O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, assumiu a pasta em 2021 com a meta de dar continuidade às políticas liberais de preservação ambiental com a participação do setor privado. Defensor de que ações de preservação de florestas nativas sejam remuneradas, ele entregou no ano passado o Programa Nacional de Crescimento Verde, iniciativa proposta com o intuito de oferecer financiamentos e subsídios para incentivar projetos e atividades econômicas sustentáveis a fim de gerar os chamados "empregos verdes".
Em entrevista à Gazeta do Povo, ele destaca que o mercado voluntário de créditos de carbono já é uma realidade e afirma estar empenhado em concluir nos próximos 30 dias uma plataforma que criará o mercado regulado desses créditos, certificados emitidos para uma pessoa ou empresa que reduza a sua emissão de gases de efeito estufa.
O mercado regulado de créditos de carbono demandaria ainda aprovação do projeto de lei 528/2021 para ter mais segurança jurídica, mas o ministro demonstra confiança pela aprovação da proposta ainda este ano pelos congressistas. Para ele, os parlamentares não se negarão a aprovar uma proposta que é fundamental para desenvolver a "economia verde".
Após ter lançado na última semana o crédito de metano e um programa para ampliar a produção de biogás e biometano, Leite prepara três programas para este ano: um plano de hidrogênio verde, um de política automobilística sustentável e um de eólica offshore, a fonte de energia limpa e renovável que se obtém aproveitando a força do vento que sopra em alto-mar.
O ministro trabalha para apresentar as ações antes da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP) deste ano, a COP 27, que ocorrerá em Sharm el-Sheikh (Egito), em novembro. Leite defende sua política ambiental e assegura que, diferentemente dos críticos, o governo está na vanguarda mundial. "Fui eu que conseguiu chegar ao consenso pelo mercado global de carbono. Não foi outro governo, fomos nós os protagonistas na negociação", afirma.
Confira a entrevista completa abaixo:
Foi comentado ao fim do ano passado que a criação do mercado de créditos de carbono ficou para este ano. O que podemos esperar para 2022?
Joaquim Leite: Primeiro que [os créditos de carbono] não ficaram para 2022. O crédito de carbono já explodiu em 2021. Após a conferência do clima, a demanda por créditos [de carbono] na Amazônia, especialmente, disparou. Hoje, você não consegue comprar um crédito de carbono na Amazônia porque já está todo vendido. O preço saiu de US$ 2 quando eu entrei no governo, e agora está US$ 14. O custo para produção deve ser de US$ 1.
Teve reunião com secretários [estaduais] de Meio Ambiente no âmbito do grupo da força-tarefa da Amazônia há duas semanas, e a minha diretora foi e disse que nunca conseguiu tanto desenvolvedor em projetos de crédito de carbono na Amazônia como nessa reunião. É muito setor privado trazendo soluções e conseguindo achar soluções para remunerar quem cuida de florestas, remunerar pelo carbono estocado na floresta.
Que ações o ministério tomou para estimular o desenvolvimento de projetos de créditos de carbono?
Leite: Nós criamos o Floresta+ Carbono, que foi o reconhecimento do governo federal de uma atividade que contribui com a redução de emissões de carbono na atmosfera. A gente montou toda uma estrutura, nós reconhecemos via comissão chamada CONAREDD+, a comissão que dá as diretrizes da estratégia nacional do REDD+, que é o conceito de carbono de floresta nativa gerado a partir da redução de emissões de desmatamento e degradação.
Quando a gente fez esse reconhecimento dentro do ambiente desse comitê, ele começou a ser reconhecido como atividade importante na política de clima. Com a conferência do clima criando o mercado global, aí, sim, criou essa explosão do mercado voluntário. O mercado voluntário é uma realidade no mundo hoje, e o de carbono de floresta nativa é o primeiro a puxar esse mercado voluntário porque você tem mais que carbono.
