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| Foto: Andrew Burton/AFP

No dia 4 de junho, o site de notícias de humor Science Post publicou na internet um artigo que trazia unicamente um “lorem ipsum”, bloco de texto sem sentido algum utilizado para preencher espaço em publicações como jornais e revistas, durante a diagramação (assim como o famoso “nonono”). O artigo vinha com uma manchete alarmante: “70% dos usuários do Facebook leem apenas o título da notícia antes de comentar”.

Não deu outra. Cerca de 46 mil pessoas compartilharam o post, boa parte delas tratando a notícia como algo sério – um exemplo imprudente, talvez, de como a vida imita a arte.

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Agora, como se a questão ainda precisasse de provas, a manchete satírica do site foi validada mais uma vez. De acordo com um novo estudo conduzido por cientistas da computação da Universidade de Columbia e do Instituto Nacional Francês, 59% dos links compartilhados em redes sociais nunca são clicados. Ou, em outras palavras: a maioria das pessoas, aparentemente, passa notícias para a frente sem nem sequer ler o conteúdo.

E o que é pior: o estudo mostra que esses compartilhamentos “cegos” são realmente importantes para determinar quais notícias circulam pela internet e o que acaba fugindo do radar do grande público. Assim, pode-se concluir que os retweets e publicações impensadas estão na verdade formando uma visão conjunta – e talvez equivocada – das agendas política e cultural dos internautas.

“As pessoas são mais dispostas a compartilhar um artigo do a que lê-lo”, afirma o co-autor do estudo Arnaud Legout em um comunicado. “Isto é típico do consumo moderno de informação. As pessoas formam uma opinião baseada em um resumo, ou um resumo de resumos, sem se esforçar para ir mais fundo no assunto”, completa.

Para chegar a essa conclusão, Legout e outros pesquisadores coletaram dois conjuntos de dados: no primeiro, reuniram durante o período de um mês todos os tweets contendo links encurtados do Bit.ly de matérias de cinco grandes empresas de mídia; no segundo, registraram todos os cliques ligados a estes links, durante o mesmo período. Depois de coletar e analisar os dados, os pesquisadores basicamente se viram com um mapa que mostra como notícias viralizam no Twitter.

E esse mapa mostrou, claramente, que as notícias “virais” são largamente compartilhadas – mas não necessariamente lidas.

Disseminando notícias

Os pesquisadores também fizeram outras observações reveladoras. Eles descobriram que a maioria dos cliques em notícias vêm de links compartilhados por usuários comuns do Twitter, em vez do próprio site de notícias. E os links que os usuários clicam são muito mais antigos do que se imagina – alguns, de fato, haviam sido publicados vários dias atrás.

Mas, de qualquer maneira, o mais interessante é o hábito de compartilhar sem clicar (ou seja, sem conhecer de fato o conteúdo que está sendo distribuído) – um hábito que, quando se pensa a respeito, diz muito sobre o baixo nível das discussões que preenchem a internet a todo momento. Entre as tendências que contribuem para isso estão a popularização dos chamados clickbaits (títulos apelativos que tentam atrair cliques) e a “BuzzFeedficação” da imprensa tradicional, além da disseminação de notícias falsas ou enganosas, que só parece aumentar. Não ajuda o fato de ser quase impossível encontrar uma discussão online inteligente sobre algum tema mais complicado ou controverso.

Tudo isso, foi, inicialmente, a inspiração para a recente pegadinha do Science Post com o texto de “lorem ipsum”. O editor do site, que não se identifica, afirmou ao “The Washington Post” que ele estava cansado de ver o grande número de informações desencontradas, equivocadas e mal-interpretadas que as pessoas disseminam na internet. O Science Post tem entre sua equipe professores e pesquisadores, ele explica: e dói a eles ver má informação espalhada dessa maneira.

Infelizmente, para eles – e também para todos nós – não parece que a prática está perto do fim.

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