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Aos 36 anos, Valquíria Zampar aprende conteúdos escolares e habilidades domésticas na Apae | Gilberto Abelha/ Jornal de Londrina
Aos 36 anos, Valquíria Zampar aprende conteúdos escolares e habilidades domésticas na Apae| Foto: Gilberto Abelha/ Jornal de Londrina

Exemplos

Um campeão de redação e uma aluna de 83 anos que não perde aulas

Bruno Alves Rodrigues da Silva, 13 anos, é estudante da Apae de Maringá. Em abril deste ano, o menino concorreu com 3.660 estudantes, a maioria sem deficiências, em um concurso internacional de redação de cartas promovido pelos Correios e pela União Postal Universal (UPU). Ele ficou em segundo lugar por escrever sobre como a música influencia a vida.

Bruno é apenas um exemplo de que é preciso aguçar as habilidades, diz Inês Cristina Devidez Nabarro, diretora da Apae de Maringá, onde ele estuda. Na instituição há 42 anos, ela diz que são muitas as histórias de lutas e conquistas. "Todos são especiais do seu jeito. Só é preciso trabalhar dentro das possibilidades de cada um", ressalta.

Entre os vários personagens, Inês cita a "estudante" mais velha da associação: Alice Rodrigues, 83 anos. Por ordem judicial, recebe ajuda do irmão e mora em uma pensão. Ainda vai, na cadeira de rodas e sem conseguir falar, quase todos os dias para a escola. A diretora diz que todos conseguem sentir a alegria dela em fazer parte de um grupo. "É o brilho no olhar, é o sorriso que sai com dificuldade, mas com sinceridade. É isso que nos fortalece a seguir em frente."

Mercado acolhe alunos das associações

Antoniele Luciano, da sucursal

A Apae de Londrina está completando 50 anos. Com 113 funcionários, a unidade atende 350 alunos. Além do conteúdo referente à educação infantil e ao ensino fundamental, são ministradas oficinas profissionalizantes, como marcenaria e artesanato. Os estudantes também passam por acompanhamento clínico com psicopedagogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais.

O trabalho da associação, segundo a agricultora Luzia Frederico Zampar, 60 anos, foi fundamental para o desenvolvimento da filha dela, Valquíria. Hoje com 36 anos, a aluna aprende conteúdos do ensino de jovens e adultos (EJA) e ensinamentos do cotidiano, repassados a partir de um Mini Lar criado na escola. O espaço assemelha-se a uma casa de verdade, onde os alunos podem aprender tarefas básicas, como arrumar a cama e mexer com eletrodomésticos.

"Até os médicos diziam que minha filha não se desenvolveria. Segui a orientação de um pediatra, que pediu que eu a levasse para a Apae. Foi o melhor que fiz. Hoje, ela tem uma vida normal dentro de suas possibilidades", diz Luzia.

Independência

Com 23 anos, a auxiliar administrativa Vera Lúcia Vick dos Santos também teve a Apae como alicerce de seu desenvolvimento. Ela chegou à associação com 12 anos. Não demorou para que começasse a auxiliar as professoras. Vera trabalha na secretaria da Apae. "Sinto que a cada dia aprendo mais com eles [professores]", resume.

Vera não foi a única aluna a conquistar espaço no mercado de trabalho. Há quem trabalhe em outros setores, como supermercados e hospitais. Segundo a coordenadora da associação, Irene Frutuoso, mesmo com o requisito de ensino médio pedido pela maioria das empresas, etapa não ofertada pela Apae, os alunos são encaminhados de acordo com suas potencialidades. "Conversamos com as famílias e os enviamos para empresas quando elas autorizam", pontua Irene.

No ano em que completa seis décadas, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) tem muitas conquistas a serem elencadas e uma relação de dificuldades ainda enfrentadas diariamente para garantir que crianças e idosos com deficiência intelectual tenham, de fato, direito à cidadania. Em todo o país, a entidade filantrópica conta com 2.131 escolas e atende cerca de 250 mil alunos, conforme levantamento da Federação Nacional das Apaes (Feapaes). No Paraná, são 42 mil estudantes assistidos em 327 unidades.