O carbono pode ser do processo industrial, eu coloco uma caldeira e reduzo minhas emissões, mas um carbono que você protegeu em uma floresta tem muito mais atributo do que somente a tonelada de carbono. Tem biodiversidade, tem benefícios adicionais que você chama de co-benefícios, que seriam a comunidade, a biodiversidade e a proteção de todos os atributos que tem em uma floresta além do carbono.
O mercado de carbono, então, não aconteceu em 2022, ele expandiu muito e cresceu muito após a conferência do clima, as empresas estão investindo nesse mercado e o Brasil é um grande potencial de gerador de crédito.
Para além do estímulo ao mercado voluntário, em que mais o ministério atua para que 2022 seja o ano da "explosão" dos créditos de carbono?
Leite: O governo federal está desenhando uma estrutura de um mercado regulado nacional que será a estrutura mais inovadora e moderada do mundo. Por que vai ser a mais moderada do mundo? Porque não será um custo para os brasileiros, nem será um custo obrigatório para quem usa ainda combustíveis fósseis, mas, sim, focada em ser uma receita extra para projetos de baixa emissão, ou que capturem carbono.
Desenhamos essa estrutura desse mercado moderno, liberal, ao mesmo tempo que rigoroso, porque tem que ser um instrumento para reduzir as emissões totais da atividade econômica do Brasil, uma vez que temos um compromisso nacional determinado que abrange todas as atividades econômicas brasileiras. Ele tem que ser uma ferramenta pare reduzir as emissões totais e atingir a neutralidade em 2050.
Quem poderá participar desse mercado?
Só participa desse mercado quem tiver compromissos corporativos para a neutralidade climática até 2050. Por isso que ele é bastante inovador, está bem alinhado com a nossa NDC, a nossa Contribuição Nacional Determinada. Então, se você quiser participar desse mercado, você tem que ter compromisso de redução de emissões, e o Brasil também vai fazer uma central de registro de transações de crédito de carbono. E a CVM [Comissão de Valores Mobiliários] vai fazer uma resolução para reconhecer o ativo ambiental.
Essa central de registro de transações e toda a estrutura desenhada virá por algum decreto, uma portaria, ou precisaria de um projeto de lei ou outra medida legislativa?
Leite: Eu não preciso de nada, é só lançar a plataforma.
E quando sai essa plataforma?
Leite: Eu acho que em 30 dias. A gente lança uma plataforma e uma resolução da CVM. Quando faço isso, já nasceu o mercado [regulado]. Depois, claro, se a gente aprovar o projeto de lei [relatado pela deputada Carla Zambelli, do PL-SP], que apresentamos ao Congresso, isso traz mais estrutura jurídica para tudo isso acontecer.
E por que ele é inovador? Porque vamos colocar o mercado de carbono dentro do mercado de capitais brasileiros. O mercado de capitais brasileiro é reconhecido mundialmente como um mercado bem estruturado, então, colocar o mercado de carbono dentro desse mercado de capitais acho que é a grande inovação que vamos fazer.
Além disso, vamos colocar componentes que os outros mercados não têm. O registro nacional de emissões vai registrar carbono, vai registrar o inédito crédito de metano, que nós reconhecemos e criamos, vai registrar a pegada de carbono da produção, então, quando você produzir alguma coisa no Brasil, vai poder registrar essa pegada de carbono e vai também reconhecer o ativo ambiental, que é mais do que tudo isso. Por isso que a nossa central vai ter uma estrutura de reconhecimento bastante robusta.
E qual é a expectativa do senhor em relação ao projeto de lei? Dá para ser aprovado?
Leite: Se o Congresso achar que é importante uma lei para ajudar a montar toda essa estrutura que o governo federal está propondo, a gente entende que deveria ser [aprovado]. É pauta do Congresso, está nos projetos prioritários, provavelmente deve conseguir aprovação ainda este ano.
O senhor falou há pouco sobre o inédito crédito de metano e sobre todos os esforços para estimular o mercado de créditos de carbono. É possível falar em números do potencial dessa economia verde para o Brasil? Sua equipe já calculou?
