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A pré-candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) à Presidência redefiniu a disputa eleitoral de 2026 e consagrou uma aposta na estratégia centrada no antipetismo. Com a força política do pai Jair Bolsonaro (PL) e ao afirmar que seria uma versão moderada do ex-presidente - segundo as palavras do próprio senador -, Flávio se apresenta como a combinação de capacidade de diálogo, que é demandada pela centro-direita e pelo mercado financeiro, com a fidelidade ao eleitor mais engajado da direita.
O próprio Flávio afirmou nesta terça-feira (9), logo após visitar o pai na prisão, que a sua candidatura ao Palácio do Planalto é “irreversível” e que não há possibilidade de recuo. “Essa candidatura é irreversível, palavras dele (Jair Bolsonaro). Não vamos voltar atrás, vamos seguir em frente. A partir de agora, é conversar com as pessoas para termos ao nosso lado quem realmente importa”, declarou. Foi o primeiro encontro do senador com Jair Bolsonaro desde que a escolha do pai pelo seu nome para disputar a Presidência em 2026 se tornou pública, na última sexta-feira (5).
Diante disso, nem a aprovação da dosimetria - que reduz as penas para os condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pelos atos de 8 de janeiro - deve fazer o senador desistir da pré-candidatura. Isso porque, segundo Flávio, a missão dada pelo pai é de "dar continuidade ao nosso projeto de nação".
No último domingo (7), ao comentar resistências políticas à sua pré-candidatura, Flávio explicou qual seria o “preço” para que não levasse a pré-candidatura “até o fim”: ver o pai livre e elegível. Na prática, deixou claro que sua desistência é inegociável.
O cenário ganha consistência também com a manifestação do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), até então o nome preferido pelo Centrão e pelo mercado para enfrentar Lula. Nesta segunda-feira (8), Tarcísio reafirmou lealdade a Jair Bolsonaro e apoio explícito à pré-candidatura de Flávio, destacando que cabe ao senador construir projeto capaz de agregar forças políticas — algo visto como essencial.
Em entrevista coletiva, Tarcísio disse ter sido informado diretamente pelo senador. Segundo ele, Flávio “vai contar” com o seu apoio e assume “grande responsabilidade” dentro da oposição. O governador apresentou críticas ao governo Lula e disse que a direita precisará organizar um “grupo” com convergência de ideias e planos. Segundo ele, o debate eleitoral deverá incluir questões estruturais do país.
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PL manterá Flávio na disputa mesmo que não consiga formar aliança com o centro
Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição no Senado e secretário-geral do seu partido, afirmou na noite desta segunda-feira (8) que a pré-candidatura de Flávio vai buscar apoio de partidos de centro-direita. Ele disse que, caso não consigam formar uma base ampla logo na largada da campanha pela Presidência em 2026, o PL poderá adotar um “pacto de não agressão” no primeiro turno, a exemplo de alianças vistas noutros países.
Na noite de segunda-feira (8), Flávio reuniu-se em Brasília com dirigentes de vários partidos para discutir sua pré-candidatura. Estiveram presentes os presidentes do União Brasil, Antonio Rueda; do PP, Ciro Nogueira; e do PL, Valdemar Costa Neto. Nesta terça-feira (9), ao deixar a Superintendência da PF, o senador avaliou o encontro como “positivo”.
“Minha relação com o Ciro e com o Marinho é muito boa. A conversa foi muito franca. Eles manifestaram preocupação com a possibilidade de eu não tracionar, mas já estou tracionando. Eles foram claros e eu também fui ao pedir apoio. Agora, vão levar essa discussão às bases. Essa candidatura é pra valer, não tem volta”, disse.
Em entrevista à Folha de S. Paulo, Flávio ainda reforçou que a sua pré-candidatura pelo PL é irreversível e argumentou que a derrota de Lula em 2026 seria “o que vai salvar o Brasil”, além de também “salvar” o seu pai — alusão à possibilidade de anistia ou indulto para beneficiar o ex-presidente preso. O PL aceitou a aprovação da dosimetria, mas afirma que vai lutar pela anistia a partir de 2026.
Do lado do governo, a campanha de Lula à reeleição enfrenta um conjunto crescente de desgastes. O Palácio do Planalto tenta conter efeitos políticos da CPMI do INSS, que avança sobre denúncias envolvendo familiares do presidente — com destaque para o filho Lulinha. Na economia, a desconfiança do mercado com sinais de desordem fiscal se mantém, enquanto pesquisas mostram que a reprovação de Lula supera sua aprovação. Há ainda as crises com os presidentes da Câmara e do Senado e as novas quedas na aprovação do governo nesse quadro.
Posturas refratárias do centro são apenas “jogo de cena”, diz professor
Adriano Cerqueira, professor de Ciências Políticas do Ibmec-BH, avalia que o anúncio da pré-candidatura de Flávio Bolsonaro, feito de forma surpreendente pela família, sacudiu simultaneamente os mundos político e econômico. Para ele, porém, o efeito mais relevante foi expor a resiliência de Jair Bolsonaro como principal referência da direita.
“O mercado reagiu forte, mas a direita também mostrou força. Mesmo preso e incomunicável, o ex-presidente fez ecoar um rugido de leão na selva eleitoral”, ilustrou.
Segundo Cerqueira, a reação inicial de investidores e líderes do Centrão, marcada por discursos refratários, foi sobretudo um “jogo de cena” para administrar o impacto da novidade enquanto seguem as negociações.
Ele observa que o mercado gostaria de outro nome e que, na sua visão, não se pode descartar a possibilidade de Flávio ceder espaço a outro candidato, mas apenas dentro de composição mais ampla que envolva a anistia aos condenados do 8 de janeiro. Mas, como já foi demonstrado, não é esse o posicionamento de Flávio Bolsonaro sobre sua pré-candidatura.
O professor vê, ainda, margem para a pré-candidatura de Flávio ganhar tração, impulsionada pela visibilidade decorrente do apoio de Jair Bolsonaro. “Ele começou bem sua primeira semana de caminhada ao Palácio do Planalto, sem dúvidas. Mas muita coisa pode mudar até o início efetivo do período eleitoral”, pondera.
Cerqueira salientou que o ponto em comum entre direita e centro está na forte aversão ao cenário de uma hipotética reeleição de Lula em 2026, o que traria impacto negativo sobre as perspectivas econômicas do país.
Pesquisa do Instituto Veritá mostrou que Flávio tem 39,2% das intenções de voto no segundo turno, ante 39,8% de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — empate na margem de erro de dois pontos percentuais. Foram ouvidos 2.519 eleitores em todo o país nos dias 6 e 7 de dezembro. O nível de confiança é de 95%. A sondagem foi divulgada em 8 de dezembro - três dias após o lançamento da pré-candidatura a presidente, no dia 5.
Já o levantamento do Datafolha - cujos dados foram colhidos antes do anúncio de Flávio sobre a disputa pelo Palácio do Planalto - citou que o petista aparece com 51% das intenções de voto, contra 36% do filho do ex-presidente. O levantamento foi realizado entre os dias 2 e 4 de dezembro, com 2.002 eleitores em 113 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. A divulgação ocorreu em 6 de dezembro.




