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O presidente nacional do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto.
O presidente nacional do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto.| Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, passou a se "bolsonarizar" para manter a legenda unida e a militância engajada diante da reclusão e do silêncio do presidente Jair Bolsonaro – que atualmente é o principal nome do partido. O objetivo de Valdemar é que o PL não perca influência sobre a população até as eleições de 2024 e 2026.

O ingresso de Bolsonaro no PL foi uma aposta de Valdemar para que o partido cresça e se torne a maior legenda de direita no Brasil. Mas o silêncio do presidente da República após a derrota nas urnas tem surpreendido lideranças de Brasília, que veem risco de ele (e o PL, por consequência) perder capital político por não se posicionar sobre assuntos em discussão no país.

Valdemar, que costumava ser um articulador político de bastidor, por esse motivo passou a se colocar sob os holofotes para defender causas que anteriormente eram lideradas por Bolsonaro. Recentemente, ele divulgou um vídeo em que agradeceu aos manifestantes que saíram as ruas para apoiar o presidente Bolsonaro e questionar a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No mesmo vídeo, criticou a operação da Polícia Federal (PF), autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, contra suspeitos de organizar bloqueios nas estradas e de organizar acampamentos na frente de quartéis em todo o país.

Outro exemplo desse novo comportamento se deu no questionamento judicial sobre o resultado da eleição e os desdobramentos disso. Valdemar foi quem conduziu a ação que o PL ingressou no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pedindo a invalidação dos votos de 279 mil urnas utilizadas no segundo turno – o que mudaria o resultado da eleição e daria vitória a Bolsonaro. Foi Valdemar, por exemplo, quem concedeu entrevistas para explicar a ação à imprensa.

Também foi o presidente do PL quem reagiu publicamente contra a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do TSE e do Supremo Tribunal Federal (STF), de manter a multa de R$ 22,9 milhões ao partido em função da ação, considerada por Moraes como litigância de má-fé. Valdemar recentemente também defendeu o direito dos manifestantes que protestam contra o resultado eleitoral nos quartéis.

Um dos motivos da "bolsonarização" de Valdemar é a tentativa de manter o engajamento da base eleitoral "raiz" de Bolsonaro. A avaliação é de que o silêncio do presidente pode desmobilizá-la – o que seria ruim para o PL, que abrigou a maior parte da base política do atual presidente.

Mas um deputado do PL da ala mais pragmática, que pediu para não ser identificado, avalia que será difícil para Valdemar conseguir influenciar a militância. "Essa militância é muito idólatra, só acredita no Bolsonaro; não acredita mais em ninguém. Para eles, Valdemar é alguém que pode trair. Não há confiança nele para fazer esse processo de reconstrução da direita. A hora que o Jair sair do jogo, esse eleitorado vai abandonar o PL e vai ficar órfão sem ter outra pessoa para ocupar o lugar do Jair. E é nisso que o Valdemar tem trabalhado e busca evitar", diz o deputado.

Além disso, a "bolsonarização" de Valdemar têm por intuito evitar uma debandada de parlamentares do PL que compõem a base mais ideológica de Bolsonaro (que eram do antigo PSL) na próxima janela partidária. A legenda está rachada sobre os rumos políticos para a próxima legislatura do Congresso Nacional; e o silêncio do presidente da República amplia as incertezas da legenda.

O PL terá dois governadores, 99 deputados federais e 15 senadores em 2023. E Valdemar não pretende que o partido reduza de tamanho. Pelo contrário. O plano dele é que o partido cresça nas eleições municipais de 2024 e também nas eleições estaduais e nacionais de 2026.

"E [há] mais quatro senadores estudando para entrar [no PL]. Não tem como parar esse segmento [da direita] mais", afirmou Valdemar em vídeo gravado e divulgado nas redes sociais de seu partido em 15 de dezembro.

Como os gestos de Valdemar são avaliados internamente no PL

A grande maioria dos parlamentares eleitos e reeleitos do PL no Congresso acredita que os movimentos adotados por Valdemar são "corretos" e "coerentes". E a ala mais fiel a Bolsonaro reconhece os gestos dele. Após o resultado do segundo turno e o início das manifestações contra a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), havia uma incerteza na base mais ideológica do PL sobre como Valdemar iria se comportar.

Ainda antes das eleições, Valdemar firmou um acordo com Bolsonaro de que o partido questionaria no TSE possíveis irregularidades encontradas pelo Instituto Voto Legal (IVL), a empresa contratada pelo PL para auditar o processo eleitoral. Alguns parlamentares de diferentes alas do partido duvidavam se o dirigente partidário manteria o compromisso – o que acabou ocorrendo.

O comportamento de Valdemar Costa Neto surpreendeu positivamente os grupos mais conservadores do PL. "Uma das pontas que a gente julgava que seria mais frágil após as eleições, entre as Forças Armadas, o meio político, o presidente e o povo, seria o Valdemar. Havia essa preocupação. Mas ele respondeu positivamente", diz um parlamentar aliado do entorno político de Bolsonaro.