Leite: Não, [o Ministério da] Economia que tem que gastar os estudos para fazer saber o quanto nós vamos ficar ricos. O que eu crio é soluções climáticas lucrativas. E a única forma da gente atingir a neutralidade climática tão desejada no mundo é criar soluções climáticas lucrativas. Lucrativas para o empreendedor, lucrativas para o meio ambiente, lucrativas para a natureza, lucrativas para as pessoas que vão ter emprego e renda. E lucrativa para todos os brasileiros, porque vamos crescer economicamente.
O grande diferencial de toda a política de meio ambiente que a gente fala em relação a emissões e ao mercado de carbono é que o meio ambiente não pode virar custo para a sociedade, e o Brasil pode transformar aquilo que era um passivo em um ativo. Então, em vez de a gente discutir um passivo ambiental, estamos criando ativos ambientais que o Brasil tem muito, e, assim, conseguir remunerar esse ativo.
O grande diferencial dos outros países é que a gente tem muito ativo ambiental, não tem como outros países falarem: "que ativo ambiental?". Se você for ver a Alemanha, essa semana parece que está liberando áreas de proteção ecológica para plantio de comida, não é? A União Europeia está liberando áreas emergenciais para plantio. E o Brasil tem um volume gigantesco de área protegida, de área conservada, protegida pelos produtores, protegida pelo próprio governo federal e pelos estados, que são mais de 60% do território. Esse ativo ambiental, a gente vai conseguir monetizar.
E o quanto dá para monetizar?
Leite: O que nós enxergamos só no mercado de carbono seriam US$ 25 bilhões de potencial pelo Brasil em relação a US$ 100 bilhões que deve gerar esse mercado.
Seriam US$ 25 bilhões só o mercado voluntário?
Leite: Não, acho que mercado regulado e voluntário. Você vai ter uma migração do mercado voluntário para o regulado global. A gente está hoje no voluntário, monta uma estrutura de registro para ter credibilidade desse sistema todo que te falei para garantir a não-dupla contagem, garantir integridade e ter critérios mínimos. O importante é ter critérios mínimos para você registrar um carbono, porque se não você vai estar colocando um produto que não é carbono. Então, a gente vai ter critérios mínimos para você registrar nessa plataforma.
A disposição em propor soluções climáticas lucrativas é um dos grandes legados que a gestão Bolsonaro deixa para sua política ambiental?
Leite: Sim, a grande diferença das políticas anteriores é que elas eram baseadas em utopia e irracionalidade: reduzir, proibir, culpar e multar. Nós temos uma política diferente, feita pelo setor privado, muito próximo ao setor privado, onde nós queremos empreender, inovar, gerar emprego verde e crescimento verde.
A solução para o mundo tem que ser o crescimento verde, você não vai implementar políticas de proibições e reduções como está acontecendo agora na Europa. Ninguém mais está olhando para a meta climática, mas sim para a segurança energética. Neste momento, vários países, inclusive a Europa, no ano passado aumentou 18% o uso de carvão na sua matriz energética. Isso antes da crise na Ucrânia. E agora está buscando energia barata e em volume, com segurança de fornecimento.
O Brasil entende que tem que achar soluções climáticas para as energias renováveis, elas têm que ser viáveis economicamente e a gente tem que dar incentivo para essas novas energias, como nós fizemos com o metano. Essa é a forma de fazer política. Uma política racional, mas rigorosa ambientalmente falando, porque temos leis para cumprir e o governo vai garantir que elas sejam cumpridas, porque tem toda uma legislação e temos todo um aparato de fiscalização que vai ser realizado.
E do outro lado, é trazer a racionalidade, onde eu trago soluções lucrativas como a visitação em parques. Governos anteriores achavam que aquelas áreas de parques deveriam estar isoladas tanto do privado quanto dos visitantes. Nós entendemos que a visita ordenada junto com a iniciativa privada lucrando é bom para o meio ambiente. Você vai atrelar atividade econômica com proteção ambiental.
Essa política ambiental pode mudar a visão de alguns críticos no Brasil e no exterior? Nas discussões da COP 26, por exemplo, os críticos classificaram o Brasil como isolado e um pária internacional.
