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Viagem Lula China
Viagem de Lula à China terá encontros com autoridades chinesas e visita ao Banco dos Brics na tentativa de emplacar Dilma Rousseff.| Foto: Joedson Alves/EFE

Os países que compõem os Brics, bloco político e econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, têm discutido a inclusão de mais nações ao grupo. Esse aumento, no entanto, de acordo com especialistas, pode tirar o pouco protagonismo que o Brasil já desempenha na organização.

“O Brasil não desempenha grande influência no grupo, não somos uma potência econômica e nem uma influência política. Hoje, nos Brics, estamos no mesmo patamar que a África do Sul e a inclusão de mais países ao grupo pode deixar o Brasil em uma posição ainda mais desconfortável”, explica José Augusto de Castro, presidente da Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB).

Quando formado, em 2006, a África do Sul não fazia parte do grupo, sua inclusão aconteceu em 2011. Desde então, há diálogos sobre a possibilidade de novos países fazerem parte da organização. De acordo com Anil Sooklal, embaixador sul-africano dos Brics, 20 nações fizeram solicitação para integrar o grupo.

Entre os interessados, estão Arábia Saudita, Egito, Uruguai, Emirados Árabes Unidos, Cuba, República Democrática do Congo, Comores, Gabão e Cazaquistão, além de Argentina, Bangladesh, Guiné-Bissau, Indonésia e Honduras. Há ainda a Venezuela, que Lula tenta fazer lobby para que também ingresse na organização. O país, no entanto, não apresentou nenhum proposta formal [nem informal] para integrar o grupo.

De um lado, a China defende a expansão do grupo. Isso porque o país busca aumentar sua influência no contexto mundial e por isso quer acelerar esse processo de expansão. Quando o país liderava o bloco, o vice-ministro chinês, Ma Zhaoxu, apresentou uma proposta chamada BRICS+, contando com a inclusão de novos países ao grupo. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Mao Ning, disse que Pequim trabalha em uma expansão "acelerada do bloco".

Do outro lado, Índia e Brasil são a favor da inclusão de novos membros, mas com um porém: que isso seja feito com critérios. Após o ministro de Relações Exteriores brasileiro, Mauro Vieira, participar do encontro do bloco na África do Sul, neste mês, ele disse que os países membros estavam "trabalhando e talvez [seja] por causa desse grande sucesso que atraiu a atenção de muitos outros países nos 15 anos".

Mais países no grupo tira protagonismo do Brasil

Para os especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a entrada de novos países no grupo tiraria o pouco protagonismo que o Brasil já possui na organização. Apesar de ter nomeado a presidente do Banco dos Brics, cargo dado à ex-presidente Dilma Rousseff, o país não possui poder financeiro ou político para exercer algum tipo de influência sobre os demais membros do grupo. "Cada vez que se aumenta o grupo, ele vai diluindo e essa diluição pode fazer com que o Brasil perca representatividade", explica Castro.

"O Brasil tem um 1/5 da participação nos Brics, ou seja, 20%, com a inclusão de novos países, essa participação pode cair para 19%, 18% ou 15%. Esse aumento [de países no grupo] também passa a diminuir a importância do Brasil e faz com que cada país, individualmente, tenha uma participação menor na organização", salienta o presidente da AEB.

Com a formação do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), também chamado de Banco do Brics, em 2015, a maioria dos países que deseja integrar o grupo tem a intenção de ter acesso aos recursos financeiros que a organização oferece. O NDB busca oferecer apoio financeiro para países membros [e outros países emergentes] que desejam financiar obras de infraestrutura e desenvolvimento sustentável, sejam elas públicos ou privados. Com a inclusão de novos países, o Brasil também perde espaço no que diz respeito ao acesso a esses recursos.

"O Brasil teria que dividir recursos com mais países", explica Pedro Feliú, professor de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP). "Nações como Uruguai e o Egito podem ser mais tomadores de empréstimo do que os Emirados Árabes, por exemplo, quesito em que o Brasil perde protagonismo", afirma.

Para os especialistas, ainda que sem a inclusão de novos países, o Brasil não desempenha um papel muito influente no grupo. "Acredito que ainda é cedo para dizer que a expansão da organização é um reflexo da perda de relevância do Brasil, mas sua perda de protagonismo é até um pouco independente dessa adesão [de mais países ao grupo]. A perda de protagonismo do Brasil depende muito da sua capacidade material, que esteve no auge entre 2002 e 2010, com o chamado boom das commoditys. Mas já faz tempo que não vivemos isso", pontua o professor.

