
Eu sei lá por que pensei no Brasil atual ao ler esse conto macabro de Edgar Allan Poe. Só sei que todo cuidado com a Morte Vermelha é pouco. Eis o trecho de abertura e o de conclusão:
Havia muito tempo que a “Morte Escarlate” devastava todo o país. Jamais uma peste fora tão letal e tão terrível. O sangue era a sua encarnação e o seu sinal: o vermelho e o horror do sangue. Começava com dores agudas, com um desvanecimento súbito, e logo os poros se punham a sangrar abundantemente. Sobrevinha, então, a decomposição. Manchas escarlates no corpo e, notadamente, no rosto da vítima, segregavam-na da humanidade e a afastavam de todo socorro e de toda compaixão. O contágio, o progresso e o fim da enfermidade consumiam apenas meia hora.
[…]
Ecoou um grito agudo e o punhal caiu, como um relâmpago, sobre o tapete fúnebre, onde o Príncipe o Príncipe Próspero tombou morto, instantaneamente. Então, invocando a frenética coragem do desespero, a multidão de mascarados precipitou-se à sala negra, e, agarrando-se ao desconhecido, que se mantinha imóvel e ereto como uma grande estátua à sombra do carrilhão, viu-se presa de um terror inominável, ao perceber que não havia forma tangível alguma sob a mortalha e sob a máscara cadavérica. Todos reconheceram, então, que ali estava presente a “Morte Escarlate”. Ela se insinuara como um ladrão noturno.
E todos os convivas tombaram, um a um, nos salões das orgias, manchados de sangue, morrendo na mesma postura desesperada com a qual desabaram.
E a vida do relógio de ébano se extinguiu com a do último daqueles seres licenciosos. E murcharam as chamas das trípodas. E as Trevas, e a Ruína e a “Morte Escarlate” deitaram sobre tudo o seu ilimitado domínio.
Sinistro, não? Será que ele estava antecipando o Ebola ou o bolivarianismo?
Rodrigo Constantino