Leite: É uma desinformação dizer que o Brasil está isolado. Foi o governo brasileiro e fui eu, o ministro do Meio Ambiente, que conseguiu chegar ao consenso [pela regulamentação] do artigo 6 [do Acordo de Paris] no mercado [global] de carbono. Não foi outro governo, fomos nós que fomos protagonistas na negociação. E essa negociação estava travada na quinta-feira, um dia antes do encerramento da conferência. E foi por ação minha, junto à nossa equipe de negociadores, que a gente conseguiu reverter essa situação para criar o mercado global de carbono, que interessa a todos, especialmente ao Brasil.
Eu fiz 60 reuniões antes da conferência do clima e 25 reuniões durante a conferência do clima. Eu recebi o [John] Kerry [enviado especial dos Estados Unidos sobre o clima] no nosso estande, o ministro de meio ambiente chinês [Xie Zhenhua], recebi a Suíça, o Uruguai. Eles não viriam ao nosso estande se a gente estivesse isolado. E nós fomos o país que fez o estande mais inovador de uma conferência do clima. Os estandes normalmente são feitos para fazer sentar negociadores de clima e o nosso estande foi feito para apresentar um Brasil verde, um Brasil real, com mais de 100 casos levados a Glasgow. Feitos de forma virtual, aqui de Brasília para quem não pode ir a Glasgow, e presencial lá em Glasgow. Nenhum estande foi tão inovador e tão inteligente para mostrar uma atividade e um Brasil que faz, não só que fala.
E o senhor sente mudança na percepção sobre nossa política ambiental?
Leite: Essa percepção está mudando. Quando você lança uma política, o primeiro país a realmente lançar uma política para a redução de metano fomos nós, uma política real, com incentivos econômicos, com a geração de créditos de metano, com reconhecimento de créditos de metano e com isenção fiscal para a compra de equipamentos. O acordo foi assinado em novembro, praticamente dezembro. Nós conseguimos entregar uma política agora, nenhum outro país fez isso. Além de compromissos e promessas, o Brasil age, e quando a gente age, vai deixando claro pelos fatos e dados que nós estamos na boa direção de uma política racional.
E o que o ministério prepara para a COP deste ano?
Leite: Nós devemos fazer um evento antes da COP [em maio], que é o Mercado Global de Carbono. Antes da COP, vamos fazer um encontro de mercado global no Brasil, será um encontro só para convidados, para líderes internacionais, para discutir como seria a implementação de um mercado global, palestras de CEOs para contar políticas corporativas na direção de uma nova economia verde e 200 casos de empreendedorismo verde. A gente vai levar pequenos negócios para apresentar lá. E a gente deve levar na COP do Clima um plano de hidrogênio verde brasileiro e eólica offshore.
Para quando o ministério trabalha entregar esse plano de hidrogênio verde?
Leite: Dá para ser entregue este ano, antes da conferência [COP 27 ocorrerá em novembro].
O senhor poderia dar mais detalhes sobre o plano de hidrogênio verde?
Leite: A gente está desenhando ainda, quando estiver um pouco mais [avançado] eu passo. É hidrogênio [verde], eólica offshore e política automobilística sustentável. São três planos que estou desenhando agora.
Aproveitando o timing eleitoral, ministro, em face de tudo o que conversamos até agora, eu pergunto: fosse um governo de esquerda no comando, como estaria a política ambiental, na sua opinião?
Leite: Se fosse um outro governo, você estaria saindo daqui com uma multa. Proibindo você de fazer alguma coisa porque a pressão que o governo brasileiro recebeu no ano passado para proibir, multar e reduzir a atividade econômica foi gigante, seria muito mais fácil ceder a essa pressão e se fosse outro governo, eles iriam adorar essa pressão, você não estaria aqui discutindo como você poderia gerar atividade econômica, uma vez que tem regras para proibir e obrigações de reduzir.
