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Presidente Lula e presidente do PT, Gleisi Hoffmann durante as comemorações dos dos 43 anos de criação do PT
Presidente Lula e presidente do PT, Gleisi Hoffmann durante as comemorações dos dos 43 anos de criação do PT| Foto: Lula Marques/Agência Brasil

Uma ala do Partido dos Trabalhadores (PT) está insatisfeita com uma recente decisão da cúpula da legenda que suprimiu a necessidade de realização de prévias internas para escolha de candidatos petistas às prefeituras das cidades nas eleições de 2024. Segundo esse grupo, trata-se de "um golpe contra a democracia interna" do partido.

De acordo com a resolução, corroborada pelo diretório nacional em 16 de outubro, se dois terços dos diretórios municipais do PT aprovarem um candidato, não é mais preciso realizar as prévias. Ou seja, os poucos integrantes dos diretórios municipais agora têm o poder de escolha do nome do pré-candidato à prefeitura nas próximas eleições, sem precisar que seja feita votação entre todos os filiados.

Apesar das críticas e da controvérsia gerada internamente no partido, a nova diretriz se alinha com a visão estratégica do PT para as eleições municipais no próximo ano, e com as estaduais e federais em 2026, conforme avalia Luiz Filipe Freitas, cientista político e assessor legislativo da Malta Advogados.

“O que vale ter em mente é que o PT está atuando de uma forma bem mais racional nessa eleição, ainda que as estratégias possam parecer mais críticas para os filiados. Pela sua mentalidade, o partido já está vendo as eleições de 2026 e perante o ambiente muito polarizado no qual estamos vivendo, que foi o da eleição de 2022, essas eleições municipais vão ter um papel muito mais importante que as outras”, afirmou.

Críticas internas sobre decisões antidemocráticas da cúpula do partido

As novas regras geraram confusão internamente. Joaquim Soriano, secretário nacional de Assuntos Institucionais do PT, que entrou com o recurso vetado pelo Diretório Nacional, afirma que a medida é uma violência, uma afronta ao estatuto e, portanto, às origens do partido.

“Contraria o sentido fundante do partido (...) é um retrocesso que precisa ser evitado. Definimos prévias partidárias como a máxima democracia, onde todas e todos filiados votam diretamente para decidir quem os representará na disputa. Hoje, negar o estatuto que indica encontro partidário, e delegar a dois terços da direção municipal eleita em 2019 a definição em 2023 das candidaturas majoritárias e proporcionais em cada município é um gigantesco erro!”, afirmou em um artigo publicado em site da ala petista denominada Democracia Socialista.

As críticas de Soriano também encontram eco em outros petistas. Elói Pietá, ex-deputado do PT por São Paulo e ex-prefeito de Guarulhos, que pleiteava concorrer novamente ao cargo, foi preterido pelo diretório municipal. Em seu lugar, a escolha recaiu sobre o deputado federal Alencar Santana (PT-SP) como pré-candidato à prefeitura da cidade.

Pietá entrou com uma ação na justiça para que seja cumprido o estatuto que afirma ser “a lei interna, a constituição do partido”. Segundo o advogado responsável pela ação, Eder Toledo, “por uma direção da Executiva Nacional, o PT de Guarulhos decidiu que, por maioria do diretório, poderia escolher [o candidato à prefeitura] suprimindo o voto, a escolha, o direito de escolher de 25 mil filiados”.

Constituição prevê que partidos decidam como definir candidatos

Diante da controvérsia, o cientista político e advogado Valdir Pucci explica que a Constituição Federal prevê que os partidos são livres para decidir suas regras internas, incluindo a eleição de candidatos e pré-candidatos.

“A própria Constituição Federal, no seu artigo 17, diz que o partido tem autonomia para decidir todas as suas questões internas começando pelo seu estatuto e, a partir dele, qualquer outra regra presente neste estatuto, como, por exemplo, o processo de escolha dos candidatos. Esse fato, essa autonomia constitucional também é corroborado pela lei dos partidos políticos”.

Pucci ainda disse que os candidatos só são realmente definidos após as convenções nacionais dos partidos, que são realizadas, segundo o Tribunal Superior Eleitoral, entre os dias 20 de julho e 5 de agosto do ano eleitoral.

Caso a Justiça determine que a escolha de algum candidato foi indevida, por violar o estatuto do partido, por exemplo, até a realização da convenção, ainda é possível realizar mudanças nas pré-candidaturas. Depois que as convenções ocorrem, é incomum que haja qualquer ação contrária aos indicados.

