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A Polícia Federal investiga cinco pagamentos de R$ 300 mil feitos pelo empresário Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como Careca do INSS, à uma empresa de Roberta Luchsinger, amiga de Fábio Luís da Silva, filho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nos diálogos analisados pelos investigadores, o empresário afirma que o destinatário dos valores seria “o filho do rapaz”, sem especificar a quem se referia.
A conversa consta na decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça que autorizou a mais nova fase da Operação Sem Desconto, deflagrada nesta quinta-feira (18). Em uma das mensagens trocadas entre Roberta e Antunes, a empresária tenta tranquilizar o Careca do INSS dizendo: "na época do Fábio falaram de Friboi, de um monte de coisa o (sic) maior… igual agora com você".
Em 2015, Fábio Luís da Silva processou políticos por relacionarem, sem provas, seu nome à Friboi, empresa controlada pela J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista. O nome completo do filho de Lula não aparece na decisão e ele não é formalmente investigado.
O filho do presidente e Roberta são amigos, segundo afirmou em outubro à reportagem a defesa de Lulinha. A defesa de Roberta diz que ela "jamais teve qualquer relação com descontos do INSS".
Em 4 de dezembro, a CPMI do INSS tentou convocar Fábio para apurar o possível envolvimento dele no esquema, mas a base governistas conseguiu barrar o pedido. Após a nova fase da operação, parlamentares do Novo, que fazem parte da CPMI do INSS, apresentaram um novo pedido de convocação de Lulinha.
Segundo o relatório da PF mencionado na decisão, uma consultoria ligada ao Careca do INSS transferiu ao menos R$ 1,5 milhão à empresa de Roberta, herdeira de um banqueiro e pessoa próxima ao PT, em cinco repasses sucessivos de R$ 300 mil. Alvo de busca e apreensão, a empresária passou a usar tornozeleira eletrônica.
De acordo com a PF, Antunes orientou um funcionário a realizar os pagamentos à empresa de consultoria de Roberta, vinculando os valores a um terceiro identificado apenas como “o filho do rapaz”. A investigação aponta os pagamentos estavam identificados como “Projeto Energia”, “Projeto Esmagadoras” e “Projeto Hidrogênio”.
A autoridade policial ressaltou a incompatibilidade temporal dos pagamentos e a ausência de mensagens que comprovassem a efetiva prestação dos serviços.
Em outros trechos citados no relatório, referente a mensagens trocadas em 29 de abril de 2025, Roberta escreve ao empresário: “E só para vc saber, acharam um envelope com nome do nosso amigo no dia da busca e apreensão”. Na sequência, segundo a PF, Antunes responde demonstrando preocupação: “PUTZ”.
Ainda no mesmo dia, Roberta envia outra mensagem ao Careca do INSS com a orientação: “E Antônio [Careca do INSS], some com esses telefones. Joga fora”. Dias depois, em 5 de maio de 2025, ela encaminha outra mensagem ao empresário mencionado um nome Fábio relacionado à Friboi.
Para os investigadores, a menção a "Fábio" ilustra como os supostos líderes do esquema continuaram a se comunicar e a planejar a continuidade dos ilícitos mesmo após a deflagração da operação policial.
Em nota enviada ao jornal Estado de São Paulo, a defesa de Roberta Roberta Luchsinger disse que a empresária “jamais teve qualquer relação com descontos do INSS” e afirmou que ela foi procurada por Antunes para atuar na regulação de empresas de canabidiol.
“Cumpre esclarecer que os negócios se mantiveram apenas em tratativas iniciais e não chegaram a prosperar. Cumpre esclarecer, ainda, que mencionadas tratativas se deram em momento anterior às revelações dos desvios de descontos do INSS e da participação de Antônio Carlos Camilo Antunes nas investigações”, afirmou a defesa.
Além da monitoração eletrônica, a empresária está proibida de se ausentar do país, deve entregar o passaporte, não pode manter contato com outros investigados, ressalvados os vínculos familiares ou profissionais, e foi expressamente proibida de ter acesso a sedes empresariais, call centers ou escritórios das empresas investigadas na Operação Sem Desconto.
Relação com lobista levou Lulinha a ser citado nas investigações do INSS
As primeiras menções ao nome de Lulinha no âmbito das investigações surgiram a partir de sua relação com Roberta Luchsinger. O vínculo entre os dois apareceu nos relatórios da Polícia Federal no momento em que as investigações avançaram sobre o círculo de relações pessoais e profissionais de Antônio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS.
Antes da nova fase da Operação Sem Desconto, os investigadores já haviam notado contato entre os dois, o que levou parlamentares da CPMI do INSS a questionarem um possível envolvimento do filho de Lula.