Este governo teve a racionalidade de não dizer "não" a nenhum combustível fóssil enquanto não houvesse real alternativa econômica para combustíveis renováveis. E o que nós fazemos: a gente busca soluções para trazer incentivos econômicos para aquilo que é inviável ainda começar a ter a viabilidade econômica, como eólica offshore, que ainda é três vezes mais cara que a eólica onshore [a fonte de energia limpa e renovável que se obtém aproveitando a força do vento que sopra em terra], mas que talvez com créditos de carbono pela conta da substituição da energia fóssil pela renovável, esses projetos possam ter viabilidade econômica.
E uma coisa que é importante, este governo atua muito próximo ao privado, isso é um grande diferencial, governos anteriores atuavam muito mais com o terceiro setor, que só fala em proibir, proibir e proibir, reduzir, reduzir, reduzir, e, se possível, tirar o homem do sistema e, assim, salvar o planeta. Tem uma frase que eu gosto: nós não queremos parar o mundo para salvar o planeta, nós temos que acelerar o planeta na direção de uma nova economia verde. Tem muita gente querendo parar o mundo para salvar o planeta e, com essa crise geopolítica, todo mundo já percebeu, inclusive os Estados Unidos, os líderes europeus especialmente, vão abrir mão um pouco daquilo que pregavam como uma solução global para buscar a segurança energética deles.
E o Brasil é, hoje, um porto seguro para energias renováveis, nenhum país do mundo tem a capacidade de geração de energia renovável como nós, e de energia excedente. Nos próximos 10 anos, vai sobrar energia no Brasil.
Sobre energias renováveis, como a política ambiental brasileira pode tirar "proveito" dessa crise geopolítica posta em decorrência da guerra na Ucrânia?
Leite: O Brasil, mais uma vez, tem que mostrar a solução global para os desafios climáticos. Como que o Brasil deve se comportar em um momento de crise? De forma racional e caminhando na direção de uma nova economia verde. Não vou chamar de oportunidade, porque essa crise humanitária lógico que não deve ser considerada uma oportunidade, mas o Brasil é, hoje, e será no futuro, um seguro fornecedor de energias renováveis para o mundo, de todas as formas que vão se desenvolver essas energias renováveis, inclusive hidrogênio verde.
Lançamos uma política de metano, que vai substituir provavelmente 30% do óleo diesel, que é o volume que hoje é importado, e vai reduzir 36% das emissões do Brasil só por esse programa metano zero, do Ministério do Meio Ambiente. Vai produzir volume de 120 milhões de metros cúbicos por dia [de biogás e biometano]. E temos potencial de eólica offshore que pode gerar hidrogênio verde e podemos exportar volumes relevantes para o mundo.
O Brasil tem que caminhar na política racional mostrando que é parte da solução, que a solução está nas tecnologias de energias renováveis, e a solução para os países que vão ter que emitir mais agora é comprar crédito de carbono do Brasil. O mundo vai para uma rota a curto prazo de mais emissões [de gases de efeito estufa], por impossibilidade física ou econômica, eles têm que ir por esse caminho e necessidade de segurança jurídica, e o Brasil pode ser o grande fornecedor de carbono para compensar essas emissões nessa rota de curto prazo.
A Europa e os Estados Unidos vão ampliar as emissões e deveriam compensar parte de suas emissões nesse período. E o Brasil será o grande fornecedor para elas disso. É o que eu enxergo de potencial do Brasil para desenvolver uma nova economia verde em um momento geopolítico de crise, de mudança. A geopolítica mudou, quatro semanas depois do início da crise na Ucrânia, a geopolítica mudou, e mudou para sempre. Ela não mudou por um mês ou dois. O Brasil se coloca como um player de soluções climáticas para o mundo: alimento, energia e carbono.
Sobre biocombustíveis, o percentual sobre o setor de transportes era de 20% em 2021. É possível elevar essa proporção com as ações propostas pelo governo, como o estímulo do biometano?
