
O ultimato dado pelo governo às categorias em greve convenceu boa parte dos servidores federais a voltar ao serviço. Dezoito categorias ligadas à Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef) aceitaram ontem a proposta de reajuste de 15,8% para os próximos três anos e a expectativa é de que 250 mil servidores retomem seus postos de trabalho na próxima segunda-feira. Também chegaram a um acordo os servidores do IBGE. Segundo o Ministério do Planejamento, das 35 categorias em greve, 30 aceitaram ou sinalizam que vão aceitar o reajuste oferecido pelo governo.
Já os funcionários de instituições que insistirem na greve, casos da Polícia Federal e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), terão dificuldade em negociar, já que o governo indica ter chegado ao limite permitido pelo orçamento.
Com a desaceleração da economia e as desonerações tributárias oferecidas a alguns setores neste ano, a arrecadação vem crescendo menos do que as despesas, deixando pouca margem para o governo melhorar sua oferta. De janeiro a junho, a receita líquida federal (que exclui os repasses aos estados) foi de R$ 427,6 bilhões, 8,7% maior do que o mesmo semestre do ano passado. No mesmo período deste ano, as despesas cresceram 12,5% e chegaram a R$ 379 bilhões.
Impacto na folha
Nas contas do economista Felipe Salto, especialista em finanças públicas da Tendências Consultoria, o reajuste oferecido pelo governo, se estendido a todas as categorias, vai causar um impacto entre R$ 8 bilhões e R$ 9 bilhões ao ano nas contas públicas. "Aumentar o valor oferecido significaria comprometer ainda mais o cumprimento da meta fiscal", diz. O governo federal tem mantido um saldo positivo entre receitas e despesas, o chamado superávit primário, para reduzir sua dívida no longo prazo.
"Com a arrecadação não crescendo na mesma proporção que as despesas, é preciso um cuidado maior no planejamento dos gastos", explica Gil Castelo Branco, da ONG Contas Abertas. Não parece possível agora, segundo ele, contornar a criação de novos gastos com o crescimento da arrecadação.
Ao estabelecer um teto para o reajuste, o governo tenta manter o custo do funcionalismo dentro da média dos últimos anos, entre 4,5% e 5% do produto interno bruto (PIB). Essa proporção passou de 5% apenas em 2009, quando o país ainda sofria os efeitos da crise financeira internacional de 2008.
Isso não significa que o governo não aumentou seus gastos com o funcionalismo. Desde 2003, a folha de pagamento federal cresce acima da inflação. O governo Dilma, porém, passou a controlar a contratação de pessoal e os reajustes, fazendo com que, em 2011, fosse registrada a menor expansão da folha nos últimos anos, de 8%. "Os servidores não querem perder a posição que eles tinham conquistado, mas esquecem do ganho real que tiveram antes e se preocupam apenas com a perda recente", argumenta Castelo Branco.
Salto avalia que o governo teria mais espaço para investir ou reduzir impostos se houvesse um teto para o reajuste do funcionalismo. "Deveria haver uma regra que limitasse o crescimento de despesa com pessoal. Isso permitiria que, ano após ano, o porcentual do PIB com gastos de pessoal caísse, abrindo espaço para aumentar o investimento", analisa Salto. Hoje, o investimento federal é de cerca de 1% do PIB.
Análise
Para especialistas, funcionários federais ficaram mal acostumados
Não é apenas a questão da reposição salarial que fez com que a crise no funcionalismo chegasse a situação em que está, mas também as expectativas que foram criadas com a chegada do Partido dos Trabalhadores (PT) ao governo, visto como um aliado. Enquanto Luiz Inácio Lula da Silva era o presidente, houve um período de crescimento da economia global que permitiu reajustes salariais.
Agora, esse espaço não existe mais e a relação da presidente Dilma Rousseff com os sindicatos não é a mesma de Lula. "Ele conseguia contornar essas pressões melhor do que a Dilma faz, pelas suas origens e a capacidade de negociar com esse segmento", analisa Gil Castelo Branco, da ONG Contas Abertas.
A incapacidade de diálogo entre o governo federal e o funcionalismo deve acarretar em custos políticos para a atual administração. "A presidente está tendo uma postura correta neste caso. A política fiscal precisa contar com uma contenção na despesa de pessoal para que o investimento possa crescer", analisa o economista Felipe Salto.



