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Oposição já protocolou diversos pedidos de cassação do mandato de Janones
Oposição já protocolou diversos pedidos de cassação do mandato de Janones| Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

O deputado André Janones (Avante-MG) tem sido alvo de uma série de denúncias vindas de dois ex-assessores, incluindo um pedido de parte do salário da equipe de seu gabinete para cobrir gastos de campanha – a prática é popularmente conhecida como rachadinha. O deputado também é acusado de assédio moral contra funcionários de seu gabinete.

As acusações vieram à tona após reportagem do jornal Metrópoles, que divulgou áudios nos quais Janones solicita os recursos financeiros aos assessores para auxiliar a pagar gastos de campanha. O deputado nega as acusações, embora admita que o áudio é verdadeiro. Ele afirma que as provas foram conseguidas de forma clandestina e criminosa, que o áudio está fora de contexto e que as acusações são fake news espalhadas pela "extrema direita", já que ele somente teria feito a solicitação voluntária de doações de seus funcionários.

Veja abaixo o que já se sabe sobre o caso:

1) Como os áudios e outras acusações foram divulgadas

No dia 27 de novembro, o jornal Metrópoles publicou uma reportagem que reproduz um áudio no qual, em uma conversa com seus assessores, Janones solicita a eles que lhe repassem uma parte de seus salários como forma de criar um caixa para bancar campanhas eleitorais.

"Algumas pessoas aqui, que eu ainda vou conversar em particular depois, vão receber um pouco de salário a mais. E elas vão me ajudar a pagar as contas do que ficou da minha campanha de prefeito", afirma Janones na gravação.

O parlamentar se referia à campanha para a prefeitura de Ituiutaba, município de Minas Gerais, em 2016. Ele perdeu a disputa municipal, mas se elegeu deputado federal do Estado em 2018, pelo Avante, com cerca de 178 mil votos. Quando de sua reeleição, em 2022, o deputado contou com quase 239 mil votos.

Na terça-feira (28), outro trecho do áudio foi revelado, no qual Janones fala sobre doações para campanhas, afirmando que a estimativa de arrecadação chegava a R$200 mil. Ambos os áudios teriam sido gravados em 2019, no exercício de seu primeiro mandato, sem o conhecimento do parlamentar, durante encontro na sala de reuniões do Avante, na Câmara dos Deputados.

“Como nós não vamos ser corruptos, não vamos aceitar cargos, como a gente não vai ceder a essas coisas e a gente precisa de dinheiro pra fazer campanha, qual é a minha sugestão? E aí nós vamos dividir o valor entre nós, inclusive eu. Isso é, todos. E isso é legal. Às vezes, você confunde isso com devolver salário. Devolver salário é você ficar lá na sua casa dormindo, me dá seu cartão, todo mês eu vou lá e saco e deixo só um salário pra você. Isso é devolver salário. Dois mil e vinte (ano eleitoral) tá aí. Eu pensei de a gente fazer uma vaquinha entre nós, e aí nós vamos decidir se vai ser R$ 50, se vai ser R$ 100, R$ 200, se cada um dá proporcional ao salário. Isso a gente vai decidir entre nós.  Se cada um der R$ 200 na minha conta, vai ter mais ou menos R$ 200 mil para a gente gastar nessa campanha”, diz Janones no áudio divulgado na terça.

O deputado também é acusado de assédio moral. Em outubro deste ano, o jornal Diário do Poder publicou reportagem na qual reproduz mensagens de Whatsapp que demonstram desrespeito de Janones com assessores e funcionários do gabinete. Além de xingamentos, o deputado teria falado para a equipe “sumir de sua frente”, aconselhando-os a “nunca mais olhar na sua cara ou chegarem perto dele”, pois não responderia por si caso isso ocorresse.

2) As alegações dos ex-assessores

Os assessores Cefas Luiz Paulino e Fabrício Ferreira de Oliveira alegam que Janones não só sugeriu, mas também colocou a “rachadinha” em prática. Eles trabalharam no gabinete de Janones de fevereiro de 2019 a novembro de 2021 e setembro de 2022, respectivamente.

De acordo com  Oliveira, o deputado solicitava que o pagamento fosse realizado em dinheiro vivo. Os assessores eram orientados a fazer saques com valores específicos, que eram colocados em um envelope e repassados ao político em Brasília.