Leite: Nossa estratégia de metano junto com [o Ministério de] Minas e Energia tem o objetivo de substituir 30% do diesel por biometano. O presidente dirigiu um trator a biometano do [Palácio da] Alvorada ao [Palácio do] Planalto. Tem trator, caminhão, caminhão de lixo e ônibus. Eu andei no ônibus e no caminhão de lixo. A tecnologia chegou, o que a gente agora vai fazer é expandir em uma escala relevante essa tecnologia de forma descentralizada.
O senhor teria alguns exemplos do uso de biocombustíveis?
Leite: Nós conseguimos fazer com que um produtor de aves e suínos no Mato Grosso possa ter o seu próprio combustível. Eu falei com um laticínio que estava substituindo 40 tratores por tratores a biometano porque o resíduo do laticínio que ele tinha lá poderia gerar biometano e iria custar R$ 15 milhões para implementar esse programa, esse projeto, e ele iria reduzir em 60% o custo equivalente em diesel. Então, ele está substituindo por economia.
E além disso, vai gerar um crédito de metano, e do outro lado um crédito de carbono. Um de metano, do resíduo, e do carbono, da substituição do diesel para fazer a mesma atividade. Ele fazia uma atividade de laticínio com 40 tratores emitindo gás de efeito estufa do óleo diesel, agora vai fazer com zero emissões. E do outro lado vai evitar o metano na atmosfera, então, ele vai ter um duplo ganho.
É possível ter políticas ambientais que estimulem esse caminho?
Leite: Entendo que a gente possa ter políticas nessa direção, estou falando de uma estratégia de redução de metano. Do outro lado, vamos desenhar a política automobilística e quando tiver os cálculos a gente faz uma entrevista sobre a política automobilística e todas as rotas possíveis para a gente reduzir e ser mais sustentável em relação à mobilidade. E todas as rotas significam todas, flex, por combustão, elétrica, 100% elétrica, gás, biometano, biocombustíveis, como etanol.
Nenhum país tem uma condição tão boa quanto a nossa. O que não podemos é errar e achar que o carro elétrico é a grande solução. O carro elétrico elimina um carro popular no Brasil, o custo eu não preciso nem dizer, é só olhar em Brasília e ver quantos carros elétricos têm. Veja se todo mundo que vem aqui [para o Ministério do Meio Ambiente] vem de carro elétrico para salvar o planeta, ou ainda acham que é caro?
O governo lançou o plano nacional de fertilizantes, que tem a sustentabilidade como um dos principais pilares, sobretudo para os projetos de mineração. A ideia é o governo apoiar projetos que prevejam modelos de menor emissão de carbono e tenham conceitos sustentáveis incorporados. O Ministério do Meio Ambiente participou de conversas sobre esse plano, é possível conduzir ações sustentáveis nessa área de mineração?
Leite: A gente atua de forma integrada, e tenho só uma dúvida na sua fala, porque em momento algum eu, que sou responsável pela política do meio ambiente, vou falar que você vai fazer algo ou que o governo não vai fazer algo. Não é o governo que faz, o governo faz uma política e a política que vira uma realidade no privado.
Nesse momento, a gente tem que incentivar as alternativas, não proibir nenhuma delas. Em nenhum momento você vai me ver falar de proibir carvão, proibir diesel, proibir energias ou melhor combustíveis fósseis. E nem proibir mineração por causa de gás de efeito estufa. Acho que temos que incentivar a mineração sustentável com menor gás de efeito estufa, a gente tem que incentivar as energias renováveis.
É possível ter medidas e ações para qualquer tipo de mineração sustentável, mesmo a mineração em terras indígenas?
Leite: Toda atividade econômica regular e ordenada é ambientalmente correta, as nossas leis são bastante rígidas. Mineração em qualquer área do Brasil, de forma ordenada, normalmente na Amazônia, que são extensas áreas, você tem o impacto de 3% no território na floresta, porque são cavas pequenas, eficientes. Hoje, já não precisam de água, é mineração verde que estamos falando. Você faz pequenas cavas para explorar os minerais raros, trazendo desenvolvimento econômico e protegendo 97% [da área ambiental]. Quando você traz uma atividade ordenada, você com certeza garante a proteção.
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