Um carro roubado pode tomar vários rumos: cruzar a fronteira com o Paraguai, ser utilizado em uma fuga, durante uma perseguição, ou no transporte de drogas. O caminho mais comum, no entanto, ainda é o do desmanche: é quando o carro é "depenado" e suas peças revendidas em oficinas de fachada, a valores abaixo dos preços de mercado.
Os desmanches estão sempre nos jornais, principalmente quando são "estourados", como se diz na linguagem policial. O que pouca gente sabe é que esses estabelecimentos, mesmo depois de descobertos pela polícia, continuam funcionando normalmente em Curitiba, com alvará e tudo. Para serem "estourados" novamente, só com uma nova comprovação de que carros roubados são "cortados" no local ou que peças ilegais são comercializadas. A descoberta leva ao indiciamento do proprietário. E fica por aí.
Só no ano passado, a Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos (DFRV) de Curitiba descobriu e "estourou" 27 desmanches (21 de automóveis, quatro de caminhões e dois de motos). Alguns funcionavam em fundos de quintal ou em barracões descaracterizados. A maior parte, no entanto, estava instalada em lojas regularizadas de auto peças, em bairros como Vila Fanny, Boqueirão, Vila Hauer e Tarumã. E as portas, depois de quase um ano, continuam abertas.
Na lei
Uma pesquisa sobre as leis e principalmente sua aplicação , que poderiam fundamentar o fechamento de desmanches pode ser um exercício frustrante para quem teve o carro "depenado". Atualmente o assunto é tratado pela lei estadual 14.894/05, de autoria do deputado Mário Sérgio Zacheski, o Bradock (PMDB). Ela diz que o estabelecimento que não comprovar a origem das peças que comercializa "será excluído imediatamente do cadastro estadual de contribuintes do ICMS". Ou seja: a empresa ficaria impedida de emitir notas fiscais e entraria na ilegalidade.
Apesar da possibilidade legal, na prática as coisas ainda não funcionam. Por meio de sua assessoria, a Secretaria de Estado da Fazenda informou que, desde novembro de 2005, quando a lei entrou em vigor, nenhum desmanche foi fechado em Curitiba. "É que às vezes a polícia só prende o acusado e recolhe as peças que fazem parte do flagrante", diz Bradock. "Pegou vendendo peça roubada, tem mais é que fechar o desmanche. É um trabalho conjunto da Polícia Civil com a Receita Estadual", completa.
A lei de Bradock determina que as peças usadas sejam fotografadas antes de serem colocadas à venda e que permaneçam no veículo original. As peças não podem mais ir para a prateleira, o que, de acordo com o deputado, facilita o trabalho de fiscalização. O novo texto revogou a lei 13.002, de 2000. Pela lei anterior, a fiscalização dos desmanches ficava a cargo do Detran-PR.
Uma lei municipal também poderia fundamentar o fechamento das lojas que vendem peças roubadas. Em seu artigo 197, a lei 11.095, de julho de 2004, diz que os alvarás podem ser cassados como "medida de proteção" da moral, do sossego público e da segurança pública, ou por "solicitação de autoridade pública". Novamente o problema é a aplicação: de acordo com a Secretaria Municipal de Urbanismo, os órgãos estaduais não costumam solicitar a cassação dos alvarás de desmanches.
"Se recebermos uma informação que caracterize o problema, podemos abrir o processo de cassação do alvará", informa o chefe do setor de Fiscalização da Secretaria de Urbanismo, José Luiz Filippetto. "Desde que estou na Fiscalização, em dezembro de 2003, não me foi passado nada a respeito disso". No processo de cassação, a empresa é notificada no prazo de 10 a 15 dias e deve apresentar defesa, que é analisada pelo núcleo jurídico da Secretaria.



