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Lula e Alexandre de Moraes durante a diplomação no TSE, em dezembro
Lula e Alexandre de Moraes durante a diplomação no TSE, em dezembro| Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE

O PT quer aproveitar a comoção causada pelas invasões às sedes dos três Poderes para acelerar ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para tornar inelegível o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Estrategistas políticos do partido consideram que é o momento ideal para tirar de vez o ex-chefe do Executivo da disputa eleitoral de 2026, por vários motivos: a emergência de novas “provas” de que ele supostamente cogitava ou incitava uma ruptura no regime democrático; uma composição hostil do TSE em relação a Bolsonaro, e que não durará por muito tempo; e uma conjuntura política ainda razoavelmente favorável ao novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Lula falou sobre essa possibilidade, nesta quarta-feira (18), e disse que precisa ser investigada a possibilidade de o ex-chefe do Executivo ter algum tipo de participação nos atos. E, se isso eventualmente for comprovado, ele defendeu que haja punição e até que Bolsonaro fique inelegível.

Uma demonstração recente de que há oportunidade aberta para isso foi dada na última segunda (16), quando o ministro Benedito Gonçalves, relator das ações de inelegibilidade no TSE, acolheu um pedido do PDT para incluir numa delas, como prova, a minuta de um decreto, apreendido na casa do ex-ministro de Justiça Anderson Torres, no qual Bolsonaro decretaria, enquanto presidente, estado de defesa no TSE para o “pronto restabelecimento da lisura e correção do processo eleitoral de 2022” – um esboço de uma intervenção na Corte para anular a eleição em que foi derrotado.

Na decisão, Gonçalves ainda pediu ao ministro Alexandre de Moraes – que determinou a prisão de Torres e a busca em sua casa, no âmbito da investigação sobre os atos de vandalismo em Brasília – “outros documentos e informações resultantes da busca e apreensão que digam respeito ao processo eleitoral de 2022, em especial voltados para a deslegitimação dos resultados”. Na prática, a ação para tornar Bolsonaro inelegível poderá ser abastecida com provas colhidas por determinação de Moraes, que se mantém no comando do TSE.

Embora essa decisão tenha sido proferida no âmbito de uma ação mais antiga do PDT, um partido aliado e integrante do governo, os advogados do PT ainda vão aguardar o surgimento de mais elementos nas investigações conduzidas por Moraes para alimentar suas ações com “provas ainda mais robustas”, na expressão de um deles, que pediu para não ser identificado. A equipe jurídica entende que ainda poderão aparecer indícios mais fortes de que Bolsonaro pretendia dar um golpe, inclusive com ajuda de auxiliares diretos, como alguns militares.

O PT tem uma ação própria, e semelhante à do PDT, que acusa Bolsonaro de abuso de poder político por questionar a integridade das urnas eletrônicas. Para o partido, seria uma atitude deliberada para mobilizar sua base de apoiadores para deslegitimar o processo eleitoral e, assim, dar base e certo apoio popular a uma virada de mesa.

É uma tese que, provavelmente, encontra receptividade, hoje, entre a maioria dos ministros do TSE, no grupo formado por Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Benedito Gonçalves – durante a campanha, os quatro quase sempre votavam de forma consensual e dura para remover propagandas de Bolsonaro que consideravam enganosas, ao ponto de proibi-lo de chamar Lula de ladrão e corrupto, por exemplo.

O interesse em apressar o andamento das ações, e nos próximos meses, se dá porque haverá dois desfalques nesse quarteto: em maio, Lewandowski se aposenta e dá lugar a Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro e que se mantém fiel a ele; e em novembro, Benedito Gonçalves termina seu mandato no TSE e será substituído, como corregedor e relator das ações, pelo ministro Raul Araújo, que já deu mostras de ser mais favorável a Bolsonaro.

Foi dele, por exemplo, a decisão dada meses antes da campanha que proibiu artistas de expressarem apoio a Lula no festival de música Lollapalooza, em março de 2022. Em dezembro, após a eleição, Araújo votou contra a multa de R$ 22,9 milhões aplicada por Moraes ao PL, partido de Bolsonaro, em decorrência da ação para tentar invalidar a maior parte dos votos no segundo turno, acusando mau funcionamento das urnas eletrônicas.

