• Carregando...
Trecho de 25,7 quilômetros da LMG-740, em Lagoa Grande, Noroeste de Minas
Trecho de 25,7 quilômetros da LMG-740, em Lagoa Grande, Noroeste de Minas| Foto: Divulgação/DER-MG

Quem viaja pelo país sabe que a qualidade e a conservação das estradas variam muito. Recentemente, essa discussão ganhou destaque nas redes sociais após um vídeo ter sido publicado em perfil que mostrava a diferença na conservação de uma mesma estrada, em território paulista e após cruzar a divisa para Minas Gerais.

A queixa de quem depende das estradas é frequente e a comparação é inevitável. Natália Sega, gerente de vendas que atua no setor agropecuário há 12 anos, trocou recentemente de empresa, passando a atender apenas o estado de São Paulo, e as estradas ruins pesaram na decisão dela. “Eu estava bem cansada de dirigir em Minas, comecei a ter problemas no joelho, e quando surgiu essa vaga, isso foi um ponto que pesou, sim”, disse ela.

Natália conta que já teve problemas com buracos danificando pneus na BR-385, e comentou que, nas últimas vezes que precisou ir até Governador Valadares, optou por não transitar pela BR-381, que liga Belo Horizonte ao leste de Minas, pela qualidade da via. “As últimas vezes que eu passei, preferi pegar avião. São 30 minutos (de voo) e de carro, se não me engano, são cinco horas".

Os dados mostram que não se trata de um caso isolado. De acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT), enquanto o estado de São Paulo tem apenas 2% das rodovias consideradas em condições ruins ou péssimas, em Minas Gerais esse número sobe para 36,3%. Em quilômetros, enquanto Minas tem 5.544 de estradas ruins ou péssimas, em São Paulo esse número é de apenas 211.

Buracos, falta de manutenção e sinalização estão na lista dos principais problemas das rodovias de Minas. Apesar da diferença de qualidade das rodovias ser nítida, há diversas justificativas históricas e econômicas para as estradas mineiras terem chegado a esta situação.

Segundo o economista e doutor em Transportes pela Universidade de Brasília (UnB) Adriano Paranaíba, a comparação é injusta. “As demandas das estradas em Minas e em São Paulo são muito diferentes. Em Minas, o uso é muito maior por veículos pesados, que atendem as demandas do agronegócio. São Paulo tem um perfil mais industrial”, evidencia ele.

O economista salienta que essa diferença no tipo de carga tem impacto no desgaste das estradas, afinal, caminhões mais pesados trafegando com frequência ocasionam muito mais buracos que caminhões menores e mais leves, que transportem peças ou produtos, como acontece mais usualmente no estado vizinho.

Outro ponto muito relevante é o tempo de concessão das vias. Em São Paulo, as privatizações têm mais de 30 anos, enquanto em Minhas Gerais esse modelo começou a ser implementado na última década. “É claro que uma rodovia privatizada há mais tempo tende a ser melhor que uma mais recente, pois já houve tempo para recuperar o investimento inicial e fomentar outras melhorias”, completa Paranaíba.

As falas do economista corroboram algumas das justificativas do Governo de Minas para a atual situação das estradas. Segundo informações da Secretaria de Estado de Comunicação de Minas Gerais, a precariedade das rodovias tem raízes tanto no baixo investimento realizado em gestões anteriores quanto nas poucas concessões realizadas. O estado tem a maior malha rodoviária do país e a maioria das vias é responsabilidade exclusiva do poder público.

No início do primeiro mandato do atual governador, Romeu Zema (Novo), o foco em resolver os problemas deixados pela crise fiscal era emergencial. Minas tinha salários de servidores e repasses para prefeituras atrasados. Passada essa fase, foi possível direcionar esforços para a infraestrutura. As chuvas intensas em 2022 teriam piorado muito a situação, que já não era boa.

Em março do último ano foi anunciado o Provias, que tem o objetivo de recuperar, só na primeira fase, 1.550 quilômetros. Em abril, o governo mineiro comemorava as primeiras entregas: 350 quilômetros de rodovias recuperados. Estão em andamento 38 obras, além de outras 15 prontas para iniciar e outras aguardando licitação.

A assessoria também comentou que o governo tem voltado esforços para fazer mais concessões de trechos de rodovias mineiras. Em novembro do último ano, foram assinados os contratos de concessão de trechos na região do Triângulo Mineiro e Sul de Minas (lotes 1 e 2 do Programa de Concessões Rodoviárias). Em maio, foi realizado o leilão do terceiro lote, referente ao trecho entre São Sebastião do Paraíso e Três Corações. Ainda há previsão para concessão de mais dois lotes, nos próximos meses. O Programa de Concessões prevê a remodelagem de aproximadamente 2,5 mil quilômetros de estradas, que atendem cerca de 5 milhões de pessoas no estado.

Mas e os trens?

“Mineiro não perde o trem!” é expressão comum em Minas. Mas hoje isso acontece mesmo pela falta de trens. As estradas de ferro que forjaram o estado por séculos foram esquecidas durante anos. E, a exemplo de outros países, poderia ser a solução para desafogar as estradas mineiras das cargas pesadas que transportam.

A assessoria do Executivo estadual é esperançosa e diz que, a partir da articulação com o governo federal, a malha ferroviária do estado pode ser ampliada. Informaram, inclusive, sobre a obra de reconstrução da Ferrovia Minas-Bahia, ligando Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, a Caravelas, no Sul da Bahia, o que pode ser um ponto de virada para uma região extremamente vulnerável economicamente. Histórica, essa ferrovia ganhou notoriedade na música “Ponta de Areia”, de Milton Nascimento, e agora servirá para escoar a produção de lítio. O projeto prevê investimento de R$ 12 bilhões.

O avanço das ferrovias seria um alívio para as estradas, já que a produção do agronegócio e da mineração, dois ativos fortes de Minas, poderia ser transportada em trens. Adriano Paranaíba gosta do modelo, mas não acredita que será rápido, justamente pela dependência do Governo Federal para o avanço desses projetos. Ele menciona, ainda, que uma alternativa importante seria trazer para o país o conceito das short lines, que são “microferrovias privadas, que se ligam a linhas estatais”, cujo foco é o escoamento de produção das fazendas. “Seria possível, por exemplo, diminuir muito a quantidade de bitrens que transportam cana-de-açúcar, com essa solução”, explica. E isso, certamente, impactaria na qualidade das rodovias e no custo de manutenção.

Minas Gerais tem mais de 270 mil quilômetros de rodovias e, desse total, 22.286 mil são estaduais. A capital, Belo Horizonte, fica no entroncamento de rodovias que ligam a capital aos principais centros urbanos do país, como a Fernão Dias (BR-381) que liga a capital a São Paulo, e a BR-040, que leva a Brasília e ao Rio de Janeiro.

Porém, a via que liga a região metropolitana à segunda maior cidade do estado, Uberlândia, no Triângulo Mineiro, ainda não foi completamente duplicada. Para os trechos que são de competência exclusiva do estado, a previsão é que tanto os projetos de reforma quanto os blocos de concessões sejam entregues até o fim de 2026.


0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]