Em entrevista à CNN Brasil, Cefas disse que a prática era comum no gabinete do parlamentar. Ele afirmou que Leandra Guedes, assessora de Janones à época, “era responsável por pegar o dinheiro de rachadinha dos funcionários” e que “nada era pago em banco. Era em dinheiro vivo”.

Atualmente, Leandra é a titular da prefeitura de Ituiutaba, cargo ao qual Janones concorreu em 2016 e cujas dívidas de campanha seriam sanadas com as contribuições de seus assessores.

Os ex-assessores também disseram, em entrevista ao jornal O Globo, que o valor da contribuição chegava a 60% dos vencimentos e que envolvia até mesmo o 13º salário. “O primeiro pedido ocorreu em 5 de fevereiro de 2019, assim que ele se elegeu pela primeira vez. Depois disso, todos passaram a repassar um percentual de seus salários em dinheiro vivo, ninguém fazia transferência bancária para a Leandra. Quem ganhava menos também doava, era uma contribuição proporcional, inclusive em cima do 13º salário de cada um”, afirmou Paulino.

Os ex-assessores protocolaram a denúncia no Ministério Público de Minas Gerais, no início de 2022. O caso foi levado à Procuradoria-Geral da República e, desde maio, tramita no Supremo Tribunal Federal, onde sua apuração segue sob sigilo.

3) Como Janones se defendeu

Diante da repercussão negativa gerada pelos áudios, Janones foi às redes sociais apresentar a sua versão do caso. Ele afirmou que as acusações são “fake news”, culpou a “extrema-direita” pela disseminação da reportagem do Metrópoles, jornal que tem viés esquerdista, e afirmou que os áudios foram tirados de contexto.

“É a segunda vez que trazem esse assunto para tentar me ligar a crimes. Em 2022 já fizeram isso durante a campanha, também com áudios fora de contexto. Essas denuncias vazias nunca se tornaram uma ação penal ou qualquer processo, por não haver materialidade. Não são verdade, e sim escândalos fabricados. No mais, repito eu nunca recebi um único real de assessor, não comprei mansões, nem enriqueci e isso por uma simples razão, eu nunca fiz rachadinha”, escreveu Janones em postagem do seu perfil do X [antigo Twitter].

O deputado ainda afirmou que não tem o que esconder e que “toparia” abrir mão do seu sigilo bancário caso houvesse processo. Ainda no dia 27 de novembro, Janones concedeu entrevista ao ICL Notícias e confirmou a veracidade dos áudios, mas reafirmou que o conteúdo está “fora de contexto”.

Durante a entrevista, o parlamentar, que também é advogado, afirmou que não vê crime no que falou e garantiu que não se lembrava da conversa com os assessores, além de repetir diversas vezes que nunca pegou dinheiro de funcionários.

Após o vazamento do segundo áudio, o parlamentar voltou a se explicar em postagem no X: “[...]esse áudio corrobora a minha história e prova que nunca existiu esquema de rachadinha. Era uma conversa com amigos (meu grupo político) e eu sugiro inclusive uma vaquinha/caixinha para bancar a campanha deles em 2020”.

Janones ainda alega que o áudio deixa claro que se tratava de uma sugestão, inclusive legal, em que “todos tinham opinião e a possibilidade de decidir valor e se contribuiria ou não”. Segundo ele, o desejo da oposição de manchar sua imagem levou-os a publicar um áudio que o inocenta e afirma que “nunca vou ceder à corrupção, ninguém nunca vai me comprar”.

4) As inconsistências de Janones

Em suas declarações, Janones apresentou inconsistências em relação ao período em que a reunião foi realizada e aos valores de sua campanha. O deputado já chegou a afirmar que a conversa teria sido realizada antes do início de seu mandato como deputado federal. No entanto, durante o áudio, ele faz referência a uma sessão no plenário da Câmara ocorrida no dia anterior à gravação, conforme reportado pelo jornal Folha de S.Paulo.

