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Uma crítica recorrente que se faz às redes sociais vem de uma análise do escritor Umberto Eco, em 2016, que disse que a internet deu o direito à palavra a “uma legião de imbecis que antes falavam apenas em um bar e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade”. Foi o suficiente para que muitos passassem a defender a censura das redes.
Na estreia do programa da Gazeta do Povo Última Análise, nesta segunda-feira (31), que tratou sobre a liberdade de expressão, essa marca contemporânea, de dar voz aos imbecis ou idiotas, foi um dos temas propostos para o debate.
O jornalista Marcos Tosi questionou se aqueles considerados "idiotas" deveriam ter voz e quem define essa classificação, apontando para a natureza humana e a possibilidade de que todos, em algum nível, possam ser considerados assim por outros.
Guilherme Kilter, jovem vereador de Curitiba com formação em Relações Internacionais, argumentou que as redes sociais deram voz a todos, e não apenas aos "idiotas". Ele contrapõe o que chama de monólogo da mídia tradicional, onde poucas vozes dominavam a narrativa, com o atual cenário de debate público aberto a qualquer pessoa.
Em vez de monólogo, pluralidade
“Quando você cria um produto em que qualquer pessoa pode criar uma conta, manifestar sua expressão e sua própria opinião, seu próprio posicionamento, você dá liberdade. O que a gente tinha antes, principalmente no âmbito público, no âmbito da política, era um monólogo, não existia diálogo. Era o que a imprensa soltava, o que os parlamentares falavam e acabou. O máximo de debate público que você tinha era no bar”, assinala Kilter.
Para Kilter, a questão central para não é se as redes deram voz aos "idiotas", sem censura, mas se essa abertura é pior do que o cenário anterior, de vozes controladas.
Outro participante do Última Análise, o jurista André Marsiglia fez um paralelo da realidade atual com a situação anterior, que possuía filtros e editores que controlavam as opiniões veiculadas. As redes sociais, ao eliminar esses filtros, permitem que todos se manifestem, inclusive aqueles que podem ser considerados "muito idiotas", destacou.
“Isso pode assustar as pessoas, mas assusta por quê? Porque não tem justamente o recivilizador, aquele que vai dizer quem pode falar, quem não pode falar, aquele que vai dizer que assunto pode, que assunto não pode, aquele que vai dizer por quanto tempo pode falar ou não. Isso é bom, isso é saudável. Algumas pessoas sentem falta de ter um feitor do debate", assinala.
"A gente deveria estar feliz com a possibilidade agora de tantas outras pessoas falarem, mas não, a gente se assusta com isso. É um fenômeno que tem que ser visto de forma positiva. Os idiotas estão falando, ótimo, mas também estão falando os que não são idiotas”, argumenta Marsiglia.
Dallagnol aponta risco de controle do governo
Para o ex-procurador da República e ex-deputado federal Deltan Dallagnol, também colunista do Última Análise, um importante pano de fundo do debate são as tentativas do governo de impor censura ao regular as redes sociais. Deltan lembra que internet não é terra sem lei, ela é regulada pela mesma legislação que rege o mundo físico, que proíbe calúnia, difamação, incitação ao crime, racismo e injúria.
“O problema é que quando o Brasil foi fazer a sua regulação, o projeto que veio à tona, o projeto das fake news, trouxe um absoluto controle do governo federal sobre um instituto para o qual o próprio governo Lula ia indicar os membros, ia regular e colocar amplas punições sobre as redes sociais. Isso é ruim em qualquer governo, seja de direita, de esquerda, ter uma ingerência imensa sobre o viés da discussão nas redes sociais", sustenta Dallagnol.
"Uma regulamentação é possível, sim, mas a gente tem que ter um cuidado imenso, uma discussão transparente por meses, talvez anos, para que a regulação que seja produto dessa discussão não acabe jogando fora o bebê junto com a água suja do banho”, conclui o ex-chefe da Operação Lava Jato.
O programa Última Análise é uma das novidades do canal do YouTube da Gazeta do Povo e vai ao ar de segunda a quinta-feira, das 19h às 20h30.
Com um time de colunistas altamente qualificados, o Última Análise pretende debater com profundidade assuntos relevantes para os rumos do país que, por vezes, acabam ficando em segundo plano nas tensões e ocupações do cotidiano. A proposta é ir além das impressões superficiais da notícia, buscando oferecer densidade de análise e situar a linha editorial da Gazeta do Povo, com ampla liberdade e respeito à opinião dos colunistas e espectadores. Sem censura.




