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Natalidade

Hora de falar sobre maternidade tardia

Sistema de Saúde conseguiu reduzir gravidez adolescente. Em paralelo, cresce a gestação de risco, para a qual faltam políticas de governança

O obstetra Wagner Dias na Unidade de Saúde Mãe Curitibana: sinceridade sobre os riscos. | Henry Milleo/Gazeta do Povo
O obstetra Wagner Dias na Unidade de Saúde Mãe Curitibana: sinceridade sobre os riscos. (Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo)

Entre 1979 e 1980, a Rede Globo fez barulho ao exibir a minissérie Malu Mulher – estrelada por Regina Duarte. A “namoradinha do Brasil” não aparecia no papel das Ritinhas e Simones que a consagraram, mas na pele de uma descasada, às voltas com a criação de uma filha pré-adolescente e encurralada pelas dificuldades homéricas em voltar ao mercado de trabalho – abandonado pela personagem em função do casamento e da maternidade.

Para a geração dos anos 2000, os dilemas de Malu soam como “um jurássico assunto do século passado”. De lá para cá, as mulheres não só se divorciaram em altas escalas como superaram os homens no ensino superior – o dado vigente é que somam 65% da população universitária. Por extensão, priorizaram a carreira em detrimento da maternidade, não raro protelada para depois dos 35 anos de idade, quando não acima disso, num crescente desafio aos limites da idade fértil.

Essa reviravolta estatística é fato conhecido – e aplaudida –, à revelia de dois impasses que criou. Um é de ordem de saúde pública. As “mães tardias” ou “mães idosas” – jargão estranho, mas ainda usado na literatura médica – são mais vulneráveis ao parto prematuro, óbito, hipertensão, diabetes, entre outros contratempos da gravidez num momento em que, como prova a ciência, os óvulos envelheceram. O outro problema diz respeito às “políticas públicas” (veja quadro ao lado).

Provedoras

No Brasil ainda impera um solene silêncio quando o assunto são as governanças envolvendo as mães, não importa a idade. A idealização da maternidade permanece, para lucro – inclusive – das clínicas de fertilização, mas não resulta em avanços na rede de proteção à chamada “nova mulher”. Ela tem de “dar conta de 500 coisas”, como se diz, para conseguir criar um filho, trabalhar e manter a casa – sabe-se que elas são as provedoras de quase 50% dos lares brasileiros.

No que diz respeito à saúde pública, os dados oscilam entre o curioso e o preocupante: as mães adolescentes diminuem, as tardias se multiplicam. Os índices crescem mesmo numa cidade como Curitiba, que nos últimos 15 anos fez avanços consideráveis nas políticas de natalidade. Nesse tempo, o número de “mães menininhas” – período sujeito a todos os riscos médicos e sociais, do parto prematuro ao abandono escolar, para citar dois – baixou de 16 mil para 11 mil, em 2014. A taxa de natalidade nessa faixa, na cidade, é de 11,8 a cada 100 partos (há uma década podia chegar a 39 a cada 100). Não são só flores: o número de mães entre 10 e 19 anos pode chegar a 22,8 a cada 100 em regionais como a de Paranaguá. Os dados são da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).

Pois nos mesmos 15 anos, na capital, o número de mulheres entre 30 e 39 anos saltou se 6,6 mil para 9,8 mil. Leve-se em conta que a obstetrícia considera gestação de risco a partir de 35 anos. No município, hoje, a faixa de mães dos 30 as 39 responde por 40% dos partos, quase o dobro do registrado em 1995. Acima de 40 anos, no mesmo período, o número saltou de 1,5% para 3,2% – como de resto, no crescente.

O panorama que se repete no restante do estado. A Sesa informa que dos 159,6 mil nascidos no Paraná em 2014, 49% foram de mães entre os 20 e 29 anos. Outros 30,5% nasceram de mães entre 30 e 39 anos, um a cada três partos, portanto. Ao passar o pente-fino nas tabelas, o que se deduz é que quase metade desse total de mães “depois dos 30” está na chamada faixa de risco. A curva também se acentua: 2,5% nascidos em 2014 são de mães acima dos 40 anos. “Foram 3.849 bebês de mulheres mais velhas. É um número expressivo, levando-se em conta todos os riscos a que se submeteram”, observa a coordenadora do programa Mãe Paranaense, a enfermeira Márcia Huçulak, de posse de mais uma observação. Ano passado, 21 mulheres com 50 ou mais anos deram à luz. Em 2012 foram apenas 5.

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