No contexto do escândalo INSS, Roberta passou a ser citada por sua atuação junto à DuoSystem, empresa investigada por fornecer a infraestrutura tecnológica que permitia descontos em folha de aposentados e pensionistas. Documentos indicam que ela também atuou ao lado de Antunes em agendas de lobby no Ministério da Saúde, defendendo interesses empresariais distintos, mas frequentando os mesmos espaços institucionais.
Conversas apreendidas pela PF e contratos de consultoria firmados por Roberta com empresas ligadas ao Careca do INSS levantaram suspeitas sobre possível tráfico de influência — acusações que ela nega. Foi nesse contexto que encontros e contatos dela com Lulinha passaram a constar nos relatórios de investigação, sem que fosse atribuída participação direta do filho do presidente nas fraudes.
PF apura acusação sobre “mesada” feita por ex-assessor
Apesar de não constar na decisão de Mendonça, o ex-assessor do Careca do INSS, Edson Claro, alegou à Polícia Federal que teria recebido pagamentos mensais próximos de R$ 300 mil, descritos como uma espécie de “mesada”. A denúncia foi publicada originalmente pelo portal Poder360 com base em informações da testemunha à PF e que foram levadas aos integrantes da CPMI.
O montante total movimentado poderia alcançar R$ 25 milhões. Ainda segundo o depoimento, o filho do presidente Lula e o Careca do INSS, teriam realizado viagens juntos a Portugal — uma delas, segundo o depoente, teria sido um voo de Guarulhos a Lisboa, em novembro de 2024.
De acordo com os registros do voo Latam JJ–8148, publicados pelo portal Metrópoles, Antônio Camilo viajou na poltrona 3A, enquanto Lulinha ocupou o assento 6J — ambos localizados na primeira classe e posicionados na janela da aeronave.
Edson Claro também relatou à PF que os repasses estariam relacionados às atividades da World Cannabis, que tinha planos de atuação no mercado de cannabis medicinal, especialmente em Portugal.
Lulinha e JBS processaram políticos por boatos sobre Friboi
Em 2015, Lula e a JBS deram início a uma ofensiva jurídica conjunta para combater os boatos de que Fábio seria um sócio oculto da empresa. As insinuações estavam ligadas à participação do BNDES e da Caixa como sócias do grupo JBS, que detinham 34,6% da empresa à época, resultado da política industrial do governo petista para alavancar multinacionais brasileiras.
Lulinha apresentou três ações contra políticos que o acusaram publicamente. Uma delas foi contra o então prefeito de São Carlos, Paulo Altomani, que afirmou que o Tesouro Nacional financiava a "empresa Friboi, que pertence ao Lulinha". Outra ação foi contra o deputado federal Domingos Sávio, então filiado ao PSDB e hoje no PL, que alegou que o filho do presidente era "um dos homens mais ricos do Brasil" devido à "roubalheira".
Os advogados de Fábio negaram as acusações, afirmando que ele nunca foi “sócio ou manteve qualquer relação profissional” com negócios de agropecuária ou da agroindústria.
Na ocasião, os irmãos Batista realizaram uma campanha institucional destacando a história do pai e fundador da companhia, José Batista Sobrinho, conhecido como Zé Mineiro. A empresa utilizou links patrocinados no Google para que buscas por termos como “Lula Friboi” e “fazenda Lula” apresentem o vídeo como primeiro resultado.
Sem nomear Weverton, Mendonça diz que senador da República era "sustentáculo" do esquema
No despacho, Mendonça citou que um senador da República seria o “sustentáculo político” da operação criminosa. Apesar de não citar o parlamentar, o senador Weverton Rocha (PDT-MA) é avaliado como o possível congressista referido, já que ele também foi alvo da operação.
A investigação localizou um arquivo intitulado “Grupo Senador Weverton” e sugere que o parlamentar teria se beneficiado dos valores ilícitos por meio de interpostas pessoas.
A Polícia Federal chegou a pedir a prisão do senador, mas a Procuradoria-Geral da República (PGR), chefiada por Paulo Gonet, se manifestou contra o pedido.
O entendimento da PGR é de que, "até o momento, não se demonstrou vínculo direto entre o parlamentar e a execução das condutas ilícitas, nem recebimento de valores ilícitos."
O ex-assessor de Weverton, Gustavo Marques Gaspar, também foi alvo de busca e apreensão. A PF afirma ter encontrado planilhas de pagamento do Careca do INSS que atestavam o pagamento de R$ 100 mil em propinas para o ex-assessor, sob o apelido de “Gasparzinho”.
“Além da atuação político-institucional, as provas demonstram que Gustavo se relacionava intensamente com Rubens Costa, funcionário de Antônio Camilo, e seus diálogos diziam respeito a atos de constituição de uma empresa e, também, a perguntas sobre o contador Alexandre Caetano, que também está envolvido com as empresas de fachada de Antônio Camilo“, afirmou Mendonça.





