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Com mais de 75% das mercadorias brasileiras transportadas por rodovias, o roubo de cargas virou uma “taxa extra” paga por empresas e consumidores. Em 2024, os criminosos desviaram R$ 1,2 bilhão em produtos, segundo levantamento da ICTS Security, empresa especializada em consultoria e gestão de segurança.
O Brasil é o segundo país do mundo em número de ocorrências, atrás apenas do México, segundo a Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística). Dados do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp) registraram 3.749 roubos de cargas nos primeiros seis meses do ano passado, média de 27 por dia.
A região Sudeste concentra 83,6% das perdas financeiras com o crime. O estado de São Paulo responde por 47,2% do total, seguido por Rio de Janeiro (18,7%) e Minas Gerais (14,2%), conforme dados da ICTS Security.
Apesar do peso do Sudeste, o Mapa da Segurança Pública deste ano mostrou que todas as regiões tiveram redução nos roubos de carga entre 2023 e 2024. O Sul apresentou a maior queda (63,89%), seguido por Centro-Oeste (41,79%), Norte (22,22%) e Nordeste (11,79%).
Criminosos intensificam ataques a cargas no fim do ano
Especialistas alertam, porém, que a sazonalidade ainda impulsiona o roubo de cargas. Em novembo e dezembro de 2024, meses marcado por vendas aquecidas pela Black Friday, em novembro, e pelo Natal, houve alta de mais de 20% nos roubos.
“É um período com mais caminhões circulando, mais mercadorias de valor em trânsito e, consequentemente, mais atratividade para quadrilhas especializadas”, explicou à Gazeta do Povo Anderson Hoelbriegel, diretor de negócios da ICTS Security. Segundo ele, a pressão por entregas rápidas muitas vezes leva empresas a priorizar a velocidade em detrimento de protocolos de segurança.
"Isso abre brechas exploradas por facções criminosas que atuam no roubo de cargas". Hoelbriegel observou que a facção criminosa Comando Vermelho atua de forma mais violenta, com assaltos em estradas. Enquanto isso, o PCC (Primeiro Comando da Capital) se infiltra em centros de distribuição, alicia motoristas e utiliza informações internas para planejar ataques.

Com relação aos objetos do crime, as quadrilhas têm se tornado mais seletivas. Alimentos e bebidas lideram os roubos (21%), seguidos por cigarros (18%), eletroeletrônicos (16%), medicamentos (14%) e cosméticos (12%).
Os ataques ocorrem principalmente durante entregas (2.282 registros em 2024) ou interceptações em movimento (1.508). Cerca de um terço das ocorrências se concentra na madrugada, quando há grande fluxo de caminhões, mas a vigilância é menor.
São Paulo aposta em tecnologia e inteligência para combater roubo de cargas
Apesar do cenário crítico, São Paulo registrou no último ano o menor número de roubos de carga em 20 anos. Foram 4,7 mil casos, contra 6,2 mil em 2004. Entre janeiro e julho de 2025, a queda foi de 26,5% em todo o estado e de 41,4% na Baixada Santista.
Os dados são da Secretaria da Segurança Pública do estado, que evidencia como ponto positivo as ações integradas entre forças policiais e setor privado. O "ProCarga", grupo de inteligência que reúne diversos órgãos, elabora mapas de risco e estratégias conjuntas. Já o sistema "SP Carga auxilia" transportadores na prevenção.
A Divisão de Investigações sobre Furtos, Roubos e Receptações de Veículos e Cargas (Divecar), da Polícia Civil de São Paulo, prendeu 61 infratores entre janeiro e agosto deste ano e concluiu 86 investigações.
Falta de integração e de lei clara dificultam combate ao roubo de cargas
O Brasil tem mais de 3,5 milhões de caminhões e uma malha de 1,7 milhão de quilômetros de rodovias. Para a NTC&Logística, a falta de uma definição legal clara de “roubo de carga” e a ausência de integração entre bancos de dados das forças de segurança dificultam o combate a essa modalidade criminosa.
O órgão recomenda medidas como a criação de um cadastro nacional unificado, integração de informações e monitoramento constante. Só assim acredita que será possível reduzir o peso dessa “taxa extra” imposta pelo crime ao transporte e, em última instância, ao consumidor.
O governo federal atua no combate ao roubo de cargas por meio do Comitê Gestor da Política Nacional de Repressão ao Furto e Roubo de Veículos e Cargas. Criada pela Lei Complementar 121/06, a proposta é alinhada ao Sistema Único de Segurança Pública.
O tema foi objeto de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no início dos anos 2000, cujas recomendações embasam diversos projetos de lei. Está em análise no Congresso o projeto de lei (PL) 1743/25, do deputado Mauricio Neves (PP-SP), presidente da Comissão de Viação e Transportes, que sugere ampliar a rastreabilidade das cargas e estabelecer regras de proteção ao consumidor contra a receptação de produtos furtados ou roubados.
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