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Lula e Haddad
Favorecido pelas boas notícias na economia, ministro da Fazenda, Fernando Haddad, melhora sua imagem no mercado.| Foto: EFE/André Borges

Na última quinta-feira (26), a agência de risco Fitch elevou a nota de crédito de longo prazo do país, animando analistas e investidores. A melhora foi puxada por expectativas positivas em relação ao desempenho econômico e fiscal do país proporcionadas por fatores alheios ao governo, levando ao recuo do dólar e à pontuação diária recorde da bolsa de valores para o ano. As apostas de corte da taxa básica de juros (Selic) em agosto dobraram para 0,5 ponto. E o maior beneficiário é o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que emerge como candidato natural à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2026, caso o presidente não queira ou não possa concorrer a um novo mandato.

Haddad enfrentou inicialmente a desconfiança do mercado financeiro devido à falta de um programa claro e consistente e aos receios de medidas intervencionistas e estatizantes nutridas pelo discurso esquerdista e por Lula. Ou seja, como as expectativas sobre ele eram muito baixas, Haddad agora elogiado por banqueiros, economistas liberais e grandes empresários por não ter contribuído para um desastre maior.

Nesse cenário, ele vem se consolidando como homem forte na economia do governo Lula. A reviravolta dos humores de agentes econômicos deve-se à percepção de Haddad como um contraponto mais amigável em relação ao atual presidente.

A habilidade de Haddad para driblar as pressões de Lula e a sua capacidade de negociar com o Congresso de perfil de centro-direita contribuíram para avanços positivos em reformas econômicas, com arcabouço fiscal e reforma tributária à frente, mesmo mantendo relação de proximidade com Lula. Sua atuação também serviu de contenção ao lado mais esquerdista do governo.

Até mesmo durante o intenso ataque do Executivo ao presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, para forçar a uma redução na taxa Selic básica de juros, Haddad conseguiu manter postura amena.

Ministro tenta encontrar formas para obter receitas extras e taxas devem aumentar

Devido ao ambiente mais previsível, quase todos os indicadores apontam para uma virada no segundo semestre, ajudada pelo cenário externo e por reformas feitas em governos anteriores, desde 2016. Os mercados nacional e externo já enxergam que o Brasil está fazendo a lição de casa, avaliação essa logo explorada por Haddad, que renovou o compromisso de entregar em 2023 o déficit da União em 1% do Produto Interno Bruto (PIB).

O governo parece não estar disposto a cortar despesas. Pelo contrário, está apostando em um Estado inchado (para acomodar todos os aliados em cargos) e na velha política, já exaurida, de aumentar gastos para tentar estimular a economia.

Por isso, o maior desafio de Haddad está em buscar receitas. Ele deve tentar fazer isso com taxações da alta renda, corte de subsídios e liberação de cobranças. Nesse ponto, o ministro lamentou a decisão de Arthur Lira (PL-AL), presidente da Câmara, de adiar a votação da mudança no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf).

Para Arthur Wittenberg, professor de Relações Governamentais do Ibmec-DF, caso a reforma tributária se consolide este ano, como é a tendência, seus protagonistas no Congresso saem como vitoriosos, mas Haddad deve ser o maior beneficiado. “Pesquisas mostram que efeitos positivos já vinham sendo captados pelo mercado. Além da tramitação de reformas, também ajudam o cenário econômico e a falta de previsão de avanço do desemprego e da inflação. Com investimentos privados e públicos e estímulo ao varejo com redução dos juros, abre-se horizonte econômico mais favorável para o governo e sobretudo para o ministro”, avaliou.

Quanto à possibilidade de o chefe da equipe econômica conseguir construir uma candidatura presidencial, Wittenberg avalia que isso dependerá não apenas do sucesso dele frente à pasta, mas, especialmente, da sua destreza para vencer movimentações de outros postulantes do próprio PT. “Caso Haddad seja mesmo o escolhido de Lula, considerando ser ele opção segura do ecossistema do partido e ter experiência no Executivo, e consiga ainda resistir até lá, será nome muito competitivo em 2026”, disse.

Luiz Filipe Freitas, analista da consultoria Consillium, também acredita que Haddad “claramente superou as expectativas” como fiador da aprovação da reforma tributária.

Mas isso aumentou a desconfiança dos setores mais à esquerda do governo. Quem encabeça a resistência a Haddad é a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffman. Os dois vêm se desentendendo desde a campanha eleitoral, mas a disputa aumentou quando o ministro começou a contrariar Hoffman impondo, por exemplo, a volta dos impostos sobre os combustíveis no início do ano.

A falta de habilidade política e a estampa de radical da presidente do PT ajudaram a criar uma atmosfera de sobriedade e equilíbrio para a figura de Haddad, mas só por uma questão de comparação.

“De toda maneira, pelo bem da gestão petista, era essencial que o mercado mudasse de humor, o que o ministro conseguiu, a despeito do ônus da dúvida que possa pairar sobre setores classistas e mais voltados para o social”, disse.

Para ele, os eventuais efeitos negativos sobre o ambiente interno do governo parecerão irrisórios diante das benesses a serem colhidas pela aprovação das reformas econômicas. Na sua opinião, tal perspectiva pode repetir a que levou o então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso a se tornar presidenciável em razão do sucesso do Plano Real (1994).

Candidatura ainda depende de indicadores positivos

Segundo Eduardo Galvão, professor de Relações Institucionais do Ibmec-DF, os impactos da situação do governo sobre o seu futuro ainda não podem ser previstos com segurança, considerando o tempo por ser percorrido. “De toda forma, é possível imaginar que Lula queira tentar a reeleição em 2026, aos 80 anos. Isso vai depender basicamente do desempenho da economia e do seu quadro de saúde. Caso não queira ou não possa se candidatar, ele terá à disposição bons nomes aliados para compor esta frente”, disse. Na sua opinião, nessa hipótese Haddad e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) têm vantagens e figurariam hoje como as melhores opções.

“Fernando Haddad estreou no ministério sob muitas críticas, por não ser um nome essencialmente técnico, mesmo sendo economista, pois faltava expertise na área. O cargo de ministro da Fazenda é, na prática, mais político que técnico, precisando se cercar de bons nomes técnicos. Neste sentido, ele acabou desempenhando bem esse papel”, sublinhou Galvão.

Segundo o analista, após ser bombardeado pelo mercado financeiro, o ministro obteve avanços e, se as condições econômicas forem favoráveis nos próximos três anos, poderá somar essenciais apoios de opinião pública, investidores e agentes da indústria, comércio e serviços. “Ao deixar os principais setores satisfeitos, o governo poderá emplacar chapa competitiva em 2026. Tudo depende, obviamente dos indicadores da economia até lá”, resumiu.

O cientista político André Felipe Rosa lembrou que Haddad desde o início do governo é apontado como candidato a sucessor de Lula, sendo o próprio cargo de Ministério da Fazenda uma sinalização neste sentido, em meio às diversas especulações e críticas. “Como teste essencial está a negociação agora no Senado da reforma tributária pode deixar o cenário mais claro, ajudado pela perspectiva de juros declinantes”, disse.

Ele ressaltou que, de toda forma, Haddad continuará debaixo da sombra de Lula, enquanto o atual presidente mostrar saúde para pleitear seguir adiante no Planalto e, também, não encontrar atritos com o vice-presidente Geraldo Alckmin.

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