"Cês viram aí nas notícias no Facebook, já tem uma porrada de deputado que já apresentou o projeto de lei ontem. Ontem tinha uma fila de cem deputados apresentando projeto de lei. Eu sequer sabia disso. Por que eu não sabia? Porque eu não contratei nenhum especialista em técnica legislativa", afirma na gravação. Ele também cita uma sessão no plenário que ocorreria no mesmo dia. Posteriormente, o deputado afirmou que não se lembrava da data em que a conversa ocorreu.

Janones também apresentou discrepâncias em relação ao valor que afirma ter gasto na disputa pela prefeitura de Ituiutaba em 2016. No áudio, suas falas remetem a uma perda total no valor de R$ 675 mil. No entanto, a prestação oficial de contas da campanha é de R$172 mil.

Mesmo tendo afirmado que a dívida da campanha não era somente dele, mas também de integrantes de sua equipe que teriam se comprometido a sanar o débito, apenas a ex-assessora Leandra Guedes aparece na lista de doadores de campanha, com uma doação de R$ 3.400.

5) A reação da direita

O ex-deputado federal, Deltan Dallagnol, foi um dos primeiros a comentar as acusações. Ainda no dia 27, ele publicou em seu perfil no X (Twitter): “já era, Janones, as notícias-crimes estão no forno e você não vai se safar dessa com mais das suas fake news e janonismo cultural".

Ainda na segunda-feira, data das primeiras denúncias, o líder da oposição na Câmara, o deputado Carlos Jordy (PL-RJ) afirmou que estava “estudando as medidas que podem ser feitas". Ele afirmou acreditar ser possível fazer um pedido de cassação no Conselho de Ética da Câmara e uma representação na PGR (Procuradoria-Geral da República). "É batom na cueca”, disse Jordy.

O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), também em seu perfil no X, publicou o áudio com as denúncias acompanhado pelo texto “a casa caiu”. Em postagens subsequentes, Ferreira ironizou a situação e a suposta cassação de Janones: “Janonismo cultural: ser cassado por rachadinha e perder o apoio até da esquerda. Gênio”. Nikolas ainda criticou a explicação de Janones ao dizer que era “um textão pra se justificar. Mas te contar uma coisa… tem um áudio seu comprovando a corrupção. Já era. Acabou”.

O deputado também afirmou que havia conversado com o líder do Partido Liberal (PL) na Câmara, o deputado fluminense Altineu Côrtes, para que fosse feita representação contra Janones no Conselho de Ética da Câmara, “pela prática de rachadinha em seu gabinete, ou seja, corrupção. Suas explicações agora são com a PGR e com a Justiça, se ainda houver alguma neste país”.

Em resposta à Nikolas, o Côrtes confirmou que o PL faria a representação no Conselho de Ética contra André Janones. “Se ele tiver vergonha na cara deve renunciar ao mandato imediatamente!”

Já o deputado federal Paulo Bilynskyj (PL-SP) postou o áudio de Janones, acompanhado pelos dizeres “Cassação Já! Eu Autorizo!”. Em outra postagem de seu perfil do X, o deputado paulista afirmou que “Danones [apelido dado a Janones] será denunciado ao Conselho de Ética e à PGR, sem novidade”.

As acusações também foram comentadas pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) em seu perfil no X. Eduardo replica um trecho do áudio no qual Janones afirma que “não vai se arrepender um milímetro se for cassado”.

No dia 29 de novembro, ele também postou trecho do requerimento endereçado para a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) da Câmara e afirmou que, em breve, o PL representaria pedido de cassação do parlamentar no Conselho de Ética.

Na mesma data, Eduardo ainda postou que “o ex-membro PT, o quase SECOM [Secretaria de Comunicação] de Lula, o fenômenos das redes sociais segundo o MBL, o confesso divulgador de fake news, sim, o Janones tem muito a explicar. #rachadones”.

6) A não-reação da esquerda

A diretora nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) foi uma das únicas lideranças da esquerda a se pronunciar em favor de Janones. Em resposta à primeira explicação do deputado, no dia 27, a president do partido, Gleisi Hoffmann, se solidarizou com o “companheiro” e endossou sua justificativa pelas acusações, afirmando que seriam perseguição da extrema direita ao parlamentar por meio de fake news e distorção dos fatos.

No dia seguinte, Gleisi repetiu sua tese ao publicar que “a extrema-direita não perdoa o André Janones por sua atuação política. Janones tem todo direito de se defender das acusações lançadas contra ele. Quem tem histórico de rachadinhas, fake news e desvio de dinheiro público são os que hoje atacam o deputado. Estamos solidários com ele na evidência da verdade”.

