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Trânsito

Auto-escolas não preparam alunos para dirigir em estradas

De 1.º de janeiro até a meia-noite da última sexta-feira, 999 pessoas haviam morrido em acidentes de trânsito nas estradas paranaenses. Hoje esse número certamente já terá superado a casa dos mil. Segundo dados das Polícias Rodoviária Federal (PRF) e Estadual (PRE), neste ano foram registrados cerca de 17 mil acidentes nas BRs e PRs que cortam o estado. "Em mais de 90% dos casos o acidente é causado por erro humano", informa a coordenadora da Comunicação da PRF, Dilcléia Tartaia.

Para especialistas de trânsito ouvidos pela Gazeta do Povo, um dos fatores fundamentais para entender esses números é a formação inadequada dos motoristas. Explica-se: mesmo o condutor aprovado com méritos nos exames do Detran, sai das aulas das auto-escolas sem nunca ter passado por uma rodovia.

"A maneira com a qual um aluno de auto-escola aprende não corresponde à realidade do trânsito", ressalta Armando Braga de Moraes Neto, titular da Delegacia de Delitos de Trânsito (Dedetran) de Curitiba. "O enfoque dado nas auto-escolas é todo relacionado às vias urbanas. Não se aprende nada sobre estradas", concorda o juiz da 2.ª Vara de Trânsito de Curitiba, Rogério Ribas.

O auxiliar contábil Igor de Oliveira sabe bem a falta que faz esse preparo. Ele tirou a habilitação tipo B (para condução de automóveis) há algumas semanas e está tirando a licença para motos. Igor, que sabia dirigir "mais ou menos", diz que a experiência na auto-escola ainda não lhe dá confiança para a direção. "Mesmo na cidade tenho um certo temor. E acho que não é hora de encarar a estrada. Sozinho no volante é muito diferente. A maioria das coisas que você aprende na auto-escola é mais para passar no teste. Dentro do carro da auto-escola é uma coisa, você não passa de 40 km/hora, não enfrenta uma situação mais adversa", explica.

O grande problema é que a prudência de Igor não é o usual. "Mesmo os condutores mais experientes acham que sabem tudo sobre dirigir na estrada. Não é assim. Uma ultrapassagem, uma curva feita em uma auto-estrada difere completamente da realidade das vias urbanas", diz o delegado Braga.

Segundo o professor universitário e advogado especialista em legislação de trânsito Marcelo Araújo, a discussão sobre o obsoletismo na formação dos condutores é antiga e, volta e meia, vem à tona. "Existe uma diferença enorme entre o antes e o depois da carteira de habilitação. Um aluno que só dirigiu com o instrutor em vias calmas, em uma velocidade baixa, assim que tira a carteria tem a estrada a seu dispor. Ele pode pegar uma Ferrari e dirigir em uma rodovia, de noite e com chuva."

Para Araújo, poderia haver uma espécie de carência até que o motorista estivesse apto a dirigir nas estradas. "Algo como um número determinado de horas ou quilômetros rodados."

E, segundo ele, seria importante que as auto-escolas exigissem mais dos alunos. "O Código de Trânsito exige que o aluno que quer tirar a carteira de moto deve dirigir na rua. Muitas auto-escolas, no entanto, deixam a carga horária prática restrita às pistas cobertas." O juiz Rogério Ribas tem opinião semelhante. "De alguma forma teríamos que mostrar aos futuros condutores as diferenças entre estrada e vias urbanas."

Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) infromou que o órgão não estuda mudanças na legislação de trânsito e no conteúdo e forma das aulas práticas ministradas pelos centros de condutores.

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