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| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

Desabafo

Em duas gestações, mãe foi pressionada a antecipar o parto

Mãe de três meninas, a última nascida de 36 semanas, a empresária Luciana Inanike Martins Isolani, 32 anos, relata que sofreu pressão dos médicos para antecipar a data do parto. Há oito meses, ela conta que passou mal durante a gravidez de Catarina e, no hospital, foi submetida a uma cesariana de emergência. "Durante todo o pré-natal, a médica queria marcar a cesárea, e eu queria esperar entrar em trabalho de parto. No dia que passei mal, uma médica de plantão sugeriu inibir, mas a minha médica disse que era melhor tirar. O nascimento prematuro dela poderia ter sido evitado", afirma. Depois de três dias na UTI, um deles com uso de respirador, Catarina leva uma vida normal aos oito meses de vida.

Luciana já havia sofrido pressão semelhante durante a gravidez da primogênita Daniela, há sete anos. "O parto estava previsto para o feriado de Páscoa, mas o médico disse que ela era muito grande e não poderíamos arriscar entrar em trabalho de parto. Ele fez a cesariana com 39 semanas, e ela nasceu com 2,3 quilos e 42 centímetros, tamanho de bebê prematuro", recorda. Para a mãe, a necessidade de internação após o nascimento de Daniela e um problema de sopro no coração são evidências de que ela foi retirada do útero antes do tempo. "A pressão é total, eles não querem esperar."

Pastoral

A Pastoral da Criança acompanha as gestantes, de olho em problemas como infecção urinária, por exemplo. O coordenador nacional adjunto da Pastoral, Nelson Arns Neumann, explica que a demora no tratamento de uma infecção pode desencadear um parto prematuro. O problema maior são as cesarianas eletivas antes do prazo. "O nascimento duas semanas antes do tempo aumenta em 120% as chances de problema respiratório agudo. O pulmão é o último órgão que amadurece."

Curitiba

Embora a pesquisa aponte aumento no número de prematuros no Brasil, hospitais de Curitiba registraram a situação inversa. No Hospital Nossa Senhora das Graças, entre janeiro e julho deste ano, a taxa de prematuros foi de 4,7%, contra 7,7% no mesmo período de 2012. No Hospital das Clínicas, a taxa de prematuros fica em torno de 6%.

O número de nascimentos prematuros no Brasil – principal causa de morte até os 28 dias de vida do bebê – se assemelha ao de países de baixa renda. A cada mil brasileiros nascidos em 2011, 117 não chegaram a completar 37 semanas de gestação. Em países pobres, foram 118 prematuros para mil partos, contra 94 nos de renda média. O dado nacional é bastante superior ao que vinha sendo considerado pelo Ministério da Saúde até então – 7,2% – e tem relação com as altas taxas de cesáreas eletivas praticadas no país. É o que afirma o estudo "Prematuridade e suas possíveis causas", desenvolvido na Universidade Federal de Pelotas, com participação de 12 universidades brasileiras e apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

O obstetra Carlos Miner Navarro, professor da Uni­­versidade Federal do Paraná (UFPR), explica que existem dois tipos de prematuridade: um que pode ser minimizado com medidas como acompanhamento pré-natal, por meio de utrassonografia, e outro diretamente relacionado à escolha pela cesariana. No primeiro caso, se o exame indicar que o colo do útero é curto, é feita medicação para atrasar a data do parto. "Estudos mostram que uma ou duas semanas fazem muita diferença no desenvolvimento do bebê", explica.

O desafio, porém, é reduzir o número de cesáreas eletivas no país. Segundo Navarro, se o parto normal fosse priorizado no país, a taxa de prematuridade cairia. Atualmente, o número de cesarianas supera o de partos naturais, chegando a 80% dos nascimentos em hospitais privados. "Exceto em casos específicos, o parto normal é sempre melhor. Há margem de erro nas contas das semanas e, muitas vezes, o bebê é retirado sem estar pronto. O trabalho de parto termina de amadurecer a criança, joga uma série de hormônios na corrente sanguínea e fortalece o tórax."

Segundo a pediatra e neonatologista Regina Caval­­cante, coordenadora da UTI neonatal do Hospital de Clí­nicas, entre as causas de partos prematuros, estão assistência pré-natal inadequada, uso de drogas, gravidez gemelares e fora da idade ideal. "Os dois extremos são risco: as mães adolescentes e as mães acima de 35 anos."

As preocupações com o bebê prematuro, vão além da mortalidade. Expostos a tratamentos agressivos e ao ambiente de terapia intensiva, há risco de infecção e de sequelas neurológicas, respiratórias e de visão. "Quanto menor o bebê, maior o risco de retinopatias, que podem causar cegueira", completa Regina.

Pediatra na UTI neonatal do Hospital Nossa Senhora das Graças, Rejane Biasi Cunha explica que o peso nem sempre é o fator mais determinante para a sobrevivência do bebê. "A idade funcional é mais importante, porque às vezes ele pesa pouco por ser desnutrido e não é tão prematuro."

Parto normal, uma escolha feliz

Enquanto fazia o pré-natal do primeiro filho, há três anos, a fotógrafa e publicitária Laiz Zotovici Martins, 33 anos, foi desaconselhada pelo médico a tentar parto normal. "Ele disse que eu não tinha dilatação, contração e agendou a cesárea para 39 semanas e meia. Sendo que poderíamos ter, pelo menos, esperado eu entrar em trabalho de parto", recorda. Seis meses depois do nascimento de Antônio, Laiz criou um blog sobre maternidade e começou a trocar informações com médicos e outras mães pela internet.

Quando veio a segunda gravidez, no final do ano passado, ela estava decidida a encontrar um obstetra adepto do parto normal. "Foi uma escolha bem feliz! Na mesma semana do parto, já estava lavando roupa, fazendo comida e podendo brincar e dar atenção ao Antônio."

Segundo Laiz, o segundo filho, Théo, apresenta imunidade maior do que o primogênito. "O parto é um sofrimento necessário para o fortalecimento do pulmão, e, para a mulher, é uma experiência única e profunda de autoconhecimento. Se eu tiver outro filho, será de parto normal, talvez até em casa."

80% é a taxa de sobrevida dos prematuros nascidos entre 28 e 37 semanas. Mas a pediatra Rejane Biasi Cunha explica que esse porcentual varia muito, e cai para 60% com gestação inferior a 28 semanas. Abaixo de 22 semanas não há maturidade suficiente para o bebê sobreviver.

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