
A supressão de acentos de determinadas palavras, talvez a parte mais polêmica do Acordo Ortográfico, provocou a seguinte dúvida em um leitor: "Isso não vai alterar a pronúncia?" A resposta é "não". A seguir, procuro explicar por quê.
Uma das funções da acentuação gráfica é assinalar que determinadas sílabas devem ser pronunciadas com mais intensidade. A palavra "até", por exemplo, deve ser pronunciada a-TÉ. Se lida isoladamente, a mesma palavra, sem acento, seria pronunciada A-te, isto é, uma forma imperativa do verbo "atar". Mas vejam só. Quando digo que seria pronunciada de tal forma, estou considerando que palavras "andem" sozinhas, isto é, fora de contexto, e que o leitor estivesse se orientando por duas regras: 1) palavras paroxítonas terminadas em "e" não são acentuadas; 2) palavras oxítonas terminadas em "e" são acentuadas. Também estou pressupondo que o leitor saiba o que é uma palavra "oxítona" e uma "paroxítona". Lembrando: oxítonas são palavras de duas ou mais sílabas cuja tônica é a última (ca-QUI); paroxítonas são palavras cuja sílaba tônica é a penúltima (pa-LA-vra).
Parece razoável concluirmos que, para acentuarmos adequadamente as palavras, temos de aceitar um conjunto de regras, que não carregam a essência da "verdade". Claro que não são mentirosas: são apenas regras e como tais poderiam ser diferentes. Poderiam não existir, aliás.
Quando entramos na escola, já sabemos pronunciar as palavras. Quem nunca freqüentou uma escola também sabe. Portanto, as regras de acentuação não são imprescindíveis para a pronúncia. Esta é anterior às regras que aprendemos vida afora. Isso vale para ingleses, cuja língua não tem acentos. E vale para brasileiros, cuja língua tem vários acentos. Em síntese: vale para as línguas e seus falantes.
Adilson Alves é professor.



