Quatro barras - Um estudo desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP), que planeja mapear programas e políticas culturais de 45 cidades brasileiras, tem a cidade de Quatro Barras, na região metropolitana de Curitiba, como uma das escolhidas. O projeto, vinculado à Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP, identificou o perfil cultural de municípios com até 20 mil habitantes para retratar como o poder público investe na área.
À primeira vista, a reação é de curiosidade e espanto ao saber que a cidade foi escolhida. "Foi mesmo? Nossa, eles não vão encontrar nada aqui", brinca a auxiliar de atendimento Solange Kavilhuka, 21 anos. Ela conta que, como em toda cidade pequena, as atividades culturais em Quatro Barras são escassas. "A nossa diversão é ir até um barzinho, uma pizzaria, ou então às festas da igreja", diz. O namorado, o estudante Pedro Henrique dos Santos, 18 anos, concorda. "O jeito, quando a gente quer fazer algo diferente, é ir para Curitiba", diz.
O autor do projeto, o professor Luis Milanesi, explica a presença da cidade no estudo: "Foi feito um levantamento por população. Como a cidade tem menos de 20 mil habitantes, ela entrou no grupo dessa faixa populacional", afirma. Pela internet, a equipe tentou contato com 735 municípios, mas apenas 45 responderam, entre eles Quatro Barras. Um número que corrobora, segundo o professor, a falta de interesse pelo assunto. "No Brasil, os setores públicos ironicamente não têm compromisso com o público. Em quase todos os sites [oficiais] existe um fale conosco, mas atrás disso não existe uma organização que permita dar resposta ao público. Simplesmente o fale conosco não responde", lamenta.
Ao longo da pesquisa, foi constatada a dificuldade dos municípios menores para suprir a demanda por cultura e realizar bons projetos. "A maioria das cidades não tem orçamento, não sabe o que vai realizar no ano seguinte, nem quanto isso vai custar", diz o professor. E, ao contrário do que comumente se pensa, a falta de recursos não é a principal causa da falta de iniciativas de qualidade no setor. "O maior problema é a formação do gestor cultural. Se há essa falha, de pouco valerão os aportes financeiros. O que ocorre é um velho problema nacional: a escolha dos dirigentes nem sempre é acertada, prevalecendo os critérios políticos", afirma Milanesi.
O motorista Márcio Siqueira, 27 anos, acha um "absurdo" a cidade não oferecer opções de cultura para os habitantes além, como ele explica, das festas da igreja e das pizzarias. "Que, para falar a verdade, nem são coisas culturais, não é?", acrescenta. O motorista conta que não há muitas opções para quem é jovem, muito menos nos fins de semana. "Sábado o que abre é supermercado. No domingo, isso aqui morre", brinca. Questionado sobre os programas que deveriam ser criados na cidade, ele não pensa duas vezes: "um cinema!"
Falta de vontade
Sobre a falta de opções culturais em Quatro Barras, uma cidade de 19.002 habitantes segundo o censo de 2008, o secretário de Cultura, Esporte e Lazer do município, Fernando Cunha, diz que já foram criados muitos programas para suprir a necessidade da população. "De um orçamento de R$ 28 milhões em 2009, investimos R$ 500 mil na secretaria, e desse montante 40% são destinados somente à cultura", alega. Quanto à participação da cidade no estudo da USP, o secretário reiterou que a prefeitura tem vontade de colaborar com pesquisadores. "É um estudo sério, de uma universidade importante, e nós temos prazer em participar enviando dados e falando do nosso trabalho", afirma.
Ao saber de algumas conclusões do estudo, que será publicado na próxima terça-feira, Cunha diz concordar com a afirmação do professor de que há pouca vontade da classe política em relação à cultura. "É uma somatória de fatores. Não há uma preocupação decente em valorizar a cultura. O que a classe política quer é uma geração de ignorantes para se manter no poder. E eu reconheço que é muito pouco o que a secretaria faz, não é o ideal, não estamos reinventando a roda, mas garanto que vamos investir mais", promete.



