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Estado e capitalismo ou capitalismo de estado?

Um artigo do economista Marcello Averbug, publicado hoje no GLOBO (bem ao lado do meu), defende a tese de que o capitalismo precisa de bastante presença estatal, e que os liberais, com a defesa do estado mínimo, acabam jogando contra o próprio capitalismo. Pior: afirma que fazem isso pois são abastados, e não precisam da ajuda estatal.

Para o autor, após a queda do socialismo, uma nova disputa feroz surgiu em cena, entre esses liberais radicais e os que defendem maior presença estatal na economia e na vida dos cidadãos. O que faltou dizer, em minha opinião, é que o segundo grupo, majoritário e no poder (inclusive nos Estados Unidos), muitas vezes é formado pelas viúvas do socialismo, ou seja, gente que encontrou refúgio para continuar atacando o capitalismo e enaltecendo a concentração de poder no estado.

O economista pensa que são esses liberais ortodoxos, ao contrário, que ameaçam o capitalismo. Diz ele:

Ironicamente, a experiência histórica demonstra que os maiores algozes do capitalismo são os seus defensores extremados, alérgicos à influência governamental nos destinos de uma nação, inclusive sob um cenário democrático. Eles recusam-se a admitir que expressiva parcela dos desafios presentes em vários cantos do mundo não será vencida apenas através de iniciativas individuais espontâneas.

Mesmo? E onde foram vencidas com paternalismo e assistencialismo? Que experiência é essa, histórica, que demonstra que os maiores algozes do capitalismo são os liberais clássicos, defensores do estado mínimo? Onde isso ocorreu, ou seja, o fracasso capitalismo como fruto do estado mínimo? Espero que o economista não cite a Crise de 1929, pois seria fruto do desconhecimento histórico.

Não, os verdadeiros algozes do capitalismo são aqueles defensores do capitalismo de estado. Luigi Zingales e Raghuram Rajam escreveram um ótimo livro sobre isso, mostrando justamente como é preciso tomar cuidado com certos “capitalistas” que adoram a mão visível do estado. Trata-se de Salvando o capitalismo dos capitalistas, leitura imperdível.

No trecho seguinte, o economista oferece uma resumida ideia do que seria essa intervenção saudável do estado, por ele defendida: 

A evolução positiva do sistema capitalista requer o engajamento democrático da sociedade, via atuação governamental, no sentido de desobstruir entraves ao desenvolvimento econômico e social. Isso não significa resvalar para intervencionismo, estatização da economia, crescimento abusivo da carga tributária ou agigantamento da burocracia oficial, mas sim usar com eficácia os instrumentos de políticas públicas para atingir objetivos inacessíveis às leis de oferta e procura. E assumindo como pontos de referência o incentivo à competitividade, à inovação, ao empreendedorismo privado e à equidade social.

Na teoria até que não fica mal. Mas e na prática? Não é preciso uma carga tributária abusiva? E quanto é necessário para cumprir tais funções? Pois em tudo que é país europeu, por exemplo, a carga já beira os 50% do PIB! Será que o estado precisa de mais um pouco? Nos Estados Unidos mesmo, a carga já passa de 30% e é crescente. Não basta? Não é o suficiente? Os liberais estão errados de reclamar de tantos impostos?

Como seria, na prática, usar esses instrumentos de políticas públicas? O “food stamp” americano não é um fracasso? Os programas de assistencialismo realmente funcionam? Quais? Onde? Não vai citar o Bolsa Família, vai? Um programa sem porta de saída, usado para terrorismo eleitoral, que celebra cada vez mais dependente de esmolas estatais não pode ser um caso de sucesso que o autor tenha em mente.

Equidade social? O que é isso exatamente? Como chegar lá? Se tivermos liberdade econômica com meritocracia, não parece evidente que teremos desigualdade social e material, pois, felizmente, os seres humanos são diferentes, em suas habilidades, vocações, dons, capacidade e disposição de trabalho, sorte etc?

São questões que o economista lança no ar, mas ficam com o aspecto de demagogia, discurso bonito, mas vazio, desprovido de lógica. Em sua conclusão isso salta mais aos olhos, quando ele apela para uma das características mais marcantes da esquerda caviar, apontada em meu livro: a tentativa de monopolizar as virtudes, os fins nobres:

Não é coincidência o fato de os mais fervorosos pregadores do governo mínimo se encontrarem entre os grupos mais bem posicionados para usufruir os benefícios proporcionados pelo mercado. Eles ignoram aqueles com escassas oportunidades de se situarem de forma satisfatória nessa arena inerente ao capitalismo.

Reparem que ele julga as intenções, não os argumentos. Os liberais são liberais porque são ricos! E ainda por cima insensíveis. Resta só explicar porque tanto liberal tem situação financeira humilde, enquanto tanto ricaço prega justamente o intervencionismo estatal maior…

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