Segundo ele, Valdemar está "extremamente alinhado com a pauta da direita e com as manifestações também". "Ele nem precisava se expor da forma como se colocou naquele vídeo", complementa a fonte sobre o vídeo em que o presidente do PL agradece o apoio dos manifestantes. "Continuem na luta. O Bolsonaro não vai decepcionar ninguém", disse.

A ala menos ideológica do PL é mais pragmática ao analisar os gestos de Valdemar. Alguns de seus integrantes ponderam que os recentes posicionamentos são formas encontradas pelo dirigente para manter o apoio da base "raiz" do partido. "Valdemar está sofrendo pressão do próprio presidente Bolsonaro e dos parlamentares que ele elegeu e tem a agenda bolsonarista", afirma um parlamentar.

Quais os desafios para Valdemar construir a nova identidade do PL

A busca por um crescimento do PL com a adoção de uma identidade conservadora impõe desafios a Valdemar Costa Neto. Para parlamentares, o maior deles é como definir uma identidade no "pós-Bolsonaro".

"O PL não vai sair do campo da centro-direita, mas não vai ficar na bandeira bolsonarista. E como construir uma identidade que se descole do legado bolsonarista? É um desafio que acho muito difícil porque o desapontamento e a frustração das pessoas quando souberem que não vai ter intervenção militar será grande", diz um parlamentar da ala pragmática da sigla.

Outro deputado concorda em relação aos desafios, mas diz que é cedo para fazer prognósticos. "Ainda não dá para dizer ao certo se dá para [o PL] herdar esse capital político do Bolsonaro ou se as pessoas vão simplesmente desistir de participar da política brasileira", diz.

A reação dos eleitores será um termômetro relevante, e lideranças políticas preveem um 2023 "turbulento" em manter os conservadores engajados e unidos na oposição a Lula. "A direita que se definiu conservadora e se identificou nesse campo ao longo dos últimos quatro anos vai ter que aprender pela primeira vez como ser oposição", diz um deputado.

O silêncio de Bolsonaro após o segundo turno só amplia as incertezas. Mesmo tendo recebido um convite para assumir a presidência honorária do PL, nem os aliados mais próximos têm certeza que ele decidiu assumir o cargo e o papel de protagonizar a liderança da oposição a Lula. Os deputados que têm tido contato com Bolsonaro afirmam que ele tem dito que não irá "determinada nada" nem dar "diretriz nenhuma", e que cada um "faz o que bem entender".

PL muda estatuto para construir a nova identidade

A fim de assegurar a nova identidade do PL, Valdemar atuou até mesmo para aprovar alterações no estatuto e no programa partidário do partido. Isso ocorreu no último dia 19, em reunião da Executiva Nacional.

O general Braga Netto, que foi vice de Bolsonaro na campanha eleitoral, participou das reuniões e atuou na revisão do programa partidário. Filiado ao PL, ele está engajado na reestruturação da legenda para torná-la a principal liderança conservadora do Brasil.

Agora, o programa partidário passa a elencar como temas prioritários do PL o equilíbrio entre os Poderes (assunto importante para a base popular de Bolsonaro); a federação e a municipalidade; o desenvolvimento econômico e social; a mínima intervenção do Estado na economia (outro assunto relevante para a direita); a dignidade aos menos favorecidos; e o direito à propriedade (mais um tema de interesse dos conservadores).

Também foram apontadas prioridades como segurança (jurídica, pública, hídrica, no campo, alimentar, energética); empreendedorismo; desestatização e concessões da infraestrutura nacional; digitalização e conectividade; trabalho e geração de emprego e renda; família, incluindo a prioridade às mulheres e aos jovens; solidariedade social e o voluntariado.

As reformas do estatuto e do programa partidário são passos no caminho traçado por Valdemar de transformar o PL no maior partido da direita do Brasil. Uma das medidas previstas é investir na formação de lideranças políticas conservadoras por meio de seminários e palestras. A ideia é disseminar nos filiados à legenda os valores conservadores em diferentes pautas, desde família e costumes até a agenda de meio ambiente e desenvolvimento sustentável.

"Ter um partido forte, se sentir parte de uma organização forte, de direita, acho que é o primeiro passo antes de pensar em fazer oposição. Acho que é o passo fundamental para qualquer discussão sempre ser relevante", comenta um aliado de Valdemar.

Um deputado pondera que as medidas adotadas pelo presidente do PL são positivas à medida em que possibilita ao partido se descolar pouco a pouco do "legado bolsonarista". "O Valdemar fez os gestos que podia ao Bolsonaro. O convidou para ser o presidente honorário, disse que quer ele viajando o país. Mas também adotou todos os movimentos para construir um partido de direita com um descolamento gradual que posicione o PL como um partido conservador, independente do bolsonarismo."

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