Gonçalves, ao contrário, já tem demonstrado bastante abertura aos pedidos do PT e do PDT contra Bolsonaro. Ainda durante a campanha, concedeu várias liminares para impedir Bolsonaro de usar imagens do 7 de Setembro e de viagens internacionais a Londres e Nova York na campanha. O ministro vetou até mesmo a realização de “lives” no Palácio da Alvorada.

Após a eleição, ele despachou em 12 das 15 ações de investigação judicial eleitoral (Aijes) que ainda tramitam no TSE para tornar Bolsonaro inelegível. Esse tipo de ação costuma andar devagar e demora, em média, mais de dois anos para tramitar. Na maioria dos despachos, Gonçalves intimou PT, PDT e outros partidos que buscam a inelegibilidade de Bolsonaro a rebaterem as contestações do ex-presidente às acusações nos processos, de suposto abuso de poder político ou uso indevido dos meios de comunicação na campanha.

Por fim, dirigentes petistas acreditam que o momento é mais favorável para condenar Bolsonaro porque seu desgaste é recente e também devido ao fato de o novo governo ainda gozar de maior popularidade, ativo que pode se dissipar ao longo do mandato de Lula. Uma conjuntura desfavorável à imagem do presidente, caso se concretize no futuro, tira o foco de Bolsonaro, e concentra as atenções do mundo político e jurídico sobre a própria administração petista.

Defesa de Bolsonaro

A reportagem procurou a defesa de Bolsonaro para se manifestar sobre a estratégia do PT para torna-lo inelegível, mas não obteve resposta. Nos processos, os advogados do ex-presidente têm se esforçado para rebater as acusações. Ainda não houve manifestação na ação do PT relacionada aos questionamentos contra as urnas, mas a equipe jurídica já contestou imputações semelhantes, de abuso, feitas pelo PDT, pelo mesmo motivo.

Nesta ação, a defesa argumentou que o questionamento de Bolsonaro sobre as urnas ocorreu em julho, antes da campanha, durante uma reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada. Os advogados afirmaram que não era um ato de campanha, até porque foi dirigido a estrangeiros, mas sim de governo. O evento constava na agenda oficial do presidente, e houve até convite para o então presidente do TSE, Edson Fachin, para participar. Segundo eles, era uma iniciativa de “diálogo institucional” sobre “tema de interesse público”.

Para reforçar sua defesa, Bolsonaro indicou como testemunhas, para depor em seu favor, os ex-ministros Carlos França (Relações Exteriores) e Ciro Nogueira (Casa Civil), além do ex-secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência Flávio Rocha e de seu ex-assessor-chefe João Henrique Nascimento de Freitas. Todos devem comparecer ao TSE para depor no próximo dia 8 de fevereiro.

Já na ação do PT relacionada às urnas, a defesa ainda não se manifestou porque Gonçalves aditou a ação para incluir nela duas reportagens. Uma delas informou que o presidente do Partido Liberal, Valdemar da Costa Neto, pediu ao ex-ministro da Justiça Anderson Torres que a Polícia Federal investigasse os institutos de pesquisas eleitorais. Outra revelou que Fernando Cerimedo, um argentino que mencionou em vídeos supostas fraudes nas urnas eletrônicas brasileiras, teria ligação com a empresa Gaio.io, que também colaborou com a equipe de auditoria do PL que apontou mau funcionamento das urnas. São outros elementos que Bolsonaro terá de rebater para se livrar de uma condenação.

Fora essas ações ligadas às urnas e de maior apelo entre os ministros, o ex-presidente ainda deverá lidar com acusações de uso da máquina para benefício eleitoral – no 7 de setembro, em viagens internacionais, no uso dos palácios – e também na acusação do PT de supostamente orquestrar um “ecossistema de desinformação” para atacar Lula na campanha.

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