
Mano BrownJá citei aqui algumas vezes o ótimo livro The Victims’ Revolution, de Bruce Bawer, sobre os estudos de identidade de “minorias” que tomaram conta das universidades americanas. O fenômeno é mundial, e consiste em sempre pintar as tais “minorias” como vítimas oprimidas dos malditos opressores. E quem seriam estes? Ora, o homem branco ocidental, claro!
Essa mentalidade percolou pelo mundo todo e em todos os campos. Basta pertencer a um desses grupos de “minorias” para se obter o status de vítima, e todos conhecem o poder das vítimas. Elas podem tudo, não precisam seguir as mesmas regras e leis, pois estão acima dos demais, dos reles mortais. São os “coitadinhos” que já pagaram o preço apenas por serem “minoria”, e agora estão liberados para fazer o que bem entenderem e obter privilégios estatais. Foram perdoados ex ante.
Claro que A pedagogia do oprimido, de Paulo Freire, não ficaria de fora das análises de Bawer. Para ele, o livro não passa de um monte de slogans marxistas que nada dizem efetivamente sobre ensino. De fato, Freire rejeita a educação convencional, vista como um processo de “narrativa” e uma “prática de domínio” em que os alunos são obrigados a “memorizar mecanicamente o conteúdo narrado” e são encorajados a pensar de forma “individual” e não como “membros de uma classe oprimida”.
“O que Freire tem a oferecer”, diz o autor, “é um programa não de educação, mas de doutrinação em nome da ‘libertação’ revolucionária”. Até mesmo a violência e o terror são defendidos ao serem redefinidos: a “opressão” das elites por meio deste método convencional é violência e terror; enquanto a “resistência dos oprimidos”, ainda que de maneira sangrenta, não consistiria em violência ou terror, pois a violência é sempre iniciada por aqueles que oprimem.
Com esse tipo de contorcionismo conceitual, Freire conseguiu defender tiranos como Fidel Castro e Mao, e psicopatas como Che Guevara, tudo em nome da justiça e da “libertação dos oprimidos”. Esta seria a “revolução cultural” obtida por meio de sua pedagogia do oprimido. Deu no que deu. Seu efeito nefasto não ficou limitado “apenas” à educação brasileira, da qual Freire é o patrono oficial.
Pensei nisso ao ver a notícia de que o cantor Mano Brown, do Racionais MC, foi preso por desacato numa blitz, além de estar sem os documentos do carro e com a habilitação vencida. O rapper, que já teria ameaçado o músico Lobão, tentou furar o bloqueio da polícia e acabou preso. Não foi seu primeiro episódio de desacato a policiais.
Se fosse você, leitor branco e sem conexões políticas, dificilmente seria solto. Seus atos seriam suficientes para umas boas noites no xilindró. Mas Mano Brown é, afinal de contas, “brown”, membro das “minorias oprimidas”, apesar de ser rico e amigo de poderosos petistas no governo. E amigos fiéis, como o ex-senador Suplicy, aquele que sempre aparece para defender os criminosos, nunca suas vítimas.
Suplicy, hoje secretário de Direitos Humanos da cidade de São Paulo, manifestou-se na manhã desta terça-feira sobre o episódio. Claro, pintou Mano Brown como uma pobre vítima, que estava apenas indo comprar remédio para sua mãe e acabou agredido gratuitamente por policiais, esses “fascistas” que representam o “sistema” da “elite opressora”.
“Maior respeito e civilidade especialmente aos negros se faz necessário. O fato de o exame de saúde da carteira de habilitação estar vencido não justificava aquele procedimento”, disse Suplicy, que já cantou músicas do rapper no Senado (há dúvidas se sua derrota na eleição foi melhor para os ouvidos dos demais senadores ou para as leis do país). E lá está a senha paulo-freireana: essa elite branca opressora precisa respeitar mais as minorias dos negros oprimidos.
Esquece-se a igualdade perante as leis, o fato de que o negro em questão é rico e poderoso, que sua cor não lhe dá o direito de reagir com desacato aos policiais que fazem cumprir as leis, que os documentos são necessários para todos, independentemente da cor da pele. Basta usar o código dos oprimidos: um negro foi abordado pela polícia, logo, só pode ser uma vítima, e se reagir, mesmo com violência, a violência verdadeira partiu sempre da polícia, pois representa o sistema opressor dos brancos. É lamentável…
Rodrigo Constantino



