir as convocações de ministros por convites seja algum sinal de fragilidade. Segundo eles, isso foi uma estratégia encontrada para acelerar o prazo da ida de ministros à Câmara, já que a base do governo poderia obstruir as convocações.

Os opositores entendem que estão em uma posição de mais poder que a base do governo na Câmara e afirmam que, na hipótese de os ministros não comparecerem por convite, a convocação seria o passo seguinte.

“O acordo prevê que, se o convite não for cumprido, os próprios deputados do governo assinam também o requerimento de convocação. É um acordo, e a gente pretende mantê-lo”, afirma a deputada Bia Kicis, que preside a comissão de Fiscalização Financeira. Ela esclarece ter selado o acordo na presença de opositores e  governistas, entre eles o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).

Autor de quatro dos requerimentos de convite aprovados, o deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES) também protocolou nesta segunda-feira (27) pedidos de convocação dos ministros da Casa Civil, Rui Costa, da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius Marques, e de Portos e Aeroportos, Márcio França. "Nós vamos exercer o direito regimental da oposição", defende.

Oposição acusa governo de liberar emendas para frear a CPMI

Sobre as tentativas do governo de barrar a CPMI do 8 de janeiro, o líder da oposição na Câmara, Carlos Jordy, avalia que elas não estão surtindo efeito.

Ele acusa o governo de negociar a liberação de R$ 60 milhões em emendas de bancada estadual discricionária (RP2), que não são de execução obrigatória no Orçamento, para desmobilizar a CPMI. A negociação desses recursos foi a alternativa construída por acordo entre governo e o Centrão nas duas Casas do Congresso para manter metade dos R$ 19,4 bilhões que seriam destinados para o orçamento secreto em 2023 em emendas não impositivas, "sem carimbo".

"E mesmo com toda a força-tarefa do governo, não estão conseguindo desmobilizar nossa CPMI com a retirada de assinaturas", comemora Jordy.

O senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) diz que a CPMI segue "robusta" e com todas as assinaturas necessárias para a instalação. "Com a CPMI temos uma força política diferenciada, pois são duas casas trabalhando, simultaneamente, com volume bem maior de votos", celebra.

A previsão é de que o presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), faça a leitura do pedido de abertura da CPMI após a Páscoa. Caso se mantenha o número mínimo suficiente de assinaturas no pedido, ele instalará a comissão na próxima sessão do Congresso, conforme manda o regimento. Até lá, a oposição mantém a confiança de que o governo segue sem forças para desmobilizar a instalação do colegiado.

"Apesar de oferecer dinheiro de emenda e cargos para a retirada de assinaturas da CPMI, ele não consegue. Para cada assinatura que sai entram mais três. O governo não tem base, até hoje não fez e, se Deus quiser, não vai fazer, porque está derretendo", diz a deputada federal Bia Kicis (PL-DF), presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) da Câmara.

Oposição tem reuniões semanais para debater até palavras de ordem

A oposição tem cumprido as metas traçadas para a legislatura de reuniões para a definição de pautas e até palavras de ordem. Eles têm feito reuniões semanais para contrapor os discursos do governo Lula e coordenar as críticas ao Palácio do Planalto. “Nós nos sentamos para debater e fazer uma coordenação sistemática de subir na tribuna e falar a respeito disso, assim como o PT fazia, massificando o assunto para pautar o debate”, comenta o deputado Carlos Jordy.

A estratégia coordenada pelo líder da oposição na Câmara é reforçada pela deputada Bia Kicis. “A gente entendeu que é preciso ter um discurso que é repetido e martelado na comissão, no plenário, nos breves comunicados, em todo o canto”, comenta.

A parlamentar destaca que a oposição está mais unida, coordenada e menos presa às vaidades políticas. Como exemplo, ela cita a decisão de opositores em terem abdicado de dois requerimentos de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as invasões do Movimento sem Terra (MST) para apoiar o primeiro requerimento apresentado sobre o tema, do deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS).

Vice-líder do PL na Câmara, Bia sustenta que há uma estratégia mesmo nas diversas representações contra Lula e ministros, sejam pedidos de impeachment ou notícias-crime protocolados contra o presidente.

As reuniões semanais também ocorrem no Senado, afirma o senador Magno Malta (PL-ES), vice-líder da oposição. O parlamentar faz boa avaliação do desempenho até o momento. “Em nenhum momento a oposição fez coro ou bateu palma para esse desmando que está acontecendo em apenas três meses de governo, uma coisa inacreditável, e a gente vai se manifestando”, destaca. “Até porque os posicionamentos em plenário à parte que tem sido feito mostra uma oposição sólida”, complementa.

Opositores avançam em coordenação conjunta no Congresso Nacional

A oposição quer mostrar força nas duas Casas e no Congresso. O senador Luis Carlos Heinze disse que está ganhando corpo um projeto de resolução que institui a liderança da oposição no Congresso Nacional. Atualmente, existe apenas a liderança da minoria.

"A lógica é unir senadores e deputados para promover uma oposição responsável. Queremos um grupo forte o suficiente para exigir explicações e barrar medidas que geram prejuízos aos brasileiros", destaca o senador, que tem auxiliado a articulação pela instalação da CPMI do 8 de janeiro.

A deputada Bia Kicis endossa a importância do trabalho conjunto entre a oposição no Congresso e afirma estar em contato com o senador Eduardo Girão (Novo-CE) para avançar com uma CPMI para investigar o crime organizado no país. Na última legislatura, ele havia apresentado uma CPI sobre o tema no Senado.

A oposição no Senado enfrenta mais dificuldades, porque não conseguiu espaço nas presidências das comissões permanentes da Casa. A exclusão foi vista como uma retaliação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), depois que a oposição lançou o senador Rogerio Marinho (PL-RN) para concorrer contra ele na eleição de fevereiro deste ano.

Heinze admite que o resultado das presidências das comissões não foi o "esperado" e atribui isso ao uso da máquina pública. "Lula tem feito muitas promessas com recursos públicos", diz.

Ainda assim, o senador entende que a oposição no Senado ainda tem força, sobretudo em meio a falas polêmicas de Lula relacionadas ao senador Sérgio Moro (União Brasil-PR). "É importante observar que os parlamentares da oposição continuam tendo voz e voto em todas as comissões", acrescenta.

O senador Magno Malta também reconhece que a falta de presidências de comissão no Senado dificulta as pautas. O presidente de um colegiado é o "dono da pauta". "E isso dificulta muito para que possamos participar de reuniões de presidentes de comissão para discutir pauta, o que se faz em uma reunião de líderes", afirma.

O senador critica a decisão do grupo vencedor da eleição do Senado em romper com o critério de proporcionalidade — o que deveria assegurar ao PL ao menos uma presidência de comissão —, mas afirma que os opositores têm feito seu melhor.

"Cabe a nós entender qual é o nosso papel e tocar o barco fazendo nossa oposição independentemente de ter ou não [uma presidência] e ir forçando a barra para que as nossas pautas possam ser pautadas", sustenta.

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