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Educação Básica

As escolas que ninguém vê

Educadores reagem à “tirania do Ideb” e levam gestores a observar a superação mesmo em áreas de baixos índices sociais. Resultado surpreende

Não lamentar: A Escola Municipal Itacelina Bittencourt, no Guaíra, funciona faz 54 anos e atende, “desde sempre”, a comunidade empobrecida do Parolin – a poucas quadras dali. Um dos maiores problemas do colégio é a evasão. Apenas 30% dos 550 alunos que ingressam chegam ao final do ano. Manter a qualidade nessa corda bamba é desafio diário. Em 2008, professores reagiram à pilhagem do Itacelina. Assumiram seus problemas, em busca de saída | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Não lamentar: A Escola Municipal Itacelina Bittencourt, no Guaíra, funciona faz 54 anos e atende, “desde sempre”, a comunidade empobrecida do Parolin – a poucas quadras dali. Um dos maiores problemas do colégio é a evasão. Apenas 30% dos 550 alunos que ingressam chegam ao final do ano. Manter a qualidade nessa corda bamba é desafio diário. Em 2008, professores reagiram à pilhagem do Itacelina. Assumiram seus problemas, em busca de saída (Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo)
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Não desistir: A melhora no Ideb alcançada pela Escola Municipal Centro de Educação Integral David Carneiro é comemorada como vitória pessoal na luta travada contra a aridez da realidade vivida por boa parte dos 420 alunos.

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Não desistir: A melhora no Ideb alcançada pela Escola Municipal Centro de Educação Integral David Carneiro é comemorada como vitória pessoal na luta travada contra a aridez da realidade vivida por boa parte dos 420 alunos.

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O Ideb – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – tende a se tornar uma sigla tão conhecida quanto INSS, SUS ou IBGE. Sua popularidade é tamanha que o sistema dispensa apresentações. Gestores o utilizam como sinônimo de ensino de qualidade. Governantes fazem dele uma medida de seus feitos. Populares o reivindicam, com a naturalidade com que pedem melhorias no transporte e na saúde.

INFOGRÁFICO: Veja dados das escolas que melhoraram no Ideb

Curitiba, em particular, tem no Ideb uma de suas bandeiras, não é de hoje. A fama das escolas da capital paranaense vem de 1963, assim que nasceu a rede municipal de ensino. De 2007 para cá, ano em que o índice foi criado, essa popularidade passou a ser quantificada, colocando o município no topo dos rankings educacionais. Algumas de suas escolas – como a São Luiz – se tornaram referência nacional, o que não é pouco em se tratando de um país em que a rede pública costuma ser apontada como problema, não como solução.

No recém-lançado levantamento de 2013, a história continua. Das 179 escolas curitibanas avaliadas pelo Ideb, 63% atingiram as metas ditadas pelo governo federal; 60% melhoraram suas notas; 100 foram além do escore esperado. Na disputada pirâmide das 15 melhores instituições de ensino básico do país, nos anos iniciais, cinco são da cidade. Desempenho melhor entre as capitais, só Florianópolis, que é três vezes menor.

Alto lá

A soma dos dados positivos resultou num consensual conceito "bom+". Entende-se que o Ideb não só tornou visível os esforços das instituições de ensino locais em cinco décadas de labuta como as ajudou a avançar, por força das metas e da pressão por resultados, tão difíceis quanto os do carnaval carioca. O assunto estaria encerrado aqui, não fosse um detalhe. "O Ideb causa mal estar entre os professores. É uma equação imperfeita", admite Ida Regina Milléo, superintendente de Gestão Escolar da Secretaria Municipal de Educação.

Ida não é uma desmancha prazeres nem está sozinha: faz coro com uma legião de outros educadores dentre os 10 mil que atuam na rede municipal. O descontentamento com o que muitos chamam de "tirania do Ideb" provocou uma antessala da revolução nos bastidores do setor. Foi há dois anos. Reuniões, cursos, fóruns pedagógicos trouxeram à baila o desconforto causado por classificações como "as melhores" e "as piores", além do clima de peleja entre as escolas. Conta-se de uma diretora que se apresentava por seu índice. "É uma aberração. O ensino não é uma raia onde correm cavalos", repetem os ouvidos pela reportagem da Gazeta do Povo.

Para surpresa, essa conversa não se resumiu a ser um dos ecos das manifestações de junho. Virou estatística, tanto quanto o Ideb, por força de dois pesquisadores ligados à secretaria – Waldirene Sawozuk Bellardo e Douglas Danilo Dittrich. Eles fizeram o que deveria ser feito: tomaram o Ideb pelo que é – um índice que deve ser interpretado –, e o cruzaram com outras "variantes", nome dado a informações com poder de abalar certezas numéricas e evidenciar verdades escondidas. Exemplo – cruzou-se a nota do Ideb com o número de alunos nas escolas que eram beneficiados do Bolsa Família. Levantou-se o nível educacional dos seus pais. A evasão escolar. Ao se fazer justiça à realidade, a conta de menos virou conta de mais.

Este ano – com novos técnicos à frente das análises – a secretaria prossegue a tarefa de não se deixar iludir nem pelas notas altas, acima de 7, nem pelas baixas, na faixa de 4. O resultado é animador. Em paralelo aos "segredos de sucesso" das escolas que conquistaram as melhores avaliações – exemplos a serem seguidos, é claro – pipocam experiências sobre escolas cercadas de situações desfavoráveis, mas que mesmo assim aumentaram entre 0,5 e 1 ponto. A medida dá um chute na canela na meritocracia simplista. "O que importa mais são as histórias de superação", diz a pedagoga Letícia Mara de Meira, diretora do Departamento de Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação – uma das entusiastas da nova régua usada pelos técnicos.

Além de reduzir o mal estar provocado pelos rankings, a política adotada teve um efeito inesperado: revelou à própria secretaria a resistência e a criatividade miúda de diretores e professores que atuam em zonas pobres, violentas e pouco urbanizadas da cidade. Muitas dessas ações eram invisíveis. Por ironia, depois de assombrá-las, o fantasma do Ideb as ajudou a sair da sombra.

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