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Num de seus discursos, a candidata Dilma Roussef afirmou que não fugiu do Brasil durante a ditadura – ficou por aqui, enfrentando a luta. A observação foi uma alfinetada – para usar essa palavra gentil – nos exilados brasileiros, aqueles que, diante da falta total de perspectiva, optaram por sair do país. O alvo de Dilma foi obviamente José Serra, contra quem ela disputa a Pre­­sidência da República.

O curioso é que, na mesma semana, alguém diametralmente oposto ao mundo de Dilma, o general Leônidas Pires Gonçalves, ex-ministro do Exército e ex-comandante do I Exército, numa reveladora (e estarrecedora, para os mais sensíveis) entrevista a Geneton Moraes Neto, dizia exatamente a mesma coisa: os exilados foram "fugitivos"; se ficassem por aqui, segundo a lógica do general, nada lhes aconteceria.

Que o general diga isso, entende-se – para quem convenientemente acha que Vladimir Herzog se suicidou e que não havia tortura no Brasil, o país será aquilo que dizemos que ele é, principalmente com o Exército na mão e uma ditadura a pleno vapor. Mas é difícil entender por que Dilma Roussef usou o mesmo argumento. Talvez o calor da campanha explique, mas, de qualquer forma, chamar exilado de fugitivo é, na hipótese boa, uma simplificação mental dolorosa. É compreensível que tanto Leônidas como Dilma entendam que, àquela altura, a solução mesmo era "sair na porrada". Os anos 1960 foram radicalizados, na política e nos costumes, e quando o Estado suspende os direitos dos cidadãos, instaura-se como soberano e se torna, ele mesmo, criminoso, tudo passa a ser permitido.

Mesmo assim, as escolhas são inescapáveis. Vendo-se a distância, a opção pela luta armada foi um dos erros políticos mais lancinantes da esquerda brasileira; entre outras razões, porque o ideário que a moveu era, justamente, a instauração de uma ditadura "do bem", digamos assim, para entender de forma cândida o sonho comunista. Naqueles tempos, a ideia de democracia representativa era entendida pela esquerda apenas como "democracia burguesa" a serviço dos ricos. Mais tarde, se viu que o socialismo real se transformou numa máquina de moer gente, em que Cuba e Coreia do Norte brilham como últimas caricaturas. E, do ponto de vista prático, a estupidez da opção armada deu todos os argumentos para a ditadura se fortalecer.

Uma larga margem da contestação política daquela época, entretanto, entendeu que a resistência teria de ser institucional. Não era apenas uma questão tática – era uma visão de mundo distinta que se afirmava. Os exilados brasileiros foram a resistência surda, e sábia, de um Brasil que enfim começava a se ver mais longe.

E uma visão de mundo vitoriosa, como felizmente se vê no Brasil de hoje, quando, entre outros, uma ex-guerrilheira se encontra com um ex-exilado para disputarem a Presidência do Brasil.

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