Peço desculpas aos meus 11 fiéis leitores e aos 16 ocasionais, mas sou obrigado a falar novamente do hífen. Ocorre que, em uma de minhas colunas, transcrevi o seguinte trecho do Acordo Ortográfico: "Certos compostos, em relação aos quais se perdeu, em certa medida, a noção de composição, grafam-se aglutinadamente". Em seguida, temos estes exemplos: girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, paraquedas, paraquedista.
Alguns leitores levantaram a seguinte questão: como podemos saber com certeza que determinadas palavras não mais carregam as marcas de sua composição?
É uma questão complicada, seguramente. E tenho sérias dúvidas de que vale mesmo a pena esquentar a cabeça com isso. Em todo caso, vamos lá.
Vejam só. "Paraquedas" agora não recebe mais o hífen que assinalava o encontro da forma verbal "para" (já sem o acento) com o substantivo "quedas". Vamos combinar que, de fato, "em certa medida" tenhamos esquecido a história dessa palavra. Fazer o quê? A vida é assim mesmo: não guardamos tudo em nossas cabeças. E de uma hora para outra "pára-quedas" se transformou em "paraquedas".
O problema é que "para-brisa", "para-lama" e "para-choque" ainda recebem hífen, o que comprovaria que essas palavras ainda guardam nitidamente a noção de composição. Mas por que guardam essa noção? Simples: porque é assim que estão registradas nos dicionários da língua portuguesa, ora pois!
Então lá vai a má notícia: apenas algumas pessoas estão habilitadas para nos dizer o momento certo em que a noção de composição desaparece de algumas palavras. Agora a boa notícia: qualquer um de nós pode criar um monte de palavras compostas.
Não quero consolar ninguém, mas acho que é bem mais interessante criar do que destruir. Poder fazer as duas coisas deve ser aborrecedor.
Adilson Alves é professor.