A rede paranaense tem uma particularidade: é a única do país a manter convênio com o estado na contratação de professores. Em linhas gerais, pela lei que institui o programa Todos Iguais Pela Educação (n.º 17.656/2013), os educadores são selecionados no mesmo concurso que pontua os professores da rede estadual de ensino, aplicando a exigência de pós-graduação em Educação Especial. "É uma de nossas vitórias. Essa unicidade no ensino, por exemplo, mostra que nossa caminhada não é em vão", comenta a presidente da Federação das Apaes do Paraná, Neusa Soares de Sá.

Trabalho

Outro ponto favorável lembrado pelo presidente das Apaes de Maringá, Fernando Meneguetti, é a abertura do mercado de trabalho para os deficientes. Com o respaldo da lei, estudantes das associações conseguem um emprego, o que contribui para a inserção deles na sociedade. "Só se vence o preconceito estando em todos os meios e eles estão," enfatiza Meneguetti, que tem um filho de 29 anos com síndrome de Down. Maringá, inclusive, é sede das duas maiores Apaes do Paraná. Fundadas há cinco décadas, as instituições atendem 1.042 alunos e são divididas em ensino infantil e adulto.

Dificuldades

Embora as conquistas tenham sido valiosas nesses 60 anos, Meneguetti diz que dificuldades continuam surgindo. Como exemplo, ele cita o texto do Plano Nacional de Educação (PNE), que previa que alunos com deficiências fossem introduzidos na rede regular de ensino, com a redução dos repasses federais feitos à entidade. Em suma, isso enfraqueceria a associação , que passaria a prestar educação substitutiva aos estudantes do ensino regular.

"Antes de qualquer mudança, o governo deve entender que não são só nossos alunos que precisam se moldar ao sistema. O professor precisa se adequar, os estudantes precisam se moldar para receber um colega especial. Obrigá-los a esse sistema, os excluiria", defende.

Em abrigo, cuidados de mãe e companhia

Marcela Campos

Com 1 ano de idade, a paraguaia Gordiana Vilalba teve paralisia cerebral e, aos 9, perdeu a mãe. Nunca conheceu o pai. Com a ausência materna, um tio encaminhou a menina para um abrigo. De instituição em instituição, chegou, há 20 anos, às Casas Lares da Apae Curitiba. Aos 40 anos, mora hoje com outras cinco mulheres e uma mãe social em um dos sete imóveis mantidos pela Apae para pessoas com deficiência intelectual. Os atendidos são encaminhados pela Secretaria da Família e Desenvolvimento Social do Paraná.

"São pessoas que normalmente foram retiradas da convivência familiar por ordem judicial", explica a assistente social Priscila Lopes de Oliveira, coordenadora das Casas Lares. Dos 37 moradores, apenas três têm parentes com boas condições sociais e financeiras, mas que optaram por pagar mensalidade para mantê-los no abrigo. "Todos os moradores nesse regime estão aqui há mais de 20 anos. Não aceitamos mais esses casos", afirma. Para cada morador, o governo repassa cerca de R$ 1 mil mensais.

"Eles arrumam a cama, tomam banho sozinhos, dividem o quarto. Por outro lado, não podem sair desacompanhados", diz Priscila. O papel das mães sociais é administrar medicamentos, fazer a limpeza do local, preparar as refeições e auxiliar na higiene dos moradores. Não é um trabalho fácil. Elas permanecem 24 horas na casa, em jornadas de seis dias de trabalho e quatro, de folga.

Mãe social

Entre elas está Miriam Marchioro Milietti, 68 anos e há 23 na atividade. "Sou viúva e quando comecei este trabalho meus filhos estavam para casar. Uma amiga me falou sobre a atividade e disse que ela não me deixaria ficar triste", conta. O salário é de aproximadamente R$ 1,2 mil, mais R$ 300 de benefício por assiduidade.

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