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Ex-ministro de Lula e líder petista histórico

Dirceu antecipa a tônica internacional da campanha pela reeleição de Lula em 2026

José Dirceu
Ex-ministro da Casa Civil de Lula, José Dirceu teve seus processos na Lava Jato anulados em decisão monocrática de Gilmar Mendes. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.)

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Figura mais influente nos bastidores da esquerda brasileira e líder petista histórico, o ex-ministro da Casa Civil e ex-deputado federal José Dirceu (PT) delineou a tônica internacional que espera ver na campanha de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2026.

Durante seu discurso de 12 minutos na noite desta terça-feira (11), na celebração de seus 79 anos, em um restaurante de Brasília, Dirceu destacou os principais desafios do PT e de seus aliados para continuar no poder, enfatizando a necessidade de enfrentar a articulação da direita em nível global.

Nesse cenário, Dirceu fixou como alvo central da esquerda brasileira a aliança entre o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o governo do republicano Donald Trump, dos Estados Unidos. “Não existe mais eleição nacional”, alertou, apontando para uma disputa política cada vez mais globalizada.

Atuando como ideólogo de uma frente progressista, Dirceu também incluiu nesse bloco conservador as Big Techs, que, segundo ele, exercem influência estrangeira sobre o jogo político interno. As Big Techs são as empresas multinacionais de tecnologia que controlam as principais redes sociais do planeta. Nesse contexto, mencionou o papel de liderança do bilionário Elon Musk, dono da plataforma X

Dirceu acusa Musk de colaborar com a "tomada" de governos pela direita

O ex-ministro acusa Musk, que também é um dos mais importantes assessores de Trump, de interferência nas eleições dos Estados Unidos e da Alemanha, além de apoiar a ascensão de partidos conservadores ao redor do mundo. “Ele vai ao Reino Unido e simplesmente ameaça derrubar o primeiro-ministro”, disse.

Musk acusou o premiê trabalhista Keir Starmer de ter sido complacente em investigações de abusos sexuais ocorridos no Reino Unido entre as décadas de 1980 e 2010. Suas declarações trouxeram a polêmica ao debate midiático sem novas evidências sobre os crimes. Musk passou a defender a renúncia de Starmer e teria debatido com aliados próximos formas de removê-lo do poder, segundo o jornal Financial Times.

Na Alemanha, Musk apoiou e realizou uma entrevista com a candidata Alice Weidel, do partido de direita AfD em sua rede social X. Ele também criticou os demais partidos, incluindo o partido majoritário de centro-direita, de se recusar a formar coalizão com o AfD. Nos Estados Unidos, Musk vinha apoiando Trump politicamente muito antes de sua eleição.

Segundo Dirceu, “a ascensão do fascismo e da extrema direita” em diferentes países não é fenômeno isolado, mas movimento articulado globalmente. “Nossa soberania está ameaçada graças a brasileiros que formaram aliança com os Estados Unidos, pregando interferência estrangeira em nossos assuntos internos”, discursou.

Nesse sentido, o ex-ministro acusou Bolsonaro de trazer os Estados Unidos para a disputa eleitoral de 2026 e alertou que a direita brasileira se organizou de várias formas, como os protestos em frente a quartéis e os atos do 8 de Janeiro. “Não podemos mais permitir isso”, disse.

Em processo de reabilitação política desde o desmonte da Lava-Jato e a posse de Lula para o atual mandato, o ex-ministro pretende disputar uma cadeira de deputado federal em 2026, retomando o cargo que perdeu há 20 anos, após os escândalos do mensalão e do petrolão.

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Na sua fala prestigiada por 13 ministros e dezenas de parlamentares, Dirceu conclamou a esquerda a se unir na defesa do governo Lula e no combate à direita, alegando que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), vem sendo apresentado como alternativa a Bolsonaro, mas deve ser visto como parte do mesmo projeto.

Além da disputa eleitoral, Dirceu enfatizou a importância de garantir, em um segundo momento, a eleição de uma maioria parlamentar para viabilizar reformas no sistema político-eleitoral. Ele propôs que o PT amplie alianças, indo além da federação com PV e PCdoB, para incorporar partidos como PSOL, Rede, PDT e PSB. “Precisamos estar todos juntos”, defendeu.

Em seu discurso, José Dirceu rebateu a tese de que a maioria do eleitorado brasileiro tenha hoje perfil predominantemente conservador. Como contraponto, descreveu a trajetória dos movimentos de esquerda como prova de que a sociedade tende a caminhar em direção a avanços sociais quando não há interferências externas ou rupturas institucionais.

Dirceu insistiu que a interrupção dos governos petistas, iniciados em 2003, ocorreu apenas devido a eventos que considera ilegítimos, como a Operação Lava Jato, o impeachment de Dilma Rousseff (“o golpe de 2016”) e a prisão de Lula, que classificou como “processo sumário e político”.

Dirceu vê Lula 3 “sitiado” pela conjuntura internacional e pelo Congresso

Defendendo a combinação de democracia, Estado de bem-estar social e soberania nacional como pilares do governo Lula e da campanha de 2026, Dirceu alertou para a necessidade de impedir que o Brasil siga os modelos políticos de Donald Trump e do presidente argentino Javier Milei.

Chamando o terceiro mandato de Lula de “um governo sitiado” por pressões internacionais, minoria no Congresso e oposição interna fortalecida, Dirceu apontou a soberania como tema central do embate político nos próximos anos. Ele ressaltou que, para vencer as eleições de 2026, o governo precisa mostrar força agora, mesmo enfrentando base parlamentar minoritária.

Por fim, Dirceu afirmou que a disputa política vai além das urnas e passa por uma guerra cultural. Segundo ele, a concentração de renda e o poder do capital financeiro seriam os principais inimigos internos da frente progressista. “Precisamos agir desde já, defendendo a agenda do aumento da renda e a geração de empregos”, afirmou.

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Para especialista, Dirceu demonstra realismo e excessos no seu discurso

Para o cientista político Ismael Almeida, Dirceu acerta ao destacar que a política nacional está cada vez mais conectada ao cenário externo. “A influência de figuras como Trump e Musk, assim como o papel das Big Techs, afeta eleições e debates, moldando estratégias e discursos. Esse panorama reforça a necessidade de a esquerda articular alianças e definir estratégias”.

Ao mencionar Tarcísio de Freitas como opção dentro do mesmo espectro político de Bolsonaro, Dirceu vê a direita brasileira se reorganizando com novas lideranças, o que exige atenção da esquerda. “O chamado dele à união da esquerda em torno de Lula destaca a importância da coesão interna para enfrentar a crescente polarização”, avalia Almeida.

No entanto, o cientista político pondera que, embora a influência global sobre a política brasileira seja inegável, afirmar que “não existe mais eleição nacional” pode ser exagero. “Fatores internos, como questões econômicas, sociais e culturais, ainda desempenham papel fundamental nas escolhas eleitorais. Além disso, atribuir caráter conspiratório às Big Techs e a Musk pode simplificar excessivamente um fenômeno complexo e multifacetado”.

Outro equívoco no discurso de Dirceu, segundo Almeida, é a tentativa de enquadrar toda a direita brasileira dentro de uma mesma matriz ideológica ligada a Bolsonaro e Trump. “Essa abordagem desconsidera nuances importantes e pode dificultar o diálogo com eleitores moderados ou indecisos, que não se identificam integralmente com esses grupos”.

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