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Em entrevista exclusiva ao Café com a Gazeta do Povo, o jornalista Marcos Vanucci, que foi cobrir a manifestação de 8 de janeiro de 2023 e acabou preso, relatou os 70 dias que passou no Complexo Penitenciário da Papuda, no Distrito Federal.
Vanucci contou que fez a cobertura das manifestações no dia anterior e, por considerar o QG o melhor local para “contar a história daquele monte de pessoas que vieram do país inteiro”, dormiu ali a convite dos manifestantes. Na manhã seguinte, o cenário mudou. “Na segunda-feira fomos surpreendidos com o QG cercado pelo Exército com homens apontando armas para todas as pessoas”, descreveu o jornalista.
Ao tentar informações com os comandantes, Vanucci disse que a única ordem era que todos entrassem nos ônibus, sem explicações sobre o destino. “Até então eu não sabia que estaria preso porque me identifiquei como repórter”, afirmou. Ele questionou a legalidade da ação, já que não houve voz de prisão.
Os detidos do 8 de janeiro foram levados a uma base militar, onde permaneceram cerca de uma hora. Segundo Vanucci, um policial disse que o acordo com o governo previa apenas identificação e liberação dos manifestantes. No entanto, a ordem mudou, e um comandante militar que teria discordado da prisão também foi responsabilizado.
Na sede da Polícia Federal (PF), onde passou três dias, Vanucci descreveu o abandono. “Todo mundo jogado, não existia uma autoridade que chegasse para as pessoas na quadra e dizia: ‘Olha, está acontecendo isso, vai acontecer isso, nada, nenhum tipo de informação’.”
Ele também questionou a montagem de um hospital de campanha próximo à PF, suspeitando que tudo havia sido “programado”. Durante a triagem, recusou-se a assinar documentos que o incriminavam e orientou outros presos do 8 de janeiro a não assinarem.
A chegada à Papuda foi marcada por violência e humilhação. “Ao descer do ônibus, quando nos levaram para a Papuda, eu já fui recebido com um soco no ombro por um dos agentes. Por quê? Eu não sei”, relatou. Ele descreveu cenas de pessoas nuas sendo obrigadas a ficar de quatro sob gritos, dizendo que nunca se sentiu tão humilhado.
Na cela, com capacidade para oito pessoas, havia 32 homens. Vanucci dormiu 70 dias no chão, ao lado do vaso sanitário. Relatou tratamento hostil de agentes, com ameaças e tentativas de aplicação forçada de injeções. “Com toda a maldade que eu tenho em mim, eu tomo seu sangue no copo”, teria dito um deles para o jornalista.
Vanucci demonstrou revolta com o que chamou de prisão ilegal e inconstitucional. “Nós jornalistas, comunicadores, não podemos nos calar diante disso que está acontecendo no Brasil. Temos que continuar denunciando porque só assim podemos tentar minimizar o sofrimento dessas pessoas”, afirmou.
Assista na íntegra o programa o programa desta quarta-feira (09).