No caso do PT, Pucci acredita que é muito improvável que as ações contrárias à pré-candidaturas, como a de Pietá, se mantenham. “Depois que há a escolha do candidato oficial e que a campanha está na rua, os ânimos internos no PT tendem a se acalmar. O objetivo é alcançar a vitória eleitoral, então, ações contrárias à escolha de determinados candidatos, por exemplo, tendem a ser retiradas”, disse.

Nova regra busca evitar desgastes e assegurar estratégia de longo prazo

Pucci ainda disse que, tradicionalmente, o PT é muito confuso nessa fase pré-eleitoral, quando são decididos os candidatos. “Sempre tem uma questão, uma briga interna, eles sempre têm os grupos dentro do partido que não apoiam o candidato selecionado. Então esse movimento que acontece agora não é uma novidade dentro do PT, faz parte do processo decisório do partido”, afirmou Pucci.

Assim, diante do tradicional desgaste pré-candidatura que o partido sofre pelas disputas internas e da visão pragmática e estratégica para 2024 e 2026, a lógica da cúpula petista foi suprimir as prévias.

A definição das pré-candidaturas pelos diretórios seria mais efetiva para estabelecer um clima de consenso e, desta forma, tentar alcançar a máxima eficiência nos próximos pleitos. Além disso, o processo mais enxuto e ágil garante que a boa parte das pré-candidaturas seja definida até 30 de novembro deste ano, ampliando a margem para trabalhar as candidaturas e alianças até a Convenção Nacional.

“Ficamos também com a posição de que vamos evitar ao máximo a realização de prévias, porque elas representam um momento de mobilização do partido, mas também representam um momento de muitos conflitos. Então, estamos tentando trabalhar a ideia de construir consensos”, afirmou o senador Humberto Costa (PT-PE) em entrevista à revista Veja.

A deputada e presidente do PT, Gleisi Hoffmann apresentou argumentos semelhantes aos de Costa, ao dizer que as mudanças buscam solucionar impasses políticos. "O objetivo da resolução é estimular a construção de consensos e maiorias internas na indicação de candidaturas, de forma a concentrar as energias na disputa contra os adversários eleitorais em 2024", disse ao jornal Folha de S. Paulo.

PT quer se recompor após "fundo do poço" em 2020

Para levar adiante a estratégia de médio e longo prazo, foi reativado o Grupo de Trabalho Eleitoral (GTE), que, sob o comando de Costa, quer fazer com que o PT volte aos “tempos de glória” e reverta as sucessivas perdas nas últimas duas eleições municipais.

Em 2020, o partido não elegeu prefeitos em nenhuma das capitais brasileiras e terminou as eleições com 183 prefeituras em todo o país, o menor número em 16 anos – resultado que o senador classificou como o "fundo do poço" do partido numa eleição.

Uma das frentes para buscar associações com outros partidos é a Federação Brasil da Esperança, que o PT integra conjuntamente ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Verde (PV), e que seria responsável pela decisão final sobre o nome dos pré-candidatos às prefeituras.

A federação tem sido usada para embasar as novas diretrizes para escolha de pré-candidatos, embora críticos como Elói e Soriano discordem de sua influência. Eles defendem que a negociação política na federação ocorre depois da escolha do pré-candidato por cada legenda e que, por essa razão, não justifica a violação das regras do estatuto.

Mesmo com a federação e a possibilidade de apoio a candidatos de outros partidos, o PT não abre mão de ser o centro político das coalizões. “Há municípios onde iremos apoiar outros partidos, mas na condição de o PT exercer o protagonismo, formando a chapa”, afirmou Costa.

“É um planejamento de médio a longo prazo, não só de poder, mas também de tentar implodir o apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro. É difícil, porque Bolsonaro tem sua base”, disse Luiz Filipe Freitas. O cientista político destacou que atualmente o PT reconhece a força eleitoral do ex-presidente, o que talvez não reconhecesse há quatro anos. “O partido entende essa mobilização e, por isso, vai tentar trabalhar principalmente nos estados do Sul e Sudeste, onde a expressão de votação de Bolsonaro foi muito forte”.

As declarações de Costa vão ao encontro das análises de Freitas. “A meta que nós temos é ter um resultado muito melhor do que o que tivemos em 2020, que podemos dizer que foi o fundo do poço. (...) Tanto é que nosso objetivo, claro, é ganhar várias prefeituras”, afirmou o senador.

"Em muitos lugares, ainda que a gente não ganhe, temos certeza que teremos um bom desempenho dos nossos candidatos. O que significa uma renovação de figuras de representatividade institucional do partido, futuros nomes para disputas na própria Câmara dos Deputados”, disse.

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