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Oposição tem maioria na CCJ, mas terá que se articular para contornar obstrução da esquerda
Mesmo sendo a maioria na CCJ da Câmara, a oposição tem enfrentado forte resistência de deputados da esquerda| Foto: Renato Araújo/Câmara dos Deputados

Mesmo sendo a maioria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, a oposição ao governo tem enfrentado forte resistência de deputados da esquerda para avançar em pautas como as que tratam de endurecimento de penas para crimes. Os deputados opositores terão que se mobilizar para conseguir vencer a estratégia de obstrução dos governistas, que já foi colocada em prática nas primeiras sessões do colegiado sob a condução de Caroline de Toni (PL-SC).

A Comissão de Constituição e Justiça é a mais importante da Câmara, pois praticamente todos os projetos de lei, emendas constitucionais e leis complementares têm que passar por lá, independente do tema. A CCJ é composta por 64 parlamentares, sendo que 13 são do Partido Liberal, o mesmo de Carol De Toni, que preside o colegiado; 10 da Federação [PT/PCdoB e PV]; 8 do União Brasil; 6 do PP; 5 do MDB; 5 do PSB; 5 do Republicanos; 2 do Podemos e outros dez integrantes dos demais partidos.

A nova presidente, que enfrentou resistência de líderes ao ser indicada para presidir a comissão por ser considerada apoiadora do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), pautou logo para a primeira sessão do ano, no último dia 12, três projetos que dificultam a vida de criminosos. Eles aumentam penas para quem praticar crimes por mais de três vezes, cometer estelionato ou usar este tipo de delito contra pessoas vulneráveis. Mas De Toni, logo de cara, esbarrou num artifício utilizado pela esquerda: a obstrução.

Desde o início, liderados pelo deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), parlamentares de esquerda que integram a comissão têm utilizado o chamado "kit obstrução", que incluiu estratégias regimentais para atrasar ou adiar votações.

Fazem parte da estratégia pedidos de retirada de pauta de determinados projetos, questões de ordem, pedidos de inversão de pauta, entre outros artifícios. Eles são utilizados de acordo com os interesses dos partidos em determinadas matérias, tanto nas comissões permanentes da Câmara quanto no plenário. Na prática, esses recursos não discutem se os projetos são constitucionais ou não, mas atrasam sua análise e retardam o trabalho da comissão como um todo.

Alencar disse à Gazeta do Povo que apesar da direita ser maioria na comissão e estar unida nas pautas penalistas e antiambientalistas, o governo usará da obstrução regimental em determinadas matérias. "Eles [oposicionistas] derrubam a obstrução, mas damos trabalho", resumiu o parlamentar.

Oposição diz que vai bem na CCJ, apesar da resistência da esquerda

Na opinião da deputada Bia Kicis (PL-DF), primeira mulher a presidir a CCJ, em 2021, apesar da inversão de pauta que conseguiu adiar a votação dos projetos que a oposição priorizou no início dos trabalhos [o chamado pacote anticrime], tudo está sob controle. "Estamos indo bem", afirmou.

Para o deputado Gilson Marques (Novo-SC), ainda é cedo para tratar de uma possível resistência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). "Esperamos que, com a Carol De Toni na presidência da comissão, mais matérias importantes para a direita sejam pautadas e aprovadas. Porém, não acredito que isso dependa de articulação. Normalmente essas matérias têm oposição ferrenha da esquerda e teremos que vencer a obstrução que surgirá em cada projeto. É um trabalho que requer persistência e paciência", afirmou. Ou seja, segundo ele, o governo não deve negociar, mas sim dificultar a tramitação dos projetos.

Já o deputado Maurício Marcon (Podemos-RS), vice-líder da oposição na Câmara, os parlamentares terão que ser mais ágeis se quiserem vencer e discutir as pautas de seu interesse. "Vamos tentar vencer na inversão de pauta. A gente se comprometeu a tentar votar as pautas, especialmente aquelas do crime", disse.

A inversão de pauta, que surpreendeu Caroline de Toni logo no início dos trabalhos da CCJ é uma tática na qual os governistas se aproveitam da falta de disciplina e comprometimento dos deputados da oposição.

Ela funciona da seguinte maneira: há uma ordem de votação de projetos estabelecida pela presidência da comissão, mas os deputados governistas apresentam um requerimento para alterar essa ordem e votar primeiro os projetos em que há consenso, mas que estão mais atrás na fila. Exemplos desses projetos são concessões de rádio e TV, verbas para a assistência à infância e projetos de infraestrutura.