O deputado federal André Correia, vice-líder do governo na Câmara, reiterou as palavras de Gleisi e disse que fica claro o interesse de bolsonaristas em “desgastar quem os denuncia e não buscar a verdade”.

Já o influenciador Felipe Neto foi menos solidário com o parlamentar. Ele disse que, “se for confirmado seu envolvimento com rachadinha, que seja cassado e preso. Tolerância com rachadinha tem que ser zero”. Em postagem subsequente, Neto ainda afirmou que o áudio foi claro o suficiente para que ele não queira mais ter qualquer relação com o parlamentar, mas que para haja cassação e prisão é preciso provar que, de fato, houve a “rachadinha”.

Reportagem da Folha de S.Paulo desta sexta-feira (1º) relata que o clima na Câmara é de constrangimento em relação à Janones, que não tem um grupo político que possa fazer sua defesa, já que seu partido, o Avante, possui apenas sete parlamentares em exercício.

Outro ponto levantado é que Janones é visto com antipatia na Câmara, por frequentemente disparar críticas contra os colegas. Além disso, deputados governistas afirmaram ao jornal que o áudio contendo as falas do deputado o colocam em uma saia justa e que, por essa razão, há a necessidade de investigação antes de se chegar a quaisquer conclusões.

O deputado Tarcísio Motta (PSOL-RJ) afirmou que "não é porque Janones é da mesma base do governo" que vai defendê-lo e que o parlamentar precisa responder por seus atos caso as acusações sejam comprovadas. "Na minha opinião, todas as denúncias de mau uso de verbas parlamentares, a chamada 'rachadinha', são sempre graves e precisam ser investigadas a fundo, seja onde for", diz o deputado.

Janones integrou a linha de frente da campanha de Lula (PT) nas redes sociais em 2022. Ele chegou a se lançar à Presidência, mas voltou atrás ao decidir pelo apoio à Lula, meses antes do primeiro turno.

O deputado atuou de forma contundente contra Bolsonaro e seus aliados durante a campanha. Ele chegou a afirmar que era necessário responder ao adversário "com as mesmas armas" usadas por ele. No fim de novembro, Janones lançou um livro sobre suas estratégias de comunicação nas redes, que afirmou ter crescido em vendas após as denúncias da rachadinha.

7) O que de fato já foi feito

Até o momento, deputados e aliados da oposição realizaram uma série de ações para averiguar a responsabilidade de Janones. Na própria segunda-feira em que as alegações de “rachadinha” foram veiculadas, Deltan Dallagnol apresentou à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma notícia-crime contra o deputado.

Na terça-feira (28), Bilynskyj protocolou outra notícia-crime junto à PGR. Assinada por mais de 40 deputados, a denúncia pede a cassação do mandato de Janones com base na Lei nº 8.429/92, que dispõe sobre as punições para o crime de improbidade administrativa.

Na noite do mesmo dia, o Partido Liberal (PL) encaminhou à Mesa Diretora da Câmara um pedido de cassação do mandato de Janones. O pedido ainda será enviado à Presidência da Casa e, em seguida, ao Conselho de Ética, que poderá acolher a representação e transformá-la em processo.

Na quarta-feira (29), a CFFC aprovou o requerimento de Eduardo Bolsonaro para que o colegiado ouça o ex-assessores de Janones sobre as denúncias de “rachadinha” no gabinete do parlamentar. Além de Cefas, Leandra Guedes também deve ser ouvida.

Conforme reportado pela Folha de S.Paulo, é improvável que o Conselho de Ética avalie o pedido contra Janones ainda este ano, em razão da proximidade do recesso parlamentar. No entanto, deputados da direita e da esquerda avaliam que há possibilidades de que o Conselho acate o pedido. Nessa situação, o processo de Janones iria para votação em plenário, podendo de fato resultar na perda do seu mandato.

Segundo o Metrópoles, além do MPF, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a Polícia Federal (PF) também estariam investigando o deputado. À Gazeta do Povo, a PF disse que "não confirma ou se manifesta sobre eventuais investigações em andamento" e a Abin não respondeu ao contato.

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