
Foz do Iguaçu - Quadrilhas especializadas no contrabando de mercadorias importadas ilegalmente do Paraguai descobriram um novo filão: recrutar idosos para servir de "mulas" da muamba. Com o direito de viajar gratuitamente em ônibus de linhas interestaduais, aqueles com mais de 60 anos e renda de até dois salários mínimos garantem uma renda extra em um esquema que pode ser ilegal. Se o passageiro for flagrado com mercadorias proibidas, pode ser enquadrado por contrabando; se os produtos excederem a cota de US$ 300, sem o pagamento de imposto, o crime cometido é o de descaminho. Quem acaba arcando com os prejuízos causados pela logística dos criminosos são as empresas de ônibus e quem realmente precisa do benefício.
Em Foz do Iguaçu, no Oeste do estado, as três maiores companhias de transporte de passageiros confirmam o uso indiscriminado das passagens gratuitas destinadas por lei aos idosos. "Alguns já estão com três ou quatro viagens reservadas. Saem hoje daqui, voltam amanhã e no dia seguinte estão embarcando de novo", comenta o gerente de vendas local da Pluma, Sérgio Lazarim. Das mil passagens cedidas todo mês a passageiros com mais de 60 anos, pelo menos 70% servem para o transporte de mercadorias.
A estratégia aumenta o lucro das quadrilhas e ainda contribui para burlar a fiscalização. A passagem em ônibus convencional de Foz do Iguaçu a São Paulo trecho mais procurado custa R$ 150,70 no balcão. O Bilhete Idoso integral que só inclui as taxas de embarque e de pedágio sai por R$ 14,08, ou 10% do preço normal. O idoso usa o benefício para reduzir os gastos na atividade extra, ainda que ilegal, e o contrabandista tira vantagem da aparência insuspeita do passageiro.
A procura pelas passagens é tão grande que as viagens para os estados vizinhos exigem reserva de no mínimo 20 dias. Dependendo da época do ano, o tempo de espera ultrapassa 45 dias. "Não podemos negar a passagem, é um direito. Mas quem realmente precisa viajar para visitar um parente ou para resolver um problema de saúde e não pode esperar se vê obrigado a abrir mão do direito e pagar a passagem", aponta Lazarim. Quando os dois bilhetes gratuitos por viagem já foram emitidos, o idoso pode viajar pagando 50% do valor da passagem.
O desrespeito ao direito alheio aumenta quando os órgãos de segurança apertam a fiscalização. "Se ficam sabendo que a polícia ou a Receita Federal estão em operação na estrada e correm o risco de perder a mercadoria, esses idosos que levam muamba não embarcam e também não desmarcam a passagem. Se devolvessem o bilhete, outro poderia usar, ou a própria empresa poderia recolocar à venda." Por mês, as três empresas cedem o equivalente a 50 ônibus lotados, uma média de R$ 285 mil em bilhetes gratuitos.
A situação é confirmada pelo encarregado de vendas da Viação Catarinense Luiz Padilha. "Muita gente que procura e não consegue viajar no dia acha que a empresa não está cumprindo com a obrigação e que estamos negando a passagem gratuita. Mas não é o que acontece. Somos fiscalizados frequentemente", comenta. A falha, aponta, está em não haver um limite de passagens por pessoa. "Quem chega primeiro leva. E, mesmo sabendo do problema, não podemos deixar de emitir o bilhete."
De acordo com a Polícia Federal, o uso das passagens gratuitas para o transporte de mercadorias nos moldes em que vem sendo feito não pode ser caracterizado como crime. No entanto, o delegado José Alberto Iegas sugere que, para evitar ainda mais prejuízos e auxiliar as autoridades no combate ao contrabando, as empresas denunciem a irregularidade. "Todos os indivíduos são tratados da mesma forma nas fiscalizações. Essa modalidade não era conhecida da polícia. Mas, tendo conhecimento, os idosos podem ser vistos sob maior suspeita."