A oposição tem maioria na comissão e poderia derrubar esse tipo de requerimento, mas se os deputados não estiverem presentes na sessão no momento em que é apresentado, ele acaba sendo aprovado e assuntos mais importantes deixam de ser analisados. Assim, não basta aos opositores terem maioria em teoria, eles precisam frequentar as sessões da comissão, o que nem sempre acontece.

CCJ tem diversos temas de interesse da direita na pauta

Além dos projetos que pretendem aumentar penas para quem pratica crimes hediondos, como homicídio, tráfico e outros, a pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) inclui temas como anistia para os manifestantes do 8 de janeiro de 2023 e diversos assuntos da chamada pauta de costumes, considerada prioritária pelos partidos de centro-direita e direita.

Outra pauta muito importante deve ser a limitação de decisões monocráticas por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), pois tem potencial para desafiar a concentração anormal de poder nas mãos do Judiciário. Mas essa Proposta de Emenda à Constituição (PEC) ainda precisa ser encaminhada à CCJ pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Portanto não depende apenas da oposição.

Ao ser eleita presidente da comissão, Caroline De Toni disse que, como deputada da direita, terá que pautar assuntos defendidos pela sociedade e que espera ver o Parlamento avançar em temas importantes, como liberdade de expressão, medidas contra as drogas e aborto, além de tantas outras que refletem os anseios da população no dia a dia.

Mas ela foi cautelosa ao dizer que irá discutir tudo com os coordenadores de bancada no colegiado, e avaliar o que de fato pode avançar na comissão. Isso significa que ela só deve pautar projetos importantes, como a anistia aos manifestantes de 8/1, quando tiver apoio suficiente para aprová-los.

Propostas que aumentam penas para crimes continuam em pauta

Mesmo sem a apreciação e discussão dos deputados até agora, os projetos do pacote anticrime continuam na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e poderão ser analisados ao longo das próximas sessões do colegiado

Um dos projetos, apresentado pelo deputado Kim Kataguiri (União-SP) aumenta para 25 anos a pena para reincidentes que praticarem crimes graves, acrescentando um artigo ao Código Penal.

Segundo o parlamentar disse à Gazeta do Povo, o projeto é baseado na legislação norte-americana chamada de "Three strikes", em que o criminoso que é condenado por algum crime grave pela terceira vez é submetido a uma pena mínima de 20 anos ou até à prisão perpétua.

Também está pronta para votação na CCJ da Câmara outra proposta, desta vez apresentada pela deputada Carla Zambelli (PL-SP), que aumenta a pena de estelionato em casos em que há exploração sexual ou a vítima é refugiada.

O estelionato é um crime contra o patrimônio, no qual uma pessoa obtém para si ou alguém uma vantagem ilícita, induzindo a vítima ao erro por meio de artifícios.

Na proposta em análise na CCJ, já com parecer pela admissibilidade e constitucionalidade, a pena será dobrada se o crime for cometido para fins de financiamento de exploração sexual, violência contra a mulher, crianças e adolescentes, ou tráfico de pessoas.

A deputada Carla Zambelli explicou que o objetivo do seu projeto é ampliar a proteção jurídica a pessoas em situação de vulnerabilidade que sejam vítimas de fraudes. Atualmente, a pena de estelionato também aumenta de 1/3 ao dobro se o crime é cometido contra idoso ou vulnerável.

Ainda no caso de crimes de estelionato, outro projeto em pauta na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) foi apresentado pelo deputado Pastor Gil (PL-MA). A proposta triplica a pena do crime de estelionato quando a vítima for criança, adolescente, idoso, pessoa com deficiência ou com baixo nível de escolaridade. A pena prevista no Código Penal para o crime hoje é de um a cinco anos de prisão.

Para o deputado, o objetivo é aplicar punição mais severa para o criminoso que “se aproveita da vulnerabilidade dessas vítimas para causar-lhes prejuízo financeiro, moral e emocional, desestimulando, assim, a prática”.

Todos os projetos do chamado “pacote anticrime” foram encaminhados pela Mesa Diretora da Câmara diretamente à CCJ, sem a necessidade de análise por outras comissões temáticas da Casa, de acordo com o que prevê o Regimento Interno da Câmara dos Deputados. Ou seja, se aprovadas, as propostas seguirão direto para apreciação do plenário da Câmara sem a necessidade de tramitar por outras comissões, como a de Segurança, por exemplo.

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