Um exemplo da baixa influência do Brasil nos Brics foi a frustrada tentativa de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a Argentina ter acesso aos recursos do NDB. O presidente brasileiro tentou com que os Brics fizessem um empréstimo ao país vizinho, mas teve o pedido negado. Apesar da negativa, o presidente argentino, Alberto Fernández, ainda tem esperança de ingressar no grupo e segue em negociações com o petista, que prometeu "fazer de tudo para ajudar a Argentina".

Feliú ainda avalia que o interesse do Brasil em apoiar a expansão do grupo parte do interesse em criar colisões multilaterais. "A princípio, o Brasil defende essa ampliação e como não temos uma capacidade de poder muito grande, para o Brasil é sempre melhor forjar colisões maiores, pregar o multilateralismo e aumentar seu poder de barganha associando-se a mais países em condições semelhantes", analisa.

Venezuela nos Brics

Após visita de Nicolás Maduro ao Brasil, Lula falou ser favorável à entrada do país no grupo e o ditador venezuelano comprou a ideia. “Precisamos construir essa nova geopolítica, que tem componentes fundamentais… União da América do Sul, apesar das diversidades (políticas)… Junto aos Brics, cinco países poderosos que estão se transformando num grande ímã daqueles que buscam um mundo de paz e cooperação”, disse Maduro.

Apesar da possibilidade de a Venezuela entrar nos Brics, essa tem sido uma pauta contraditória. Em busca de mais apoio e novas relações com a América do Sul, a China já se mostrou favorável a essa integração . "Damos as boas-vindas a mais parceiros com ideias semelhantes para se juntarem à família BRICS em uma data próxima", disse Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China.

Essa possibilidade, no entanto, é criticada por especialistas, que não enxergam como o país poderia agregar em algo na organização. A tentativa parece ser, mais uma vez, o interesse de Lula em formar conexões ideológicas com o país.

"Tecnicamente, não faz sentido a Venezuela integrar o grupo. Não há condição econômica [para agregar ao Brics] e, por esse quesito, o país não pode somar em nada, além de enfrentar uma série de problemas democráticos", pontua José Augusto de Castro.

Como os Brics se posicionam no mundo atualmente

A união de Brasil, Rússia, Índia, China e, posteriormente, a África do Sul foi criada com o intuito de proporcionar maior integração geopolítica entre os principais países emergentes do mundo. "O Brics entrou no cenário mundial como uma alternativa ou proposta diferente do que seria, de um lado, a OCDE e, do outro, as instituições financeiras internacionais de Breton Woods, mais especificamente o FMI e o Banco Mundial", explica Pedro Feliú.

Em suma, o grupo tem o intuito de criar uma alternativa de reforma, mudança ou ao menos de formar outra possibilidade de ordem interna que não seja pautada pelos tradicionais países desenvolvidos. Apesar da ideia de criar opções que encaixem à realidade desses países, o grupo não possui relevância no quesito segurança, como faz a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). "Há de se notar que nas reuniões do Brics pós a invasão da Rússia à Ucrânia, também porque a Rússia é um membro do grupo, não se faz menção sobre a guerra, a paz ou sobre um acordo", analisa.

Ainda que o grupo não se articule em questões securitárias, seu poder econômico não pode ser comparado ao FMI e nem ao Banco Mundial, pois há limitação financeira do grupo. "Também não funciona como fórum de concentração, como uma alternativa à OCDE ou até mesmo ao G7, pois não é responsável por demonstrar grandes alterações no cenário internacional. Então, coloco o Brics nessa segunda prateleira dos blocos mundiais", analisa.

Mesmo que sua criação tenha surgido do desejo de reunir os países emergentes, o cenário mundial se transformou ao longo dos anos. Atualmente, os Brics representam 25,6% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, além de ser maior que o PIB do G7 (grupo dos 7 países mais industrializados do mundo). Essa guinada deu-se pelo grande crescimento econômico da China, consolidada como a segunda maior economia do mundo, junto com a Índia, país emergente que mais apresenta crescimento econômico nos Brics e ocupa da 7ª posição no ranking de PIBs mundiais.

Devido ao tamanho que representam atualmente, muitos países emergentes buscam ganhar um espaço no bloco. Para o presidente da AEB, no entanto, as discussões sobre a expansão dos Brics podem acabar tendo um desfecho negativo para os países que enxergam esperança no grupo. "Pessoalmente, acho difícil que inclua-se novos países, porque seus integrantes perdem representatividade no grupo como um todo", afirma.

O especialista ainda ressalta que os critérios para adesão ao grupo devem ser muito bem estabelecidos pelos países-membros. "Acho que pode existir menção de incluir novos países, mas na hora do vamos ver, não vão fazer nada. Ainda mais quando essa discussão inclui países que não podem agregar em nada ao grupo economicamente", pontua Castro.

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